Carlos Alberto Torres, Professor da Universidade de
Brasília (UnB) e um dos líderes do Movimento “Vamos pra Rua”
O que vocês esperam alcançar com este movimento?
O movimento “Vamos pra Rua” tem um objetivo primordial, entre outros.
Queremos mostrar ao STF, nesta terça-feira, que nós, brasileiros, não vamos
mais tolerar a impunidade. O acatamento do habeas corpus do Lula e a protelação
do Supremo Tribunal Federal em julgá-lo nos deixa apreensivos. Fique claro que
não nos referimos exclusivamente ao caso do Lula, mas ao fato de que a prisão
pós-segunda instância é a garantia de que centenas de processos envolvendo
crimes do colarinho branco no Brasil não se estenderão indefinidamente,
possibilitando, muitas vezes, a prescrição do crime. Cito três democracias,
digamos, maduras, como a França, os Estados Unidos e nossa vizinha Argentina,
onde a prisão após segunda instância existe há anos e, se não extinguiu a
impunidade e a corrupção, reduziu ambas substancialmente.
Alguns defendem a intervenção militar. E vocês?
Repudiamos totalmente essa ideia. O Brasil não quer e não merece
qualquer retrocesso político.
O nome “Vamos pra Rua” não vai confundir o cidadão com grupos de
extrema-direita?”
De maneira nenhuma. Somos um grupo que vem mostrar sua própria
identidade como um segmento diferenciado do movimento “Vem pra Rua”, a quem
cabe a paternidade dessa convocação. Mas não somos uma dissidência. Defendemos
incondicionalmente os valores democráticos, não somos, enquanto iniciativa mobilizadora
da cidadania contra a impunidade, ligados a qualquer partido, embora
respeitemos e valorizemos a política e as preferências e opções partidárias de
cada um. Os brasileiros precisam romper com uma polarização situada nos
extremos do espectro político que olha pelo retrovisor da história; ambos esses
polos são populistas, autoritários e salvacionistas; um se declarando de
esquerda, outro de direita, e representados na sociedade pelo “lulopetismo” e
pelo “bolsonarismo”. Mas nenhum deles é toda a esquerda ou toda a direita, pois
existe mais ao centro um amplo contingente majoritário de brasileiros que vão
da esquerda democrática até a direita democrática, incluídos os liberais.
Por que o grupo de Brasília buscou outra identidade?
Nossa identidade inclui até mesmo a cor que vamos usar no dia 3 de abril
(hoje), a cor azul. Expressa a ideia de que manifestamos nossa indignação, mas
de modo pacífico e democrático. A palavra “Vamos” é um convite. Queremos atrair
aqueles que não querem se sujeitar a qualquer tipo de extremismo, nem se
misturar ao tumulto de carros de som estridentes com palavras de ordem
autoritárias ou irresponsáveis.
O “Vamos pra rua” quer a prisão do Lula?
Como dissemos, a prisão do Lula não é um paradigma para o “Vamos pra
Rua”. Ela é importante sim, mas estamos focados no combate amplo à impunidade
em todos os seus aspectos.
A corrupção é coisa antiga e de solução difícil.
A sociedade brasileira conseguiu avanços importantes com a aprovação da
Lei da Ficha Limpa, a Lei de Acesso à Informação e com o projeto das 10 Medidas
de Combate à Corrupção, que apesar de seus 2,5 milhões de signatários,
infelizmente está parado no Congresso Nacional. O trabalho da Lava-Jato tem
sido fundamental nesse sentido e deve continuar, mesmo que atinja
ex-presidentes, eventualmente o atual presidente da República, o que torna o
caso Lula emblemático. Mas não seria o único, pois há todo um exército de
investigados por corrupção que devem responder pelos desvios de verba que
consomem dezenas de bilhões dos recursos públicos, todos os anos.
O senhor enxerga alguma luz no fim do túnel?
O Brasil precisa continuar evoluindo e creio que vai evoluir no sentido
de acabar com a impunidade e com o foro privilegiado, que é parte desse
processo. Os brasileiros estão muito mais alertas e participativos em relação
aos acontecimentos políticos. Hoje, nas filas, nos táxis, nos restaurantes,
fala-se de política até mais do que de futebol, o que é muito surpreendente em
se tratando do nosso país. Estamos assimilando a ideia transformadora de que é
preciso ter responsabilidade sim, quando depositamos nosso voto na rua. Mas
nossa responsabilidade de cidadãos não termina aí. Democracia é um processo em
constante evolução. Nossa participação como cidadãos precisa acontecer não
apenas quando votamos, ou nas manifestações públicas, mas permanentemente. Cada
um em sua atividade, tende a estar cada vez mais atento à participação, à
exigência de transparência e eficiência por parte dos poderes públicos.
Vigilância, controle social permanente, cidadania, são valores importantes para
o Vamos pra Rua. Estamos também dizendo: Vamos transformar o Brasil. Ir pra rua
com nossas ideias e nossa identidade. Todos somos parte desse movimento.
Ana Maria Campos – Coluna “Eixo Capital” – Foto: Antônio Siqueira/CB/D.A
Press – Correio Braziliense
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