Quem ama
mora no Gama, a cidade que tem um cronista apaixonado. Esticada num platô de
chapadas, a satélite que fez 59 anos dia 12/10 tem um estádio moderno, sítios
arqueológicos e intensa vida noturna. (Por Conceição Freitas)
Quem
ainda não sabe fica sabendo: há muito tempo, um publicitário num dia feliz
criou uma campanha para venda de apartamentos: “Quem ama mora no Gama”. Desde
então os gamenses e gamados adotaram o quase verso como a epígrafe da cidade.
O Gama
fez 59 anos nesse 12 de outubro. É seis meses mais velha que o Plano Piloto.
Que me perdoem as demais 29 cidades-satélites, mas o Gama é a cidade
teluricamente mais bela do quadradinho. Desdobra-se num platô de chapadas no
anel que contorna o avião do doutor Lucio. Quem mora no Gama está mais perto do
céu, do Sol, da Lua, das estrelas, de tudo quanto há acima de nossas cabeças.
Lá, a luz alumia até a alma.
Tem a
forma de uma colmeia, a área urbana do Gama. É projeto do arquiteto Paulo
Zimbres (1933-2019), o mesmo que fez a Reitoria da UnB, o projeto original de
Águas Claras (que nada tem a ver com o paliteiro construído) e o do Noroeste. A
história do Gama é muito mais antiga que a invenção do doutor Lucio.
Atribuiu-se o nome a um padre, Luís da Gama Mendonça, que teria morado naquelas
paragens no século 18. Mas o Gama existe antes mesmo do próprio nome: nele há
sítios arqueológico indicando a presença humana há milênios.
O Gama
tem um cronista à altura de tanto amor, Marcelo Pires Mendonça, que parece
conhecer não só as artimanhas da crônica como as do coração. Marcelo tem
saudade da poeira do Gama de sua infância.
“Sinto
muito por não termos mais dias empoeirados ardendo os olhos da molecada batendo
uma pelada com bola de plástico. Detestava poeira, e hoje sei que eu, quanto
mais empoeirado, mais perto de mim estava”, ele escreveu no site https://www.gamalivre.com.br/ O cronista gamado se lembra “dos campinhos de terra, com
pedras marcando o gol, pés cascudos e uma pelota iluminada. A felicidade estava
ali e nem percebi. Hoje a minha cidade se deita em um imenso tapete verde e
rebola, rebola muito, mas o gol não sai, roubaram meu time. Sinto falta de uma
bola…”
O mais
admirado e amado time de futebol do quadrado, o Gama, tem um estádio à altura
da cidade moderna: o Bezerrão é obra de Ruy Ohtake, arquiteto moderno da geração
que cultuava Oscar Niemeyer com devoção quase religiosa. O Gama tem uma igreja
singela no alto de uma colina. Tem intensa vida noturna, bares, botecos,
restaurantes, churrasquinhos, teatro, boa música, arquitetura moderna e
pré-história.
Se for
fazer a prova dos nove, o Gama nasceu antes da Candanga e do Bandeirante. Foi
na Fazenda do Gama onde Juscelino e comitiva desceram pela primeira vez no
sítio da futura capital, em 2 de outubro de 1956. Ao lado, no mês seguinte, foi
construído o Catetinho, a primeira obra moderna no cerrado.
Na cidade
de quem ama, o cronista não poderia ser menos amante: “Tenho um coração que
resiste e insiste em acreditar, se ilude fácil e é encantado, quanto mais
amores ele guarda mais sangra, se desmancha sempre e se reconstrói numa
velocidade estupenda. Na minha cidade tem quadras que escondem versos lindos,
músicas suaves, belos romances, gemidos murmurados e filmes inquietantes. Sinto
falta de um amor…”.
É ou não é uma cidade apaixonada?
Por
Conceição Freitas – Foto: Igo Estrela - Michael Melo - Daniel Ferreira - Metrópoles
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CRÔNICA