Fake News
*Por Kelley Cristine Gonçalves
Dias Gasque - Janaina Fialho
Nos últimos anos, deparamo-nos com um conceito muito abordado no nosso
cotidiano: fake news, traduzido por notícias falsas. Pode-se compreender o
conceito como a fabricação de notícias falsas, que imitam o conteúdo da mídia
na forma, mas não no processo ou na intenção da organização. Essas notícias
objetivam criar tumultos e gerar imprecisão na compreensão da informação. O
fenômeno ainda requer muitas pesquisas, mas a literatura mostra que a evolução
dos métodos automatizados de detecção de fraudes pode ser aliada poderosa no
combate às fraudes, desde que a sociedade se conscientize da necessidade de uma
mudança na forma de pensar, aprender e agir.
Um artigo publicado, em 2015, por pesquisadores da University of Western
Ontario, no Canadá, sobre métodos de detecção automática mostra dois tipos de
abordagens para lidar com as notícias falsas, quais sejam, as linguísticas e as
baseadas em redes. No primeiro caso, o conteúdo das mensagens falsas é extraído
e analisado para associar padrões de linguagem à fraude; e, no segundo caso, as
informações de rede, como metadados de mensagens ou consultas a redes
estruturadas de conhecimento, podem ser aproveitadas para fornecer medidas de
fraude agregadas. Os pesquisadores concluem o artigo afirmando que o uso da
abordagem híbrida, isto é, a junção entre a linguística e a baseada em rede
possibilita resultados de alta precisão em tarefas de classificação, dentro de
domínios limitados.
Outro artigo mais recente publicado na revista Science (2018) sustenta a
necessidade de uma abordagem mais ampla, capaz de conter o fluxo e a influência
de notícias falsas na sociedade. Tal abordagem deve abranger mudanças
estruturais destinadas a evitar a exposição de indivíduos a notícias falsas,
por meio do uso de ferramentas de detecção e também capacitá-los para avaliarem
as notícias falsas que encontram. Neste contexto, surge o conceito de
pós-verdade, o qual propõe que, em determinadas circunstâncias, emoções e
crenças pessoais têm mais influência para moldar a opinião pública do que fatos
objetivos.
O referido artigo mostra que a questão do julgamento humano é complexa,
pois é necessário considerar os vários vieses que os indivíduos desenvolvem ao
lidar com as novas informações. Indivíduos, em geral, só questionam a
credibilidade de uma informação, quando elas se opõem as suas crenças. Além
disso, é necessário considerar que as pessoas preferem informações que
confirmem as crenças preexistentes (exposição seletiva) e diminuam as
informações dissonantes, bem como estão mais inclinadas a aceitar informações
que lhes agradem (viés de desejabilidade). Além dos fatores citados, há muitos
outros que podem influenciar na detecção das notícias falsas. Portanto, a
abordagem proposta pelo artigo da Science de unir esforços humanos e ferramentas
de automação pode propiciar diretrizes mais concretas de ação. O artigo
ressalta ainda que esse esforço deve ter amplitude para criar um ecossistema de
notícias e uma cultura que valorize e promova a verdade
Considerando a necessidade da criação desse ecossistema e corroborando a
ideia de unir esforços da ciência da computação e também de outras áreas, é
importante abordar o trabalho dos profissionais que podem atuar como mediadores
no acesso à tecnologia, os quais podem contribuir significativamente para a
mudança do status quo, tais como bibliotecários e cientistas da informação.
Ambos se ocupam da tarefa de mediar o acesso das pessoas à informação,
ajudando-as a usarem a informação de forma crítica e seletiva, dando
credibilidade às fontes devidas.
Esse processo de aprendizagem, denominado letramento informacional,
surgiu nos Estados Unidos a partir da década de 1970, com a preocupação de
ajudar as pessoas a lidarem com o crescimento exponencial da informação, no
entanto começou a ficar mais robusto a partir da década de 1990, com o
surgimento de propostas de conteúdos de aprendizagem para serem trabalhados na
educação formal, em serviço e continuada. O letramento informacional
fundamenta-se em um novo paradigma de aprendizagem, em que se considera que
saber buscar informação e usá-la eficaz e eficientemente para tomar decisões e
resolver problemas é mais importante do que a simples memorização de conteúdos
de maneira não compreensiva. O foco é na aprendizagem ativa e autônoma, em que
os aprendizes desenvolvem competências para identificar e delimitar problemas;
identificar canais e fontes confiáveis de informação; selecionar e avaliar
informações de acordo com os objetivos; organizar e transformar a informação em
conhecimento, e por fim , saber comunicar o conhecimento adquirido.
As competências citadas abrangem inúmeras habilidades e objetivos de
aprendizagem, as quais precisam ser distribuídas e trabalhadas ao longo do
currículo, preferencialmente por meio de abordagem de projetos. Tal processo
deve ser iniciado na educação básica, por meio da intervenção orientada de
bibliotecários nas escolas e bibliotecas bem estruturadas. O bibliotecário,
juntamente com o professor, poderá trabalhar para desenvolver o letramento
informacional junto às crianças. As pesquisas da área mostram que a
implementação de programas de letramento informacional é fundamental para a
formação de pessoas com autonomia para lidar com a informação, essencial na
sociedade da aprendizagem, em que os pilares de desenvolvimento centram-se na
grande produção de informação, no uso intensivo das tecnologias de comunicação
e informação e no processo de aprendizagem permanente. Porém, esses conteúdos
ainda não fazem parte, de forma organizada e sistêmica dos currículos
brasileiros, o que traz graves problemas para a educação e a sociedade. Uma
questão que precisa ser urgentemente abordada.
(*)
Kelley Cristine Gonçalves Dias Gasque - Professora
da Faculdade de Ciência da Informação da Universidade de Brasília »
Janaina Fialho - Professora do Departamento de Ciência da Informação da Universidade Federal de Sergipe