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O JOGO DIABÓLICO DE JOSÉ SERRA (Coluna Victor Dornas)


Por Victor Dornas 

O malabarismo feito pelos advogados do tucano José Serra exemplifica como é mantido o jogo político nas esferas jurídicas brasileiras. A ideia deste artigo é explicar de um modo simples e acessível como Serra costura suas defesas, de modo que qualquer um possa ter uma noção do que acontece de fato nesse jogo perverso de “garantismo” institucional.

A primeira coisa que o nobre leitor precisa entender é que na arte da guerra, um dos ataques mais fatais é usar o melhor golpe de seu adversário contra ele próprio. E foi isso que fez, não apenas Serra, mas todo o corpo jurídico formado por assessores parlamentares e advogados que consubstanciaram a decisão do preposto do PT, Dias Toffoli, ao barrar a entrada da PF no gabinete do senador tucano. A história toda começa na discussão sobre as prerrogativas exorbitantes dos parlamentares, isto é, no foro privilegiado e na blindagem por indumentária.
Reparem, com bastante atenção, na sutileza dos safados donos do poder.

Uma reivindicação social óbvia é que congressistas no Brasil usam de seus privilégios para ocultar crimes. Todos sabem. O Supremo, supostamente solidário com os anseios populares resolveu dizer: “Tudo bem, vocês, aí de baixo, o Zé povinho, estão certos. Nós, os deuses da sabedoria jurídica e não concursados ouvimos vossas preces. De agora em diante (ADI de maio de 2018) os parlamentares não terão foro privilegiado no Supremo por crimes cometidos antes do exercício da função.” Ual, grande coisa. Na perspectiva dos “garantistas”, foi uma vitória da dita direita, que sempre clamou pelo fim de tantas regalias que se subvertem em formas de obstruir a justiça. Ocorre que não era isso que a população queria. 

Não basta apenas tirar o foro se os privilégios permanecem incólumes. Além disso, a medida tomada pelo Supremo acabou se mostrando uma ferramenta para acobertamento de crimes. Explico.

O bandido adora o tal do domicílio inviolável. Por isso Queiroz se escondeu na casa do advogado de seita satânica que presta serviço ao clã Bolonaro. Com a decisão do Supremo, aquele parlamentar que comete crimes antes de se eleger (não são poucos, como todos nós sabemos) poderá transformar seu gabinete parlamentar numa organização criminosa, uma vez que, por estar sendo investigado por condutas supostamente cometidas em tempo pretérito em relação ao cargo parlamentar, a PF não poderá entrar neste local. 

No caso do senador tucano, não se sabe se ele mantinha ou não uma ORCRIM em seu gabinete, contudo na verdade nem o próprio Senado tem meios para investigar o local já que Serra teria cometido suas peripécias ainda em eleição no ano de 2018, por meio do famoso caixa 2.

Reparem que, usando a interpretação do Supremo, que muito bondosamente aquiesceu diante da vontade popular, Serra agora impede a PF de entrar em seu gabinete. Não só ele, mas qualquer parlamentar que supostamente tenha cometido crimes antes da posse terá o mesmo tratamento. Pergunta-se: Era isso que o povo queria? Evidentemente não. Mas a história não para por aí, nobre leitor. Dias Toffoli usou este argumento de que Serra só poderia ter seu gabinete investigado caso o suposto crime tivesse sido cometido durante o exercício do cargo apenas para castrar a polícia federal. 

E aqui cabe frisar a fala recente do nobre procurador Deltan Dallagnol nos lembrando que o próprio Supremo já autorizou batidas da PF em gabinetes de parlamentares investigados por crimes pregressos. Ou seja, se o Supremo entender necessário, ele sim pode autorizar, porquanto na grande mídia prevalece a fábula de que é Bolsonaro quem manda ou interfere indevidamente na política federal. Pois bem, nobre leitor, aqui vai o derradeiro pulo do gato...

Privilegiado pela decisão da ADI de 2018 que retirou o foro especial, José Serra e sua defesa de ilustríssimos advogados agora dá um pilão duplo carpado e inverte as regras do jogo. Pasmem vocês. Serra, após impedir a entrada da PF em seu gabinete, agora quer o contrário!  Quer ter uma interpretação extensiva que o equipare, mesmo antes da investidura do caro, à um senador, para que, assim, ele tenha foro privilegiado por condutas praticadas em 2018 e possa ser julgado pelo Supremo e não por um juizeco quaquer, como diria o advogado supremo Gilmar Mendes.

Ora, confundiu tudo? Antes não era equiparado, mas agora sim?

Pois é, caríssimo, bem vindo ao jogo sujo do “direito”, do legalismo deturpado como garantismo que conta com um vasto aparato midiático para acobertar escândalos como este. Reparem nas sutilezas, pois no caso, Dias Toffoli, o advogado do PT, está blindando José Serra, um cacique tucano, quando a ideia é que eles fossem supostamente inimigos ideológicos?

Inimigos uma ova! É o teatrinho sórdido sendo debelado enquanto o povo dorme sonhando com coisas sem sentido, rendidos num onirismo cúmplice e legitimando toda essa corja de atores políticos que parecem, num primeiro momento, muito sofisticados e equilibrados. A melhor retratação do diabo nos cinemas é sempre uma figura aparentemente bondosa, de fala mansa, ponderada.

Reparem no jeito de José Serra. Um sujeito manso, comedido e quase bobo.



(*) Victor Dornas - Colunista do Blog Chiquinho Dornas ,fotos ilustração: Blog-Google 


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