Fritz, um
austríaco apaixonado por Brasília
Uma infecção levou o austríaco Friedrich Klinger à
morte aos 90 anos, na madrugada de sábado. Na manhã de ontem, familiares,
amigos, funcionários e também ex-funcionários se despediram de Fritz no velório
que aconteceu no Cemitério Campo da Esperança. Todos os presentes faziam
questão de ressaltar as qualidades de Fritz, sobretudo a gentileza.
“Foi emocionante. Foi colocada uma bandeira da
Áustria sobre o caixão e isso foi muito especial”, conta uma das noras dele,
Rosi Achar. Os netos, tanto os de consideração quanto os de sangue, fizeram
questão de falar algumas palavras sobre o avô que admiravam. Michelle Vianna,
40, relembrou quando foi à Áustria e fazia ligações de vídeo para o avô ter
contato com a terra natal. “Vou sentir falta da sua risada e do seu senso de
humor único”, lamentou. Daniel, 36, também citou as piadas do avô: “Gostava de
falar bobagem e divertia muito a gente”. Mesmo com o peso de seus 90 anos, não
havia um dia em que Friedrich Klinger não trabalhasse. Estava no restaurante
Fritz, que fundou há quatro décadas, de domingo a domingo.
“Ele era muito trabalhador e inteligente. Veio para
Brasília antes da construção, foi diretor de algumas empresas e depois mudou
para o ramo de restaurante”, afirma a filha Cristina Klinger. Em abril, um
pouco antes do aniversário de 90 anos, no dia 11, ele desenvolveu a infecção
que lhe foi fatal. Para a família, não poder mais trabalhar como antes foi um
dos agravantes para o estado de saúde. “Como ele sempre foi um cara muito
guerreiro, ver que não era mais o mesmo afetou o emocional também”, lamenta Cristina.
Em entrevista ao Correio, em abril do ano passado,
ele disse: “Nunca me permiti ficar velho. Nunca entrei em uma fila para idoso e
só me aposentei formalmente há dois anos.”
Neste ano, no entanto, ele precisou delegar as
responsabilidades do restaurante aos funcionários, já tão antigos que são
considerados uma família. Nascido em Viena, na Áustria, Fritz viu de perto o
horror da guerra.
Em 1954, com o país natal ainda tentando se
recuperar dos anos de ofensiva de Hitler, decidiu que era chegada a hora de
deixar o país. Estudante da Academia de Belas Artes de Viena, ele foi a São
Paulo com amigos para uma bienal de arte que celebrava a inauguração do
Parque Ibirapuera, projeto de Oscar Niemeyer, e nunca mais voltou.
Começou a trabalhar com marcenaria, casou-se com
uma brasileira, teve dois filhos e, em 1959, mudou-se para Brasília. Era uma
oportunidade: a construção da nova capital precisaria de seus serviços. Naquele
ano, São Paulo completaria 400 anos e, para celebrar a data, o Parque do Ibirapuera,
um projeto de Oscar Niemeyer, seria inaugurado com uma grande bienal de
artes.
Estudante da Academia de Belas Artes de Viena,
Fritz veio com colegas participar do evento. E não voltou mais. “A população de
São Paulo já estava ultrapassando a do Rio de Janeiro. Era a cidade do futuro”,
recorda-se. No fim da década de 1970, incomodado com a falta de produtos
alimentícios de qualidade na capital, abriu uma délicatesse, a Fritz Frios, de
queijos e embutidos.
O austríaco voltava às origens já que o avô dele
era açougueiro e acabou abrindo o próprio negócio: uma fábrica de salsichas em
Viena. A délicatesse foi um sucesso, mas as pessoas queriam mais, queriam comer
algo quente e ali mesmo. Levou, então, a funcionária da casa dele para cozinhar
lá. Ela havia aprendido a fazer típicos pratos austríacos, receitas da mãe de
Fritz.
Assim, foi criado o restaurante, no mesmo endereço
em que funciona até hoje, na 404 Sul.
Correio Braziliense – Foto: Ana
Rayssa/CB/D.A.Press
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