Um brinde ao bom humor
*Por Mariana Niederauer
Entramos no restaurante sem esperar nada demais.
Uma refeição simples e saborosa era a única expectativa. O salão vazio, com as
mesas enfileiradas e todas organizadas à espera de frequentadores boêmios,
convidava ao embarque em conversas descontraídas e regadas a bom vinho, cerveja
gelada, coquetel, refrigerante ou a bebida de preferência do visitante.
O garçom, um homem de cabelos grisalhos, nos
recebeu com largo sorriso e a determinação de oferecer o melhor serviço da
noite aos clientes solitários. Não, essa não é a história de um thriller em que
os funcionários do bar quase abandonado se revelam fantasmas alimentando as
presas antes de capturá-las. É mesmo, e apenas, a lembrança de um sábado à
noite qualquer, numa esquina de Brasília.
O cardápio traz a homenagem aos 58 anos da cidade,
com prato inspirado no picadinho de filé preferido do ex-presidente Juscelino
Kubitschek, com aquele toquezinho do tempero mineiro, terra natal do político.
O sorriso, a hospitalidade, o sabor. Que bom se deparar com tudo isso de
maneira tão espontânea.
O papo à mesa acabou se voltando para o rumo (ou
falta de) da política no país, os motivos de a educação brasileira ainda
apresentar resultados insatisfatórios e o desafio de deixar o profissionalismo
prevalecer nas relações de trabalho contaminadas por conversas criptografadas
de ponta a ponta em redes sociais.
Às vezes parece que, em vez de proteger o usuário,
o verdadeiro objetivo desses sistemas operacionais consiste em semear a
discórdia e criar metralhadoras de frases passivo-agressivas. Nenhum emoticon
se mostra suficiente para substituir o bom humor do garçom no bar ou o
bate-papo com os amigos e a família.
A vontade é de procurar refúgio nos jardins
secretos da cidade. Lugar perfeito para transformar delírios em estado de paz,
o do Hospital Regional da Asa Norte (Hran) foi o que mais me impressionou entre
os citados na reportagem da edição de ontem. Há forma mais bela de curar mente
e espírito? As linhas retas dão lugar a traços arredondados, que fecham o
círculo preenchido pela vegetação. Depois de longos períodos de internação, a
luz do sol faz retomar a compreensão do dia e da noite.
A nossa Babilônia também conta com jardins
suspensos, que fazem os visitantes flutuar não na loucura, mas no conforto.
Mais de 3 mil anos de tradição, entre reinos milenares e metrópoles lendárias
com torres de Babel, relembrados em cantos escondidos da cidade que ainda
marcha para completar o primeiro século.
(*) Mariana
Niederauer – Jornalista, Correio Braziliense – foto/Ilustração:
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