Equipe
diz ser possível, com apoio do governo britânico, produzir 1 milhão de doses em
cinco meses
Vacina pode estar disponível em
setembro. Fórmula
experimental será aplicada em até 1.100 voluntários do Reino Unido nas próximas
semanas. Cientistas esperam obter resultados similares aos dos testes com
macacos. Imunizados, os animais foram expostos ao coronavírus e não se
infectaram
Animados
com bons resultados na imunização de macacos rhesus, pesquisadores da
Universidade de Oxford, no Reino Unido, dão início aos ensaios de uma vacina
contra a Covid-19 em humanos. A intenção do grupo é testar a fórmula em cerca
de 1.100 voluntários ao longo das próximas semanas e ter a vacina disponível em
setembro. Isso se os desdobramentos forem similares aos obtidos com os
primatas: seis receberam dose única da vacina, chamada ChAdOx1 nCoV-19, e não
se infectaram pelo novo coronavírus mesmo sendo expostos durante 28 dias ao
micro-organismo.
“O macaco
rhesus é a coisa mais próxima que temos dos seres humanos”, ressaltou Vincent
Munster, um dos integrantes da equipe de pesquisa, ao jornal americano The New
York Times. Segundo ele, os resultados da pequisa com as cobaias serão
compartilhados na próxima semana e enviados a uma revista científica.
Segundo
um comunicado da Universidade de Oxford, as primeiras doses em humanos foram
aplicadas no último dia 23, e outros voluntários, moradores de Oxford,
Southampton, Londres e Bristol, estão sendo imunizados desde então. Os
participantes, com idade entre 18 e 55 anos, têm que estar em boa saúde, morar
nas áreas de recrutamento e serem diagnosticados negativamente para a Covid-19.
Eles são
divididos aleatoriamente em dois grupos: o imunizado pela ChAdOx1 nCoV-19 e o
que recebe uma vacina contra meningite amplamente disponível (que funcionará
como controle). Os cientistas planejam, nessa fase, colher informações
sobre os aspectos de segurança da vacina e sua capacidade de gerar boas
respostas imunes contra o coronavírus.
A equipe
escolheu um grupo “de controle ativo”, em vez do tradicional controle
salino, porque espera detectar alguns efeitos colaterais menores da vacina
ChAdOx1 nCOV-19, como dor no braço, dor de cabeça e febre. A solução salina, porém,
não causa nenhum desses efeitos colaterais, o que poderia ajudar na
identificação de quem não recebeu a fórmula experimental.
“Se os
participantes recebessem apenas a nossa vacina ou um controle salino e
desenvolvessem efeitos colaterais, eles estariam cientes de que haviam recebido
a nova vacina. É fundamental para o estudo que os participantes permaneçam
cegos para receber ou não a vacina, pois, se souberem, isso pode afetar os seus
comportamentos de saúde na comunidade após a vacinação e influenciar nos
resultados”, justificam os pesquisadores, no comunicado.
Patógeno
enfraquecido: A vacina ChAdOx1 nCoV-19 é produzida a partir do vírus ChAdOx1, que é
uma versão enfraquecida de um patógeno causador de um vírus do resfriado comum,
um adenovírus. Esse adenovírus causa infecções em chimpanzés e foi
geneticamente modificado para impedir o crescimento em seres humanos. Vacinas
feitas com o vírus ChAdOx1 foram administradas em mais de 320 pessoas até o
momento e mostraram-se seguras e bem toleradas, embora possam causar efeitos
colaterais temporários, como febre, dor de cabeça ou dor no braço, informa o
comunicado.
Os
pesquisadores britânicos esperam que a nova fórmula faça com que o organismo
das pessoas imunizadas reconheça e desenvolva uma resposta imune à proteína
spike, ajudando a impedir que o novo coronavírus entre nas células humanas.
Segundo a universidade britânica, os participantes receberão visitas de
acompanhamento, quando serão colhidas amostras de sangue e registradas as
observações dos voluntários sobre o estado de saúde e a imunização. As amostras
de sangue serão usadas para avaliar a resposta imune à vacina
O fim do
experimento depende dos desdobramentos dessa etapa pós-imunização. “Para
avaliar se a vacina trabalha para proteger da Covid-19, os estatísticos da
nossa equipe compararão o número de infecções no grupo controle com o número de
infecções no grupo vacinado. Para esse fim, é necessário que um pequeno número
de participantes do estudo desenvolva a Covid-19. A rapidez com que vamos
atingir os números necessários dependerá dos níveis de transmissão de vírus na
comunidade”, detalha o texto.
