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Uso indiscriminado da internet por jovens preocupa especialistas, pois dissemina discurso de ódio

*Por Otávio Augusto

Grupo de pesquisadores defende que governo adote classificação indicativa on-line para diminuir a propagação de conteúdos com teor racista, misógino, homofóbico e que induzam ao consumo infantil exagerado. Legislação atual já modera jogos, mas não chega às redes

A publicação de vídeos na internet com conteúdos inapropriados para crianças e adolescentes tem mobilizado grupos de pesquisadores que defendem a classificação indicativa (censura por idade) para este tipo de conteúdo. O Ministério da Justiça, responsável por essa regulação, pode adotar controle similar ao que já é exercido na tevê, no cinema e em jogos. O órgão já promoveu seminários sobre o tema, mas a legislação ainda não foi alterada. Atualmente, a portaria vigente é de 2014. Especialistas acreditam que esse é um dos meios para diminuir a disseminação de discursos de ódio, bullying, trollagens (brincadeira de mau gosto), incentivo ao consumo e à má alimentação.

A polêmica ganhou força após a popularização de vídeos com conteúdo racista, misógino, homofóbico e que induzem ao consumo infantil exagerado. Para se ter ideia do alcance dos influenciadores digitais, como são chamados os produtores de conteúdo audiovisual para a internet, os cinco mais populares reúnem 104 milhões de inscritos em suas contas no YouTube — o equivalente à metade da população brasileira, de 207 milhões. Um único canal já conta com 2,5 bilhões de visualizações.

Regina de Assis, doutora em Educação pela Universidade de Harvard, nos Estados Unidos, participa do grupo de especialistas do Centro de Estudos sobre as Tecnologias da Informação e da Comunicação (Cetic.br) e destaca a necessidade da classificação indicativa na internet. Segundo a especialista, que participou de debates sobre o tema no Ministério da Justiça, as narrativas induzem a sexualidade precoce, excesso de consumo, desrespeito com o próprio corpo e banalização da saúde. “O importante é estabelecer padrões. A proibição não funciona, tem que haver uma argumentação. Também temos que avaliar o papel das famílias dessas crianças e adolescentes, que é fundamental, por intermediar o que se assiste e a conversa que precisa acontecer”, explicou.

Regina destaca que a principal dificuldade é estabelecer padrões de conteúdo que “não sejam ofensivos, ameaçadores e que não atentem contra a segurança e desenvolvimento da criança”. “A internet não tem limites de horário, de fronteiras e de público. Há uma cautela por parte do Ministério (da Justiça) em assumir essa responsabilidade. Mas, diante do cenário, cabe a ele dar uma resposta mais incisiva à sociedade brasileira. Circulam vídeos de aberrações, como menino tomando banho em banheira com chocolate”, concluiu.

O pesquisador Pedro Augusto, do Centro de Tecnologia e Sociedade da Fundação Getulio Vargas, defende que algum tipo de regulamentação deve ser feita, mas que a discussão deve envolver as plataformas e produtores de conteúdo. “As plataformas têm sistemas em que o pai, mãe ou responsável têm controle ao conteúdo que será veiculado para definir parâmetros. O que torna a discussão delicada é que os sistemas de controle tendem a ser feitos por mecanismos automatizados, o que prejudica conteúdos de qualidade”, explica.

Para Augusto, a responsabilidade da classificação deve ser feita pelas empresas. “O que vemos hoje é que o critério fica por conta do produtor. As plataformas devem assumir esse ônus. Entendo que tem uma dificuldade técnica pela quantidade de conteúdo que é veiculado, mas é uma discussão urgente”, pondera.

Censura x classificação
A portaria em vigor destaca que se sujeitam à classificação indicativa pelo Ministério da Justiça obras audiovisuais destinadas à televisão e aos mercados de cinema e vídeo doméstico; jogos eletrônicos e aplicativos; e jogos de interpretação de personagens. Apesar de ter realizado debates e discussões, os mais recentes entre março e abril, o ministério destacou em nota que “os conteúdos de internet, pelo menos neste momento, não estão na pauta para a ampliação do escopo dos produtos classificáveis”.

Para o professor do Departamento de Jornalismo da Universidade de Brasília (UnB) Luiz Martins da Silva, é preciso entender a função da classificação indicativa. “A censura é o exame prévio para vetar ou cortar partes. A classificação não proíbe nem antes nem depois, ela indica o público que deve consumir o conteúdo para evitar abusos, ofensas e crimes. Contudo, é uma orientação para a família. Essa é uma responsabilidade plural, apesar de haver uma legislação que protege a infância e a juventude”, conclui.

Para saber mais - Restrição por idade
Com o fim da censura no Brasil, em 1988, o país adotou um sistema de classificação indicativa, que informa a qual faixa etária um produto cultural (filmes, programas de tevê, jogos etc.) é indicado. A única classificação restritiva é a de 18 anos: mesmo com aprovação dos pais, menores não são permitidos. Os próprios produtores costumam enviar uma autoavaliação baseada no guia publicado pelo Ministério da Justiça, mas isso não é necessário. Os critérios que podem elevar a classificação estão relacionados a cenas de sexo e nudez, violência e uso de drogas. São seis tipos de classificação: livre e não recomendado para menores de 10, 12, 14, 16 e 18 anos.


(*) Otávio Augusto – Correio Braziliense





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