Armas do lobby a favor e contra a reforma - O Planalto conta com grupos que vão lutar pela
aprovação das mudanças na Previdência, mas há também aqueles que entrarão em
uma guerra para que o projeto saia muito diferente do que entrou no Congresso.
Confira quem são eles e a força que têm
*Por Leo Cavalcanti – Bernardo Bittar
Na última quarta-feira, em meio às diversas
apresentações da reforma da Previdência, o chefe da Economia, Paulo Guedes,
sentenciou para a rede estatal de televisão: “Naturalmente, existem 6, 7,
8 milhões de privilegiados, que estão sendo atingidos pela reforma. Têm mais
força corporativa ou tiveram no passado, que dizem que (direitos) estão sendo
ameaçados. Na verdade, os privilégios estão sob ameaça”. O ministro não deu
nome aos bois, mas descreveu o lobby na forma mais crua. “(Eles) rondavam os
parlamentos, ofereciam favores aos parlamentares”
Menos de 24 horas depois das declarações de Guedes,
os grupos de pressão contrários a mudanças nas regras de aposentadoria estão
novamente prontos para a guerra, que terá como primeiro cenário o Congresso
Nacional ao longo de pelo menos seis meses. A partir de entrevistas com
políticos, profissionais de relações governamentais e professores, o Correio
montou um mosaico para revelar quais são as forças contrárias à proposta do
governo.
Regras
A dificuldade do Palácio do Planalto é o tamanho da
reforma e a quantidade de trabalhadores atingidos pelas regras. Uma das
categorias que começou a mobilização foi a dos integrantes da Polícia Federal,
que votaram em peso no presidente Jair Bolsonaro. A ação foi iniciada nas redes
sociais ainda na quarta-feira, minutos depois da apresentação do texto.
Policiais, em conversa reservada com o Correio, esperam um corpo a corpo no
Congresso.
“É preciso jogar duro com um governo, que fez
campanha com um slogan de investimentos em segurança e agora vira as costas
para a categoria”, disse um delegado da PF, que preferiu não se identificar. No
caso dos policiais, ficou estabelecida a idade mínima de 55 anos (para homens e
mulheres) e o tempo mínimo de contribuição de 25 anos para mulheres (desde que
tenham 15 anos de tempo de serviço) e 30 anos para homens (com mais de 20 anos
de tempo de serviço).
Um temor dos governistas é de que o prazo de
tramitação se prolongue até o fim do ano. Na última sexta-feira, o presidente
do Senado, Davi Alcolumbre, disse que a Casa pode aprovar o projeto até julho,
antes do recesso, caso passe pela Câmara até o mês de abril. É improvável. “O
problema é que a premissa não parece verdadeira, pois a Câmara muito
dificilmente concluirá a tramitação antes de julho”, disse Thiago Vidal,
gerente de análise e política da Prospectiva.
O prazo trabalhado pela consultoria com base em
propostas semelhantes é de que a discussão poderia se prolongar para depois do
recesso na Câmara. “Mas é bom lembrar que os líderes devem trabalhar pelo
encurtamento das 40 sessões que a comissão especial terá para deliberar sobre a
matéria. Tudo a partir de acordo com o presidente da Câmara, Rodrigo Maia”,
afirmou Vidal. Mesmo assim , o prazo é julho.
Militares
O lobby mais eficiente, antes mesmo do início
oficial da tramitação — começa na instalação da Comissão de Constituição e
Justiça (CCJ), na próxima terça-feira —, foi feito pelos militares, que ficaram
de fora da proposta apresentada por Guedes. O governo garantiu que, até 20 de
março, envia um projeto específico para o pessoal da caserna. Mas isso terá de
ocorrer antes, caso o Planalto queira que o texto ande mais rápido no
Congresso. “Sem os militares, é melhor esquecer o texto original. Os deputados
não têm como justificar, nas bases eleitorais, a não inclusão dos militares”,
disse Vidal.
A tramitação de uma Proposta de Emenda à
Constituição (PEC) é a mais complexa do Congresso, o que abre várias janelas de
oportunidades para os insatisfeitos com o texto original do Planalto. Qualquer
motivo pode se transformar na melhor desculpa para o deputado se recusar em
votar a reforma da Previdência. Para efeito de comparação, a reforma do governo
Lula, que previa três modificações na aposentadoria dos servidores, demorou
quase nove meses de tramitação.
A CCJ não debate o mérito do texto, apenas a
admissibilidade. Na CCJ, a proposta passa por três avaliações:
constitucionalidade, legalidade e técnica legislativa (normas e padrões) do
texto. Parte dos embates está nessa comissão, a mais cobiçada pelos parlamentares
do governo e da oposição. “Mesmo sem discutir o mérito, a atuação de grupos de
pressão é iniciada”, disse Luiz Alberto dos Santos, consultor legislativo do
Senado e professor de políticas públicas da Fundação Getulio Vargas (FGV).
Servidores de carreira típicas de Estado, policiais e trabalhadores da
iniciativa privada e rurais devem buscar os deputados objetivando a preservação
das atuais regras.
A expectativa é a de que o lobby mais efetivo seja
feito pelas associações de servidores com mais poder de fogo, como magistrados,
procuradores, auditores, gestores governamentais e policiais federais. “Mas
isso deverá levar outras categorias a buscarem interferir no texto, afinal, é
um texto amplo, que deve receber várias emendas”, considerou Santos. Caso o
texto seja aprovado na CCJ num prazo mínimo de cinco sessões, a Câmara é
obrigada a criar comissão especial.
Jogo aberto
Na comissão especial, o jogo dos grupos de pressão
se amplia, com a participação direta de setores empresariais, que tentarão preservar
o texto original do Planalto ou mesmo melhorar as posições em contraponto ao
lobby dos servidores. Nessa arena, há audiências públicas com interlocutores
qualificados sugeridos pelos próprios lobistas. “Os mais fortes atores do lado
do trabalhador estão nas associações de servidores de carreiras típicas, que
vão buscar apoios nos gabinetes. Os sindicatos dos empregados da iniciativa
privada perderam muito com a reforma trabalhista”, afirmou Antonio Augusto de
Queiroz, diretor de documentação do Departamento Intersindical de Assessoria
Parlamentar (Diap).
Ele acredita que a reforma deve ser aprovada a
partir da necessidade de mudança nas regras. “Antes isso não parecia tão claro
para os políticos, agora, os governadores vão pressionar as bancadas estaduais.”
É impossível prever quais os atores que mais devem avançar nas duas comissões.
Na última etapa da tramitação, no plenário, a atuação dos lobistas permanece,
mas com menor capacidade de atuação. Ali, o jogo é dominado pelas lideranças
partidárias.
(*) Leo Cavalcanti
– Bernardo Bittar – Correio Braziliense
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