Transmissão
natural : Diferentemente
dos macacos rhesus, os voluntários participantes da pesquisa não podem ser
expostos prolongadamente ao novo coronavírus. A pesquisa, portanto, depende de
como esses processos acontecerão naturalmente. A expectativa dos cientistas é
de que, se a transmissão continuar alta na região estudada, será possível
“obter dados suficientes em alguns meses”. Se os níveis de transmissão caírem,
porém o trabalho pode durar até seis meses.
Sarah
Gilbert, que lidera a equipe de vacinas de Oxford, disse, recentemente, que
está “80% confiante” de que a fórmula experimental funcionará nos ensaios
clínicos. Segundo o secretário de Estado da Saúde e Assistência Social, Matt
Hancock, o Reino Unido investirá em capacidades de fabricação para que a vacina
contra o coronavírus, caso seja bem-sucedida, esteja disponível ao povo
britânico “o mais rápido possível humanamente”. Os cientistas de Oxford dizem
que, com o apoio dos órgãos reguladores, o primeiro milhão de doses da vacina
poderá estar disponível até setembro.
“É
necessário que um pequeno número de participantes do estudo desenvolva a
Covid-19. A rapidez com que vamos atingir os números necessários dependerá dos
níveis de transmissão de vírus na comunidade” (Trecho
do comunicado divulgado pela equipe de pesquisadores da Universidade de Oxford)
Chave
da infecção: Localizada na parte externa do novo coronavírus, a proteína
spike desempenha papel essencial na disseminação do novo coronavírus. Ela é
como a chave que abre a fechadura da célula do hospedeiro, permitindo que o
Sars-Cov-2 se funda à membrana e entre no citoplasma de células humanas, onde
libera seu material genético e produz cópias dele mesmo, infectando o
organismo. Uma vacina que interfira nesse processo consegue bloquear o vírus.
Projetos avançam em diferentes
países. A
OMS estima que uma abordagem eficaz surja em 12 a 18 meses
Em estágio
avançado, a pesquisa da Universidade da Oxford se junta a mais de de 100
projetos de vacina contra a Covid-19, segundo a London School of Hygiene &
Tropical Medicine. A famosa faculdade de medicina britânica cita 119 projetos
de imunização contra a doença em fase de desenvolvimento “pré-clínica”, quando
ainda não foram iniciados os testes com humanos.
Oito projetos
alcançaram a etapa de testes clínicos de fase I em seres humanos — quatro na
China, dois nos Estados Unidos, um na Alemanha e um no Reino Unido. Nessa fase,
o principal objetivo é comprovar a segurança e, em menor medida, a eficácia de
um produto médico. Os testes de fase II e depois de fase III, realizados em
maior escala, visam avaliar a eficácia, antes que as autoridades de saúde
aprovem a eventual comercialização.
A Organização
Mundial da Saúde (OMS) e grandes laboratórios farmacêuticos estimam ser
possível ter uma fórmula eficaz em um prazo mínimo de 12 a 18 meses. Alguns
especialistas, como a britânica Sarah Gilbert, professora da Universidade de
Oxford, e Frédéric Tangy, do Instituto Pasteur, consideram possível ter uma
vacina até o fim deste ano.
Manter a
rotina: Atenta a outra frente da imunização, a
Organização Pan-Americana da Saúde (Opas) ressaltou, ontem, a importância
de as autoridades manterem os programas de vacinação durante a pandemia. “Se
ficarmos para trás nas imunizações de rotina, principalmente para crianças,
corremos o risco de surtos, sobrecarregando hospitais e clínicas com doenças
evitáveis”, justificou Carissa F. Etienne, diretora da entidade.
Segundo
Etienne, se os países não tomarem esse cuidado, “levará meses ou até anos para
reverter” os impactos nos sistemas de saúde. A sugestão é de que se dê
prioridade “para proteger os profissionais de saúde, os idosos e as populações
vulneráveis de outras infecções respiratórias, como influenza e pneumococo, que
podem levar a mais hospitalizações e podem ser mais difíceis de diagnosticar no
contexto da Covid-19”.
A situação do
sarampo na região também foi lembrada a coletiva. As taxas de cobertura estão
caindo na Venezuela, no Brasil e na Colômbia e em alguns estados dos EUA.
“Enquanto falamos, pelo menos três países estão trabalhando para conter surtos
de sarampo na América Latina”, ressaltou Etienne. “Os esforços para
controlar o sarampo devem continuar em segurança, em meio à pandemia da
Covid-19 ou corremos o risco de apagar mais de 20 anos de progresso.”
119: Quantidade
de pesquisas de desenvolvimento de uma vacina para a Covid-19 que estão na fase
pré-clínica, antes dos testes com humanos, segundo a London School of Hygiene
& Tropical Medicine.
Correio Braziliense