Deboche
com o Brasil
*Por
Plácido Fernandes Vieira
A decisão de Toffoli, Gilmar e Lewandowski de pôr
em liberdade José Dirceu – condenado a mais de 30 anos de prisão – se
fundamenta numa mentira: a de que a Constituição brasileira estabelece que
alguém só pode ser considerado culpado e preso após o STF examinar o último
recurso possível. Ou seja: nunca. Por quê? Porque as possibilidades de apelação
no arcabouço jurídico brasileiro são infindáveis. Só Luiz Estevão, por exemplo,
já lançou mão de 37. E Lula deve estar perto de bater o recorde do empresário brasiliense.
E por que a decisão do trio se baseia numa falsa
premissa? Porque, no mínimo, eles fazem uma leitura equivocada do inciso LVII
do artigo 5º da Constituição. Lá está escrito: “Ninguém será considerado
culpado até o trânsito em julgado de ação penal condenatória”. Releia e veja
que o texto não trata de prisão. Essa questão é abordada, de forma claríssima,
no inciso LXI, do mesmo artigo 5º, que dispõe: “Ninguém será preso senão em
flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada de autoridade judiciária
competente, salvo nos casos de transgressão militar ou crime propriamente
militar, definidos em lei.”
Em geral, uma condenação transita em julgado após
sentença confirmada em dois graus de jurisdição. E o que quer dizer isso? Que
passou pela primeira e pela segunda instância da Justiça. É esse o entendimento
hoje do STF. E é o óbvio. Afinal, nem o STJ nem o STF julgam ação penal contra
cidadãos sem foro privilegiado. Logo, o processo se conclui na segunda
instância. Ninguém precisa de “notório saber jurídico” para saber disso. Basta
ser alfabetizado. Nos EUA e na França, por exemplo, um réu já vai pra cadeia
logo após condenado em primeira instância.
Com a soltura do petista, Toffoli, Gilmar e
Lewandowski passam para a sociedade, que sustenta o Judiciário mais caro do
planeta, o recado de que o crime no Brasil compensa. E mais que isso: que
criminosos ricos e poderosos jamais voltarão a ser punidos. A decisão é um
pontapé no traseiro de quem ousou acreditar em Justiça no país depois de ver a
Lava-Jato pôr atrás das grades, um a um, os participantes do maior esquema de
corrupção da história do país.
Ao libertar Dirceu, é como se o STF determinasse
que juízes de primeira e segunda instância são inúteis e não merecem confiança.
Mais que isso: que bandido de colarinho branco não pode nem deve ser preso, a
menos que o STF assim o decida. Afinal, eles são ou não são supremos?
(*) Plácido Fernandes Vieira –
Correio Braziliense – Foto/Ilustração: Blog - Google