Drogas e polícia no Distrito Federal
Dados obtidos no site da Secretaria da
Segurança Pública e da Paz Social destacam a relevância das ocorrências de
posse de drogas no Distrito Federal de 2014 até agosto de 2018. Segundo as
informações disponíveis, foram 40.369 ocorrências envolvendo drogas; dessas,
70% dizem respeito à posse de entorpecentes e, portanto, têm como foco os
usuários, que deveriam ser alvo de políticas públicas pertencentes ao campo da
saúde e não da justiça criminal.
No Brasil, com a promulgação em 2006 da
Lei 11.343, conhecida como nova Lei de Drogas, o porte para consumo pessoal
deixou de ser punido com prisão e passou a ter como possíveis penas advertência
sobre os efeitos da droga, prestação de serviços à comunidade e medidas
educativas. Apesar de trazer consequências diferentes para uso e tráfico – e,
por conseguinte, usuários e traficantes –, a lei não estabelece critérios
objetivos de distinção entre os casos (como quantidade de droga apreendida), de
forma que, num momento inicial, tal decisão muitas vezes fica a cargo do
policial que registra a ocorrência.
A pesquisa Apreensões de Drogas no
Estado de São Paulo: um raio x das apreensões de drogas segundo ocorrências e
massa, elaborado pelo Instituto Sou da Paz, apontou que, em São Paulo,
diferentemente do que ocorre no Distrito Federal, tem crescido a participação
das ocorrências de tráfico no total dos casos envolvendo apreensões de drogas –
de 41,5% em 2005 para 61,3% em 2017. Situação semelhante se verifica no Rio de
Janeiro: segundo pesquisa do Instituto de Segurança Pública, os casos de
tráfico representavam 37% do total de ocorrências referentes a drogas em 2006,
proporção que chegou a 50% em 2015.
É positivo que as polícias gastem menos
tempo e recursos em ocorrências já que não existem evidências de que criminalizar
e abordar usuários surte algum tipo de efeito sobre a redução do consumo.
Políticas públicas de saúde baseadas na redução de danos têm se mostrado mais
efetivas nesse propósito. É benéfico que o foco da polícia esteja no tráfico,
mas é preciso uma análise mais profunda para entender quais ocorrências de fato
contribuem para reduzir o poder do crime organizado e reduzir a oferta de droga
disponível.
Essa necessidade fica evidente na
análise mais detalhada das apreensões de tráfico das principais drogas em São
Paulo feita na pesquisa mencionada, que mostra que boa parte delas foi feita
com base em quantidades irrisórias de entorpecentes (39,8g no caso da maconha,
21,6g nas ocorrências de tráfico de cocaína e 9,4g, nas de crack). O efeito
dessa atuação policial se reflete no perfil da população do sistema prisional
brasileiro: em 2006, cerca de 47 mil pessoas estavam presas por crimes
relacionados ao tráfico; em junho de 2016, o número ultrapassou os 170 mil,
correspondendo a 28% da população carcerária do país.
É evidente que os milhares de
ocorrências de posse de drogas observadas no Distrito Federal consomem recursos
das polícias, podendo comprometer sua capacidade preventiva, investigativa e de
atuação voltada ao desmantelamento de grandes redes criminais. Com uma média
anual de mais de 30 mil roubos a transeuntes e mais de 400 homicídios, é
preciso que o Distrito Federal priorize a aplicação dos recursos policiais na
prevenção e na investigação de crimes violentos, agindo com inteligência e
planejamento na questão do combate ao tráfico de drogas.
Desperdiçar os escassos recursos
existentes em ocorrências envolvendo usuários de drogas ou pequeno tráfico não
é a forma mais eficiente de lidar com a violência urbana. Precisamos avançar no
desenvolvimento de ações de prevenção da violência e na qualificação da ação
policial. Com esse intuito, os institutos Sou da Paz, Igarapé e o Fórum
Brasileiro de Segurança Pública lançaram o documento Segurança Pública é
Solução com propostas práticas, embasadas em dados e fiscalmente viáveis que
podem contribuir para a melhoria do atual cenário.
Leonardo
de Carvalho Silva » Carolina Andrade - (Pesquisadores do Instituto Sou da Paz)
- Foto: TJDFT - Ilustração: Blog/Google – Correio Braziliense
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JUSTIÇA