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Entrevista: Flávia Arruda - Deputada Federal (PL/DF)


Feminicídio é uma epidemia. Ao CB.Poder, a parlamentar chama a atenção para a necessidade de debater políticas públicas e aprovar projetos capazes de enfrentar o machismo e suas consequências. Ela revela, ainda, ter sido vítima de um comentário constrangedor na Câmara

*Por Agatha Gonzaga 

"A gente tem de enfrentar isso e cada vez com mais força, afinco e indignação. Não podemos perder a capacidade de se indignar cada vez que uma mulher é morta"

A deputada federal Flávia Arruda (PL/DF) integra a maior bancada de mulheres eleita na história da Câmara dos Deputados: 77 parlamentares. Em entrevista ontem ao CB.Poder, parceria do Correio Braziliense com a TV Brasília, Flávia detalhou a luta para incluir na Casa pautas femininas, com debates e projetos voltados ao combate à violência contra elas. “A mulher também participa ativamente da política. Primeiro, a gente tem de trabalhar culturalmente isso (machismo). Acho que a gente tem de colocar esses agressores com a cara estampada, têm de ter vergonha do que estão fazendo”, defendeu.

Ela revelou, inclusive, que sofreu um constrangimento na Câmara dos Deputados durante reunião do próprio partido. Na ocasião, recebeu um elogio indevido de uma autoridade que dava uma palestra. “Ele parou, me olhou, e disse: ‘Nossa, que moça bonita. Aí, o deputado que estava comigo, um grande amigo, na mesma hora, falou: “Moça, não. Ela é deputada, casada e competente’. Ele ficou sem rumo”, contou. Confira abaixo os principais trechos da entrevista dada ao programa.

O que precisamos fazer para conter esses números de feminicídio? Infelizmente, nós chegamos ao 29º feminicídio no DF. Feminicídio é uma epidemia. Eu presido, na Câmara Federal, a Comissão de Combate à Violência contra a Mulher e Feminicídio e tenho escutado relatos estarrecedores. A gente vê que o machismo ainda impera. Acho que é preciso combater mais esse machismo arraigado na sociedade, esse sentimento de posse dos homens, que não permitem que as mulheres, muitas vezes, ou trabalhem, ou deixem a casa, ou a relação. Então, a quantidade de ações que a gente tem de fazer são inúmeras e coordenadas. Nós temos feito várias audiências públicas, inclusive, a última foi sobre a importância do papel da imprensa nessa divulgação, porque a gente tem sempre aquela questão: aumentou o número de feminicídio ou as pessoas estão denunciando mais? Acho notório o aumento que tem tido.

O machismo é uma formação cultural. Como se muda isso? É urgente. Eu tenho falado muito isso e propus que a gente vá para dentro das escolas. Tirar dessa cultura machista todos os conceitos e preconceitos. O Brasil é, ainda, um país machista e patriarcal. Ontem, nós celebramos a conquista do voto feminino, que é recente, pouco menos de 80 anos. A mulher conquistou o direito de mudar, mas, pouco depois, ela só podia sair para votar se o marido permitisse. Hoje não, a mulher também participa ativamente da política. Primeiro, a gente tem de trabalhar culturalmente isso (machismo). Acho que a gente tem de colocar esses agressores com a cara estampada, têm de ter vergonha do que estão fazendo. Não podem achar que é natural, que é comum: ‘Ah, quem manda na minha casa e na minha relação sou eu’. Então, a gente precisa combater isso com medidas efetivas.

Com relação à profissionalização das mulheres (vítimas de violência), como está a situação no DF? A gente tem procurado parceria. O sistema de assistência social nos ajuda muito com cursos profissionalizantes, cursos técnicos, e a sociedade civil também. Nas minhas emendas, eu destinei uma parte delas para associações que fazem esse serviço. Nós sabemos que esse ainda é um dos maiores problemas intercalados à violência doméstica: as mulheres que não têm autonomia financeira, não têm independência e, às vezes, nem mesmo a autoestima de saber que pode recomeçar, que pode sair disso. Acredito, pessoalmente, que todos os dias que a gente liga a televisão e vê mais uma mulher morta é uma sensação de se pensar: até quando? Até quando vão ficar nos matando? A gente tem de enfrentar isso e cada vez com mais força, afinco e indignação. Não podemos perder a capacidade de se indignar cada vez que uma mulher é morta. A gente tem de, além de tudo, ser mais rigorosos na aplicabilidade de leis, e falar sobre isso.

Esses homens que batem em mulher podem aprender que é um crime? O tribunal aqui do DF tem um projeto para esses homens e parece que tem tido um índice bom de ressocialização. Porque nós não podemos deixar de pensar no agressor, porque, muitas vezes, também tem pessoas doentes. Quando a gente falou em tirar a arma do agente público que bate em mulher, é porque é uma medida mais rápida. O homem que bate em mulher não pode andar armado, porque o próximo passo é matar.

Na sua opinião, a CPI do Feminicídio do DF contribui de alguma forma para solucionar esses casos? Eu, pessoalmente, não sou muito adepta. Eu acho que a CPI, muitas vezes, é utilizada para ataques pessoais, e para se promover também. Então, eu acho que a gente precisa tratar do tema diretamente. A gente não pode perder o foco do enfrentamento, do combate direto, do dia a dia, de lidar com os problemas. Quem sou eu para julgar? Mas deve ter algum motivo para essa CPI lá na Câmara Legislativa.

Nós temos homens, representantes políticos que trabalham com o tema, mas, no dia a dia, em um comentário, reproduzem comportamentos machistas. Como enfrentar isso? Hoje, na Câmara dos Deputados, nós temos uma bancada histórica de 77 mulheres. Acho um avanço, mas o machismo é o que mais reina lá. Às vezes, é tão cultural que eles nem percebem o tipo do comentário. Aconteceu comigo. Nós estávamos em uma reunião com alguns deputados do meu partido e tinha um personagem que estava lá dando uma palestra, explicando sobre um tema importante que vamos enfrentar sobre essas reformas. Quando ele terminou a fala, e eu cheguei quase no final, fomos cumprimentar a pessoa. Ele parou, me olhou, e disse: ‘Nossa, que moça bonita. Aí, o deputado que estava comigo, um grande amigo, na mesma hora, falou: “Moça, não. Ela é deputada, casada e competente’. Ele ficou sem rumo.

Há acessibilidade para avançar esses projetos com a pauta feminina? Quando o tema é mulher e social, as mulheres se unem suprapartidariamente. Há pouco tempo, a gente teve, infelizmente, uma mulher propondo a diminuição ou a retirada das cotas, dos 30% (para candidatas nos partidos). A gente se uniu, levou para a comissão da mulher, derrubamos e não vai passar. Sobre as cotas, eu acho que são discriminatórias, mas porque existe o preconceito. As cotas para negros existem, porque existe racismo. Então, eu acho que elas são educativas. Não acho que devem ser permanentes. A gente precisa disso por um período. Tirando essa discussão das candidaturas laranjas, que foi um problema da última eleição, muitas mulheres querem participar da política.

Entrevista Completa : Videos - 01 e 02 
Agatha Gonzaga - Correio Braziliense




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