Caro leitor, peço a fineza de retirar as crianças
da sala, pois tratarei de um tema impróprio para menores de 18 anos: a Câmara
Legislativa do DF. Suas excelências distritais parecem viver em outro planeta.
Como se não bastasse o histórico de desserviços prestados a Brasília, a Câmara
pretende impor outra proposta desrazoada: a volta da disciplina “educação moral
e cívica” nos ensinos infantil e fundamental.
Em primeiro lugar, existe um problema de
inadequação e de abuso de autoridade. Não cabe a nenhum parlamento estabelecer
o currículo das escolas; isso é atribuição de pedagogos, de gente que estuda,
pesquisa, experimenta e, portanto, adquire qualificação para lidar com a
matéria. É óbvio que os nobres parlamentares não possuem competência para
legislarem sobre o tema. Tanto assim é que, ao votar a lei, confundiram
disciplina e conteúdo transversal, como apontou o secretário de Educação.
Mas, hoje, no Brasil, até o Alexandre Frota se
arvora em consultor para reformas pedagógicas. Ora, as questões de educação não
podem ser tratadas com tamanha leviandade e irresponsabilidade. Os autores da
lei distrital alegam que a sociedade deseja um espírito de fraternidade e de
solidariedade: “Falta embasamento moral e ético para as pessoas”.
Com certeza, mas não me parece que o ideal será
alcançado com a disciplina moral e cívica. Esses valores devem perpassar todas
as matérias. É o conceito de educação transversal, muito mais abrangente e
avançado. A lei distrital foi inspirada livremente no decreto do general Costa
e Silva, durante o regime militar.
Cresci sob a ditadura e detestava a disciplina
moral e cívica. Que moral e que civismo tinha um regime que pregava a ética,
mas prendia arbitrariamente, torturava e destruía os nossos direitos de
cidadãos?
Em matéria de moral e civismo, a Câmara Legislativa
do DF deixa muito a desejar. Nós nos educamos, principalmente, pelo exemplo. Ao
longo de várias décadas, as excelências distritais têm se envolvido com
superfaturamento de shows, esquemas de propina, grilagem de terra, contratação
de funcionários fantasmas, recebimento de comissão sobre o salário de
servidores contratados em gabinetes e gastos exorbitantes com gasolina, entre
outros deslizes éticos.
Com certeza, dificilmente seriam aprovados em um
teste de moral e cívica. As crianças e os adolescentes precisam de professores
qualificados, de ambientes agradáveis, de opções de lazer, de respeito, de
afeto, de oportunidades e de dignidade. E a contribuição das excelências
distritais nesse sentido é nula.
Em suas ações, só revelam preocupação com os
interesses pessoais mais baixos. Por isso, a Câmara Legislativa envergonha
tanto a Brasília. E esse projeto de retomada do ensino de moral e cívica só
atesta mais uma vez o despreparo e a arrogância de suas excelências para
abordar questões públicas.
Por Severino Francisco – Jornalista, colunista do
Correio Braziliense – Foto/Ilustração: Blog Google