DF sem vagas.
Veículos parados em locais irregulares resultaram em mais de 139 mil multas de
janeiro a outubro. Saída para resolver a situação passa por integração e
compartilhamento de meios de transporte, segundo pesquisadores
*Por Jéssica Eufrásio - Mariana Machado
Acostumado com a superlotação no
Setor de Autarquias Sul, onde trabalha, Thiago Cunha conta que já optou por
compras on-line para não ter que se estressar com estacionamentos
Eles estão ao
longo do meio-fio, sobre calçadas, em esquinas ou bloqueando rampas e garagens.
Onde houver espaço, há veículos estacionados de forma irregular, sobretudo em
áreas de grande circulação, como centros comerciais. De janeiro a outubro, os
órgãos fiscalizadores de trânsito do Distrito Federal emitiram 139,7 mil multas
a condutores que desrespeitaram as normas e deixaram carros e motos em lugares
inapropriados. Isso quer dizer que, em média, a cada três minutos e oito
segundos, uma pessoa foi autuada. No mesmo período do ano passado, o
Departamento de Trânsito (Detran-DF), a Polícia Militar e o Departamento de
Estradas de Rodagem (DER-DF) contabilizaram 149,6 mil infrações (leia Para
saber mais) — 6,5% a mais que neste ano.
Apesar de alta, a
taxa não reflete a realidade, como explica Francisco Saraiva, diretor de
Policiamento e Fiscalização de Trânsito do Detran-DF. “O espaço (para
estacionamentos) é incompatível com o tamanho da frota. Esse número (de multas)
é baixo, porque, para nós, não é prioridade (fiscalizar) estacionamento. Quando
alguém solicita, é atendido de imediato”, garante. “Não falta carro para
multar, mas não tem agente nem viatura disponível para atuar em todos os
estacionamentos”, justifica.
Segundo o último
levantamento da autarquia, até junho deste ano, mais de 1,8 milhão de veículos
estavam registrados no DF. Francisco ressalta que, se somados os que vêm do
Entorno, esse número se aproxima de 2 milhões. “Apesar da falta de
estacionamento, é preciso que o cidadão respeite os direitos dos demais. Na
pressa, você deixa alguém preso, sai para resolver alguma coisa e esquece.
Tenha paciência para encontrar um local adequado, porque você pode ser vítima
na próxima vez”, alerta.
No centro de
Taguatinga, não é raro ver essa cena. Além de veículos presos, a reportagem do
Correio flagrou carros estacionados em fila dupla e condutores esperando muito
tempo até conseguir uma vaga. Para evitar esses problemas, Daiana Martins
Ribeiro, 37 anos, prefere sair acompanhada de outro condutor. “É quase
impossível achar vaga em locais como Plano Piloto, Águas Claras e Taguatinga.
Sempre tenho de vir em dupla, para não levar multa”, contou a jornalista. “Não
sei se Brasília está preparada para um sistema de rodízio. Acho que poderiam
cobrar um preço mais acessível em estacionamentos particulares.”O operador de máquinas Marcos
Antônio prefere usar ônibus a carro
Prejuízo: Áreas próximo a
lojas e restaurantes costumam ser críticas. Sem vagas, as pessoas muitas vezes
desistem de comprar, o que prejudica os lojistas. No período de fim de ano, com
a maior procura por presentes de Natal, o problema aumenta, como explica José Carlos
Magalhães, presidente da Câmara de Dirigentes Lojistas do Distrito Federal
(CDL-DF). Ele ressalta dois pontos-chave: a falta de pintura nos
estacionamentos e o volume da frota do DF. “É um prejuízo ao varejo, porque o
consumidor desiste de entrar na loja, vai para outro lugar ou compra pela
internet”, lamenta.
Esse é o caso de
Thiago Cunha, 29: “No último mês, fiz duas compras on-line pela dificuldade de
ir ao local e procurar onde deixar o carro. Pela internet, é mais fácil, se a
gente pensa nessa dor de cabeça de achar vaga. O governo cobra que você
estacione em local correto, mas não oferece transporte público de qualidade,
nem estacionamentos suficientes”. O analista de sistemas trabalha no Setor de
Autarquias Sul e lembra que estacionar lá não é tarefa fácil. “Às 9h, está tudo
lotado, então o pessoal deixa as chaves com guardadores, e eles manobram os
veículos. É isso ou parar de forma irregular”, conta.
