Taguatinga 61 anos » Memória de um pioneiro - Getúlio Romão: imagens de uma história que recomeça
a cada dia
“Minha raiz em
Taguatinga está muito profunda. Jamais vou mudar, jamais sairei daqui”. A frase
é do pioneiro Getúlio Romão. Apaixonado pela cidade, o fotógrafo e corretor de
imóveis lançou um livro em homenagem aos 58 anos de Taguatinga, em 2016. Na
obra Retratos e memórias, ele expõe 770 imagens da cidade desde o começo. De
1963 a 1975, Romão foi fotógrafo do Correio Braziliense, onde era setorista de
Taguatinga.
“Eu me tornei o
fotógrafo da cidade para o jornal. Vinha todos os dias para cá e sempre tinha
história nova para contar. Fotografei bailes, festas de carnaval, momentos bons
da cidade. Mas registrei também problemas que a região enfrentou e ainda
enfrenta nos dias de hoje”, destaca Romão.
Em seu escritório,
o amor pela cidade está revelado nas inúmeras fotografias espalhadas nas
paredes, mesas e álbuns montados por ele mesmo. No ano passado, em homenagem
aos 60 anos de Taguatinga, fez um álbum de fotos de antes e depois de pontos
importantes da cidade, como as avenidas comerciais Norte e Sul, a via Hélio
Prates, a Praça do Relógio, entre outros.
O pioneiro chegou
à cidade em 1960. Veio com a família, de Minas Gerais, em um ônibus próprio. O
mais velho de seis filhos começou a trabalhar com o pai aos 10 anos. A vinda
para a capital surgiu de um convite do amigo da família José Gonçalves Coelho,
que mais tarde se tornou administrador de Taguatinga e presidente da Associação
Comercial e Industrial da cidade (Acit). Romão cursou o antigo segundo grau no
Centro de Ensino Médio Ave Branca (Cemab) e graduou-se em arquitetura na
Universidade de Brasília (UnB), no entanto não chegou a seguir carreira. A
fotografia tornou-se uma das suas grandes paixões.
A ideia de colocar
os registros do desenvolvimento da cidade em um livro foi da amiga e também
pioneira Cléia Gerin. “Ela me convenceu a escrever uma obra que expusesse a
minha experiência como fotógrafo e testemunha no desenvolvimento da cidade que
ajudei a construir”, relata.
Inspiração
A professora
aposentada Cléia Gerin, 68, é idealizadora e administradora do grupo Pioneiros
de Taguatinga no Facebook. Ela conta que leu um livro sobre personalidades da
região e, quando percebeu a quantidade de pessoas que fizeram história, decidiu
criar o grupo, em 2011. Além da história, ao terminar a leitura da obra, uma
surpresa. “Hoje, são milhares de pessoas participando”, afirma.
Para Romão, o
apoio da amiga o inspirou a escrever mais quatro volumes de Retratos e
memórias. A próxima obra deve ser publicada ano que vem, com a história dos
clubes sociais de Taguatinga. “São espaços que fazem parte da nossa história.
Tenho muitos registros de todos eles. Espero viver bastante para completar
essas obras”.
Histórias de Romão
Avenida comercial
1966 — À
época, tinha em mim a vontade de registrar o desenvolvimento da cidade a cada
instante. A Avenida Comercial Norte, ainda engatinhando, era a única opção de
comércio da cidade.
Carnaval Clube dos
200
1973 — Depois que
comecei a registrar momentos com as mais diversas lentes de minha câmera
Pentax, não parei mais. Cobrir as festas sociais em clubes era, para mim,
motivo de muita satisfação. Eternizei, nos salões da cidade, a alegria de
amigos e amigas.
Clube Primavera
1984 – Acompanhei
e registrei o surgimento dos quatro grandes clubes da cidade. O Primavera era
um dos mais badalados. Nos dias de sol, lá estava eu clicando o encontro da
sociedade de Taguatinga. Assim como vi seu nascimento e apogeu, também
presenciei e registrei o seu declínio.
A cultura em primeiro
lugar - Entrevista Jaile de Assis Ricardo
Jaile Ricardo (E):"É
necessário que a arte seja orgânica, que faça parte do cotidiano dos
taguatinguenses". Na foto acima, Luiz Melodia, em 1982, visitando o
tradicional bar. Imagem clicada pelo fotógrafo taguatinguense Ivaldo
Cavalcante, da Galeria Olho de Águia
Jaile de Assis
Ricardo faz parte daquele seleto grupo de empreendedores taguatinguenses
preocupados com a comunidade que o cerca e, principalmente, com a cultura.
Conhecido como Kareka, ele mora em Brasília desde 1969 e é proprietário do
tradicional Kareka’s Bar, na Comercial Norte (QND 14).
Pelo local passaram
e passam artistas dos mais variados gêneros, da MPB ao rock. Nomes como Vander
Lee, João Suplicy, Paulinho Pedra Azul, Nasi, Jorge Mautner e Nelson Jacobina
se misturam com gente de casa, que mantém carreira consolidada nas noites da
cidade. De Gerson Deveras a Bruno Z, Branco Seixas, Ellen Oléria, Alexandre
Partes, Beto Sampaio e Paulo Verissimo, para citar alguns dos que marcaram
presença no palco do lugar. Duas gerações de fregueses, pelo menos, convivem no
amplo espaço para shows — a casa tem agenda cheia todos os meses.
Como era a cena
cultural de Taguatinga nos anos 1970?
Muito mais
pulsante, apesar dos poucos equipamentos e espaços à disposição. A galera
literalmente botava a arte na rua. Os grupos de artistas ocupavam toda a
cidade, independentemente do local, de coretos a praças. Mesmo sem recursos, se
fazia muita coisa.
O que mudou para os
dias de hoje?
Hoje, as
informações circulam mais, porém, há poucas ocupações de praças, por exemplo. A
arte precisa chegar às pessoas não só pela internet, é necessário que ela seja
orgânica, que faça parte do cotidiano dos taguatinguenses. É importante também
a ampliação de políticas públicas que alcancem a população e que façam circular
renda na região.
É verdade que a
cidade teve um dos primeiros grupos teatrais do DF?
Sim. Conversando
com o ator e produtor Bené Setenta (Manuel Benevides Filho), ele enfatizou que
o grupo Grutta foi o primeiro da capital. Os atores chegaram a encenar a peça
Morte e Vida Severina no Teatro Nacional. Com essa peça, fizeram uma excursão
por alguns estados.
Na época das festas
do então Clube dos 200, quais eram as bandas que animavam os bailes?
Todas as bandas da
cidade, como Raulino e seus Big Boys, além do Élson 7. Até o movimento da black
music, os caras dançavam divinamente bem. A Sarro Disco Show era quem dominava
as picapes das domingueiras. Os Pholhas também fizeram um show marcante no
Clube dos 200.
A diversidade e a
resistência cultural são marcas de Taguatinga desde o começo. O que a cidade
precisa hoje para se consolidar como polo cultural?
Precisamos de
possibilidades culturais, com um calendário anual de atividades para ocupar
espaços como o Teatro da Praça, as salas do Sesc e do Sesi e o Taguaparque, que
é um espaço excelente de multiatividades. Mas o principal é a presença efetiva
da comunidade. Que ela entenda que cultura é afirmação de identidade, de
pertencimento.
Por » José Carlos Vieira - Correio Braziliense
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HISTÓRIAS