Segura, peão! Os brasilienses são mais goianos do
que imaginam. Nesta quinta, Goiânia faz 86 anos. Foi um gesto de ocupação do
Brasil profundo. E, sem os sertanejos, JK dificilmente faria a nova capital - (*Por Conceição Freitas)
Brasília se acha e sufoca, com sua sombra
arrogante, uma outra cidade planejada, espécie de ensaio da capital moderna que
surgiria depois. Vinte e sete anos separaram uma da outra, mas a primeira (e,
antes dela, Belo Horizonte) também foi um gesto de soberania de um país
ocupando a si mesmo. Hoje, Goiânia completa 86 anos.
Arquitetura moderna com traços de art déco, Goiânia
urbanizou o sertão goiano, abriu clareiras de concreto e asfalto nas antigas
solidões goianas e, sem saber, criou as condições para que Juscelino
construísse a nova capital.
São demasiadas as afinidades entre Goiânia e
Brasília, e não apenas míticas, históricas e geográficas. Há na alma
brasiliense, queira-se ou não, goste-se ou não, um cadinho de goianidade. Até
no nome elas têm origem semelhante. Brasília, feminino de Brasil; Goiânia, de
Goiás.
Ao contrário do que se pensa, a maioria dos
operários que construíram Brasília não era do Nordeste, era de Goiás. Nada mais
óbvio, era do lugar onde a nova capital surgia.
Cidade planejada dentro dos princípios modernistas,
dividida em três setores (central, norte e sul), irradiando-se a partir de um
ponto seminal, a Praça Cívica, Goiânia traz o futuro para as profundezas do
Brasil.
A velha Goiás tinha se tornado inviável,
aprisionada entre montanhas, afogada pelo esgoto a céu aberto, congelada pelo
tempo e dominada pelas velhas oligarquias goianas que foram vencidas pelas
revoluções de 1930/1932.
Um quê de magia se instalou no canteiro de obras de
Goiânia. Em 45 dias, a sede da Assembleia Legislativa foi erguida. O redemoinho
de construções atraiu o presidente Getúlio Vargas, que visita a cidade em
agosto de 1940 (“O verdadeiro sentido da brasilidade é a marcha para o Oeste”).
Um dos principais responsáveis pela ocupação do
Centro-Oeste foi Bernardo Sayão – o brasiliense mais goiano e o goiano mais
brasiliense da história, embora tenha nascido no Rio de Janeiro.
Quando Brasília começou a ser construída, no final
de 1956, Goiânia estava em plena consolidação. Se nos primeiros anos, o avanço
tinha sido vagaroso, na segunda metade dos 1950, três novos prédios surgiam a
cada dia. A terra vermelha tremia, em clarões urbanos distantes 200 km um do
outro, ligados pelo desejo de um país vigoroso, criativo, inventivo e com fé na
vida.
Não fosse Goiânia, é bastante provável que não
haveria Brasília. Foi na capital de Pedro Ludovico que se fortaleceu o
movimento mudancista. Além de Bernardo Sayão, vice-governador de Goiás quando a
nova capital do país começou a ser construída, muitos goianos de peso se
envolveram firmemente na defesa da construção de Brasília em terras goianas.
Terras que os goianos cederam aos brasileiros para que pudéssemos sonhar com um
país melhor, mais dono de si mesmo, mais crente em si mesmo e mais solidário
consigo mesmo.
*Inspirado em “Brasis, Brasil, Brasília”, de Gilberto
Freyre.
Por Conceição Freitas – Fotos: Leandro Moura/MTur –
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