Ode ao bandolim Hamilton
de Holanda, um dos instrumentistas mais respeitados do mundo, fala da
importância da família, do Clube do Choro e de outros artistas no
desenvolvimento musical
*Por
Irlam Rocha Lima
Hamilton de
Holanda, aos 44 anos, é considerado um dos músicos mais importantes do mundo.
Foi em Brasília, que o carioca de nascimento, antes de completar 1 ano, veio
morar com a família. Aqui, no âmbito do Clube do Choro, ao iniciar a carreira,
o bandolinista formou com o irmão e violonista Fernando Cesar o grupo Dois de
Ouro. O duo lançou os CDs Destroçando a macaxeira e A nova cara do velho choro
e, depois de se apresentar num programa de tevê de grande audiência, foi
apresentado ao Brasil.
Em 2000, com
um trabalho reconhecido e elogiado nacionalmente, Hamilton, na busca pela
harmonia presente no violão e no piano, decidiu adicionar um par extra de
cordas — mais graves — ao bandolim tradicional e, com isso, desenvolver a
técnica polifônica. Foi com o bandolim de 10 cordas que, no ano seguinte,
venceu o Prêmio Icatu Harfort, que lhe valeu estada de um ano em Paris,
dedicado ao desenvolvimento da técnica como bandolinista.
Ao unir a
tradição e a modernidade, o bandolim de 10 cordas levou novas gerações de
músicos a se aproximar do instrumento e utilizá-lo em novas formações que, além
do choro, tocam samba, jazz, pop e rock. Vinte anos depois, isso ocorre em
várias partes do mundo. Em 2005, o artista lançou o 1byte, 10 cordas, primeiro
disco gravado exclusivamente como o “novo” instrumento — que lhe permite
imprimir velocidade nos solos e maior possibilidade de improvisos.
Radicado no
Rio de Janeiro há 17 anos, Hamilton tem expandido, cada vez mais, o processo
criativo, além de levar o celebrado trabalho às várias regiões do país e ao
exterior, com frequentes turnês pela Europa e pelos Estados Unidos, onde o
público e músicos consagrados o acolhem com entusiasmo.
História: De sua obra fazem parte 38 discos. Há os que o levaram a conquistar
vários troféus no Prêmio da Música Brasileira; e dois Grammy Latino, esses
pelos álbuns Bossa Negra, gravado com Diogo Nogueira, em 2017; e Samba de Chico
(com o qual omenageou Chico Buarque), em 2016. Outros destaques são o Casa de
Bituca (só com músicas de Milton Nascimento) e Lacob10ZZ, uma trilogia do
legado de Jacob do Bandolim. O mais recente é o Harmonize, com a participação
de Daniel Santiago (violão), Thiago Espírito Santo (baixo) e Edu Ribeiro
(bateria).
Hamilton, que
se considera brasiliense, é bacharel em composição pela Universidade de
Brasília (UnB), criou com Daniel Santiago a Sinfonia Monumental, quando da
comemoração do cinquentenário da cidade. Aqui, ele vem com frequência para
apresentações nos mais diversos palcos, principalmente no Espaço Cultural do
Choro. Há duas décadas, faz parte da agenda dele uma grande roda de choro
solidária, que comanda com a participação de músicos de diferentes gerações,
com renda revertida para a Abrace. Aliás, um número expressivo de músicos,
surgidos na capital nas duas últimas décadas, têm o bandolinista como
referência e inspiração.
Sempre
inquieto, Hamilton se impôs, desde o início de 2020, a compor uma música por
dia, tendo ultrapassado a marca de 100 — todas disponíveis no YouTube. No mesmo
canal, podem ser apreciados vídeos inéditos de apresentações que fez com o
acordeonista sergipano Mestrinho e o cantor e compositor João Bosco, pelo
projeto Canto na Praya — interrompido em função da pandemia do novo
coronavírus.
Entrevista: Hamilton de Holanda
O que o levou a
tocar bandolim? No meu aniversário de 5
anos, ganhei um bandolim do meu avô e comecei a tocar o instrumento nas
reuniões que o meu pai promovia no apartamento da 103 Sul, onde morávamos
quando chegamos a Brasília, com a participação de músicos ligados ao Clube do
Choro. Naquela época, ouvia bastante mestres do choro, como Ernesto Nazareth,
Pixinguinha e Jacob do Bandolim.
Quais foram suas
principais influências? Fui influenciado
pelo violonista carioca Raphael Rabello e pelo bandolinista e guitarrista
baiano Armandinho Macedo. Me tornei amigo de Armandinho, com quem tenho
dividido projetos. Gravamos, inclusive, um DVD tocando em pontos turísticos de
Salvador e adjacências.
Você é referência
para músicos basilienses surgidos nas duas últimas décadas. Como avalia
isso? Para mim, é uma responsabilidade, uma honra e me
leva a perceber que o trabalho realizado plantou sementes, que estão dando bons
frutos.
Foi de uma sugestão
sua que o então senador Arthur da Távola criou por projeto o Dia Nacional do
Choro. Que sentimento isso lhe traz? Ao me lembrar
de ter feito esta solicitação ao senador sempre, me traz uma grande alegria,
até porque o Dia do Choro é celebrado em 23 de abril, dia do nascimento de
Pixinguinha. Aliás, voltei a comemorar a data neste ano.
Como tem lidado com
a pandemia que paralisou também as atividades artísticas? Tenho cumprido a minha parte ao me manter em casa, cumprindo o
isolamento social. Me ocupo compondo, fazendo lives, elaborando novos projetos.
Obviamente, tive que cancelar vários compromissos, inclusive viagens aos
Estados Unidos e à Europa, onde faria shows a partir deste mês. Recentemente,
participei, como representante do Brasil, on-line, do Jazz at Lincoln Center,
promoção de Winton Marsalis, do qual tomaram parte também músicos importantes
dos Estados Unidos, de países da Europa e do Japão. Toquei alguns choros e, com
meu filho, Gabriel de Holanda, que também toca bandolim, interpretei All the
sings you are, um standard de jazz.
(*) Irlam Rocha Lima - Fotos: Fotografia das Artes - Rafael
Silva/Divulgação - Correio Braziliense
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