Além de temer
multas, o operador de máquinas Marcos Antônio Alves, 32, se preocupa com a própria
segurança. Na rua onde trabalha, na QNM 17 de Ceilândia, a rotatividade nas
vagas em frente ao comércio é baixa, principalmente por elas serem ocupadas por
funcionários e donos de lojas. “Prefiro vir de ônibus por causa disso. Aqui
perto, tem uma rua onde, às vezes, deixamos o carro, mas paramos correndo o
risco de ter o veículo furtado, de quebrarem o vidro, de arranharem se não
dermos dinheiro para as pessoas em situação de rua que vivem lá. A maioria dos
comerciantes estaciona em frente à loja querendo ter segurança”, relata Marcos
Antônio.
Daiana Ribeiro gosta de sair
acompanhada de outro condutor
Propostas: Para
especialistas, o desequilíbrio entre o volume de veículos e a oferta de vagas é
uma das causas dos problemas de estacionamento. Professor do Departamento de
Engenharia Civil da Universidade Católica de Brasília (UCB), Edson Benício de
Carvalho reforça a necessidade do aumento no uso do transporte coletivo e vê
como viável a implementação de zonas rotativas. “Também podemos pensar em prédios
de estacionamento, sejam eles verticalizados, sejam subterrâneos, que ficariam
próximo às áreas centrais. De lá, as pessoas chegariam aos destinos de ônibus,
metrô ou bicicleta”, sugere.
Diante das constantes reclamações de clientes sobre
a falta de vagas nas proximidades de uma barbearia que administra, na Quadra C3
de Taguatinga Centro, o empresário Guilherme Sabino, 20, negocia uma parceria
com o dono de um prédio de estacionamentos que está em construção na mesma rua.
“Serão quatro andares de vagas, com previsão de inaugurar no início do ano.
Quero fechar uma parceria para nossos clientes terem um voucher da loja,
apresentarem lá e conseguirem estacionar de graça. Eles, geralmente, falam que
precisam dar de duas a três voltas na região até conseguirem vaga”, conta o
jovem.
Para o especialista em transportes da Universidade
de Brasília (UnB) Pastor Willy González, o problema também é comportamental.
“As pessoas tentam parar mais perto do destino e terminam ocupando vias de
acesso, porque se acostumaram a caminhar pouco. Todos querem ir dirigindo. Se
compartilhassem o carro, o problema diminuiria um pouco”, pondera o professor
peruano.
Questionada sobre possíveis soluções para o
problema da falta de vagas, a Secretaria de Mobilidade informou que o primeiro
passo é criar a Zona Verde, a fim de “democratizar a utilização do espaço
público”. Além disso, a pasta pretende incentivar o uso do transporte coletivo
por meio da criação de corredores exclusivos; aumentar a integração do sistema;
e renovar a frota.
Zona Verde: Projeto debatido desde
a gestão passada, a criação da Zona Verde segue em avaliação. Em setembro,
encerrou-se o prazo para elaborar os estudos. Eles estão sendo analisados por
comissão técnica instituída pela Secretaria de Mobilidade. O resultado da
análise será apresentado em audiência pública. O projeto prevê estacionamentos
rotativos em áreas de grande circulação de veículos na capital. Ainda não há
prazos nem estimativa de valores.
1.804.572: Frota
de veículos registrados no DF. 139.770: Quantidade de multas por
estacionamento irregular na capital federal
Para saber mais- A
multa: Pelo Código de Trânsito Brasileiro, a penalidade para quem
estaciona de maneira irregular varia. Deixar o carro em esquinas, por exemplo,
é infração média, com multa de R$ 130,16. Se ocorrer em pistas de rolamento de
estradas, rodovias ou vias de trânsito rápido, passa a ser gravíssima, com
penalidade de R$ 293,47. Também é proibido parar junto a hidrantes, poços de
galerias subterrâneas, faixas de pedestre, ciclovias, calçadas, rampas de
acessos, garagens, locais de embarque e desembarque, vagas destinadas a idosos
ou pessoas com deficiência, viadutos, pontes e túneis. Nessas e em outras
situações listadas na lei, a multa varia de R$ 88,38 a R$ 293,47. Em todos os
casos, está prevista remoção do veículo como medida administrativa.
(*) Jéssica Eufrásio - Mariana Machado- Fotos~Ilustração:
/Jéssica/Mariana/Blog-Google Correio Braziliense
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BRASÍLIA - DF