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Patrimônio a ser defendido - "Débora Diniz, professora da UnB, que têm muito a ensinar....


Patrimônio a ser defendido

*Por Humberto Rezende 

Não conheço pessoalmente a antropóloga Débora Diniz, professora da Universidade de Brasília, mas seu trabalho me faz afirmar, sem medo, que ela é um patrimônio da cidade. Pelas pesquisas que faz, pelas reflexões que propõe e, especialmente, pela generosidade e preocupação que demonstra com os brasileiros menos favorecidos, especialmente as brasileiras, Débora  Débora Diniz, professora da Universidade de Brasília

Quando explodiram no Brasil os casos de bebês nascidos com microcefalia em decorrência da zika, foi Débora quem se preocupou em viajar até o sertão nordestino, onde a situação era mais grave, e escutar o drama daquelas mulheres, que, quase abandonadas, precisavam enfrentar uma situação que nem a ciência compreendia direito.

O resultado foram o livro Zika — Do sertão nordestino à ameaça global e o documentário Zika, obras capazes de gerar em nós a contraditória reação de chorar com os olhos mais abertos, porque nos toca ao mesmo tempo em que nos informa e nos conscientiza. E que a fizeram ser incluída, em 2016, na lista dos cem pensadores mais relevantes do mundo pela revista Foreign Policy.

O trabalho acadêmico da professora tem, portanto, além de reconhecimento, uma tocante preocupação em olhar e dar visibilidade aos excluídos. Débora é uma cientista preocupada com o outro, uma defensora da dignidade de todos os humanos, mesmo aqueles invisíveis e esquecidos. Por isso, é assustador saber que, esta semana, ela se viu obrigada a fazer um boletim de ocorrência sobre ofensas e ameaças — inclusive de morte — que vem recebendo nas últimas semanas.

Ao estudar como poucos a situação das mulheres, Débora passou a defender a descriminalização do aborto até a 12ª semana de gestação, ou seja, a impossibilidade de o Estado punir uma mulher que recorra à interrupção da gravidez até esse período de formação do feto. É por ter essa posição que Débora hoje é ameaçada e chamada de “assassina” e “monstro”.

Débora está longe de ser isso de que a chamam. A professora não é imoral ou insensível, como querem fazer crer seus perseguidores. Seu trabalho está aí para provar o contrário. Ela é, sim, uma voz a ser ouvida, para que o país possa tomar uma decisão consciente e esclarecida sobre um tema tão complexo. Débora não é um monstro. É alguém que estudou e sabe, por exemplo, que a proibição não diminui o número de abortos em um país, só faz com que eles aconteçam de forma clandestina, expondo milhares de mulheres (mais uma vez, as mais pobres) a situações degradantes e perigosas.

O Brasil, como nação, pode discordar da professora e seguir o caminho da proibição. Mas não pode deixar que a decisão seja tomada sob a ameaça de fundamentalistas contra estudiosos como Débora, que têm muito a ensinar. Débora Diniz é, por isso, um dos patrimônios de Brasília que devemos defender.


(*) Humberto Rezende – Correio Braziliense


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