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A AMAZON E O LEVIATÃ DO MERCADO DA CULTURA

A Amazon e o Leviatã do mercado da cultura - (*Victor Dornas)

Há uns dois anos, conversando com um colega sobre a chegada da gigante Amazon no Brasil, lembro-me dele dizendo que ela estava apenas estudando o mercado, que estava chegando de leve. Enquanto escutava aquilo, em pensamento ponderei que a Amazon não era uma empresa que “chegaria de leve”, ou que ficaria testando o mercado, ainda que o caso fosse a notória hostilidade da burocracia brasileira. E não deu outra. Em 2019 a Amazon provocou uma disrupção no Brasil e vem demolindo a concorrência, indiscriminadamente.

No início do ano fui ao Shopping Casa Park para assistir ao ótimo e premiado filme da biografia da Judy Garland e enquanto aguardava o horário do filme resolvi conferir as novidades na Livraria Cultura. Entrei com o intento de comprar livros e saí da loja com três peças de queijo artesanal. Não imaginei que um dia veria a Livraria Cultura vendendo queijos, churros e coisas do gênero em barraquinhas. E para completar a esquisitice, enquanto eu conferia as prateleiras que restaram na loja observei um cliente indagando uma das vendedoras acerca do preço de um livro de um modo assaz incisivo, um tanto rude até. O sujeito estava mostrando o celular para a funcionária e prontamente respondeu. “É que nós não temos como vender mais barato.” De fato, todos os livros que me interessaram estavam disponíveis no site da Amazon em preços consideravelmente mais baixos, porém achei grosseira aquela cena, posto que o óbvio estava ali estampado para qualquer pessoa com bom senso enxergar. E eu, com os queijos em mãos me lembrei dos bons tempos da loja, do quanto ela era linda, um verdadeiro ambiente de fomento à cultura e fiquei triste pois não estava ali para fazer filantropia e acabei comprando meus livros pela Amazon mesmo. É a regra do jogo, a guerra do mercado.

Por um lado, a disponibilidade e a praticidade que a Amazon oferece serve como um estímulo para o crescimento de aquisição de produtos de cultura no país. Por outro, observamos uma mudança drástica da cadeia produtiva na era da informação digital, uma vez que não há mais na cadeia produtiva tantas pessoas envolvidas, o ambiente físico, o funcionário, o arquiteto ou até o decorador que pensa na melhor edificação e, acima de tudo isso, o encontro humano. Penso que a economia sempre se ajusta e novas profissões virão, contudo é inevitável o receio de que locais feitos para o fomento à cultura numa economia retraída tenham que contar apenas com o subsídio de alguém. Sabe-se que hoje em dia muitas marcas e serviços gigantes como o Uber e o Youtube não visam lucro a curto ou médio prazo. Ano após ano são serviços que rendem prejuízo aos investidores que acabam compensando aquilo tudo com a expectativa de lucro a longo prazo e pela negociação de marcas e rede de patrocinadores. Mas tudo isso num ambiente virtual. Hoje em dia muitas lojas físicas são subsidiadas por grandes marcas apenas para servirem como mostradoras de catálogo sem necessidade de lucro, haja vista que o cliente vai ao shopping, observa o produto e compra pela rede.

A tendência é que, havendo um interesse, tais ambientes de fomento à cultura, ainda que não visem lucro como em outrora e sejam substituídos pela distribuição intermediada pelo digital, continuarão a existir. A questão é que no Brasil, numa economia prolixa, retraída e constrangida pela burocracia excessiva contumaz, talvez o período de adaptação demore muito mais. Talvez nós não vejamos tão cedo uma livraria tão exuberante em Brasília como foi a Cultura. A não ser que através da Amazon as pessoas se interessem mais por cultura e com isso escolham bem os seus representantes para criar um ambiente favorável ao incentivo, ainda que mitigado por um tipo de investimento mais voltado para a questão marcaria do que para o lucro imediato.

O queijo estava excelente, mas eu queria ter visto a Cultura viva como sempre foi.

(*) Victor Dornas - Colunista do Blog do Chiquinho Dornas - Foto/Ilustração/Blog - Google

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