As muitas Asas
de um Plano
*Por Conceição
Freitas
Quanto mais o
Plano Piloto se aproximar do restante de Brasília, ou seja, de suas outras 30
áreas administrativas, “quanto mais alta for a qualidade urbana de seu entorno
próximo, mais garantida estará sua preservação”. O alerta faz parte de um
documento que a professora de arquitetura da UnB Sylvia Ficher encaminhou aos
representantes da Unesco que vieram a Brasília no começo do ano passado para
averiguar as condições de preservação das qualidades urbanísticas que fizeram
da cidade patrimônio da humanidade. O documento foi enviado a pedido dos
visitantes. Somente estimulando “a integração e articulação entre este
core
(centro/coração/núcleo,
no jargão arquitetônico) de alto significado urbanístico e arquitetônico e o
restante da aglomeração”, escreveu Sylvia Ficher, é que será possível estancar
as tentativas de romper com as escalas urbanísticas, de ocupar espaços vazios,
de ceder áreas públicas à privataria, de adensar o sítio tombado, de
descaracterizar o projeto de Lucio Costa. Até que, finalmente, a cidade perca o
título concedido pela Unesco.
Ainda Ficher:
“Inegavelmente, a metrópole tem uma forte relação de dependência com esse
centro (o Plano Piloto). Porém tal centro não existe no vácuo, ele é parte da
metrópole, é dela igualmente dependente e somente poderá ter sua alta carga
simbólica preservada caso se fortaleçam os seus elos com a aglomeração maior.”
No mais das
vezes, continua a professora, “nos perdemos em polêmicas sobre questões
pontuais — puxadinhos & cia — e perdemos de vista o panorama maior da
gestão de uma metrópole de quase 4 milhões de habitantes, a qual tem entre as
suas características próprias o fato de seu centro — o Plano Piloto e
adjacências — estar sujeito a legítimas ações de preservação.”
Por certo, os
defensores incansáveis do sítio tombado devemos à cidade um olhar panorâmico e
democrático, de modo a que possamos defender a expansão da qualidade urbana do
núcleo simbólico para todo o quadradinho. Toda e qualquer política urbana e de
preservação do conjunto tombado terá de levar em conta as condições
urbanísticas de toda a mancha habitada.
A professora
chama a atenção para a superposição de instrumentos legais de proteção a
Brasília, editados em nível distrital e federal. Sylvia Ficher citava, nesse
documento de (sete anos e meio atrás), a minuta do PPCUB (o suposto Plano de
Preservação do Conjunto Urbanístico de Brasília) com sua quase duas centenas de
artigos . “O que está sendo proposto é o esquartejamento definitivo do Plano
Piloto, já por si excessivamente setorizado. Ficando subentendida a noção de
que a sua preservação é algo isolado, algo que pode ser pensado e gerido sem
considerar sua inserção na metrópole brasiliense.”
Por mais
importante que seja o Plano Piloto, com sua carga simbólica, arquitetônica,
urbanística, histórica, afetiva, somente ele não nos representa. E já está
provado que a voracidade da especulação já chegou, há muito, às
cidades-satélites.
(*) Conceição
Freitas é jornalista - Fotos/Ilustração- Blog/Google
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