Decisão exemplar
Está nas mãos dos 11 ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) o rumo
que o Brasil tomará nos próximos anos. O país testemunhará sério retrocesso se
o plenário da Corte Suprema aprovar o habeas corpus interposto pela defesa do
ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva pedindo que ele não seja preso devido à
condenação a 12 anos e um mês de prisão, decretada pela Justiça Federal. Se o
petista não for colocado atrás das grades, depois de condenado em segunda
instância por um colegiado, a nação se verá diante de um precedente sem
paralelo. A Justiça deve e tem de ser para todos. Não se admite que um cidadão
seja privilegiado por ter ocupado o mais alto posto da República.
Não se trata de posicionamento político-partidário relativo à postura de
candidato assumida pelo ex-presidente, mas, sim, do funcionamento do
ordenamento jurídico nacional. Se os ministros do STF voltarem atrás em decisão
tomada em 2016 e permitirem que condenados em segunda instância não sejam
presos, não ficará na cadeia nenhum criminoso apenado por essa instância da
Justiça. O entendimento se estenderá a todos os que cumprem pena por crimes
como tráfico de drogas, assassinato, estupro, sequestro e tantos outros crimes
previstos na legislação.
Mais grave ainda: não haverá mais cadeia para os futuros condenados,
pois poderão recorrer em liberdade até o último grau, ou seja, o próprio STF, o
que, na prática, deixaria criminosos de reconhecida periculosidade em liberdade
por pelo menos 10 anos antes do trânsito em julgado. Como é de conhecimento
geral e criticado por especialistas, a Suprema Corte não tem condições de dar
provimento nem aos processos que lá se encontram. Caso haja uma decisão
favorável ao pleito de Lula, impedindo a prisão antes do trânsito em julgado,
uma avalanche de novos processos chegará ao STF, que não dispõe de estrutura
para tal.
O certo é que, desde 1941, o Código de Processo Penal determinava o
recolhimento à prisão dos condenados em segunda instância, como em praticamente
todos os países democráticos do mundo, a exemplo de Inglaterra, Estados Unidos,
Canadá, França, Alemanha e Espanha. No Brasil, somente em curtíssimo período,
entre 2010 e 2016, vigorou o contrário, o que acabou sendo corrigido pelo STF,
em decisão de repercussão geral, que vincula todos os juízes e tribunais
inferiores. Portanto, não há motivo justificável para o retorno da norma
sepultada pelos próprios ministros do Supremo, o que, certamente, contribuiria
para a eternização dos processos e recursos e a consequente retroalimentação do
crime.
O que chama a atenção é que o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), sempre
presidido por um ministro do STF, decidiu pelo afastamento imediato de seus
cargos dois governadores — José Melo, do Amazonas, e Marcelo Miranda, de
Tocantins —, antes do julgamento dos recursos apresentados por suas defesas à
Justiça Eleitoral. É de se esperar que o mesmo entendimento seja acompanhado
pelos ministros do STF no caso de Lula, ou seja, sua prisão antes de esgotados
todos os recursos, pois foi condenado pelo juiz de primeira instância, Sérgio
Moro, da Operação Lava-Jato, e pelo colegiado do TRF-4, de Porto Alegre. O mais
elevado tribunal do país deve mostrar, no julgamento de amanhã, que a Justiça é
igual para todos, sem qualquer distinção. Chegou o momento de uma decisão histórica
e exemplar.
Visão do Correio Braziliense – Foto/Ilustração: Blog – Google