Por Victor Dornas
Uma das repercussões
mais constrangedoras da indicação de Kassio Nunes para o Supremo tem sido o
trabalho da base do governo para acalmar os cães raivosos da ala direitista que
repudiaram com veemência a indicação do petista ao cargo. A extrema imprensa
stalinista tem chamado qualquer pessoa que é contra a indicação de “extrema
direita” ou “direita radical”, como se qualquer um que visse problemas num
presidente que escolhe o próprio juiz de seus casos fosse necessariamente
aliado à agendas ideológicas. Claro que não.
Mas o fato constrangedor é o seguinte: Bolsonaro e sua trupe tem antecipado nas redes quais serão as posições do recém-empossado ministro em futuras questões. Pessoas do próprio governo e o próprio presidente tem dito como ele votará em questões mais vinculadas à ala olavista, como aborto, porte de armas, dentre outros. Loucura não? O tal Kassio nem se pronuncia sobre nada disso, pois já garantiu o seu.
Quando um país,
independentemente de bandeira ou espectro político e ideológico, acha normal um
presidente indicar o juiz dos seus casos e ainda antecipar os votos do mesmo,
com silêncio complacente do citado, é sinal de que os arrimos mais basilares a
respeito do entendimento social acerca de preceitos básicos democráticos estão
totalmente ferrados.
O fanatismo é apenas o
reflexo do despreparo, da falta de estudo. Isso de parte a parte, tanto dos
entusiastas bolsonarescos que oferecem sua leniência incondicional como os
Stalinistas, remanescentes dos grupelhos contra o golpe militar que infestam as
redações de jornais. Os dois se retroalimentam, mantendo um sistema que bestializa
a população militante.
O governo agora é
vidente e já antecipa votos de um ministro do Supremo.
Imaginem o escândalo
que isso seria numa suprema corte de um país europeu ou americano. Mas no
Brasil, ao que parece, perdemos nossa aptidão para a indignação racional. Virou
uma rinha de animais incapazes de reconhecer falhas em suas próprias bandeiras.
Uma guerra nojenta que prostra a democracia e, claro, envolve também muita
grana.
O episódio da indicação
de Kassio Nunes serve para a população vigilante identificar todos os
jornalistas que são comprados pelo governo. Aqueles que apoiam
incondicionalmente o presidente, mas o fazem por convicção e não por
patrocínio, não disfarçaram o constrangimento de ver Bolsonaro indicando um
ministro ligado a Ciro Nogueira que nunca votou contra qualquer pauta dita
progressista um dia após reunir-se com Gilmar Mendes.
Todos os jornalistas
alinhados à tal direita que ao menos não estranharam o fato são comprados pelo
governo, ainda que indiretamente. Simples assim.
O sistema de compra de
jornalistas não ocorre, por óbvio, apenas na dita esquerda. E essa compra muitas
vezes vem por meio de prestígio que não raro rendem, inclusive, futuras
indicações a cargos políticos ou outras benesses.
Não é segredo e na verdade é
até rotineiro. A incidência das redes sociais evidenciou mais ainda a
hipocrisia de quem defende o indefensável, porém uma população que interpreta a
politização como mera afiliação partidária incondicional (adota-se o pacote
completo de pautas de esquerda ou de direita) é o ambiente mais propício para
que essa cara de pau se perpetue.
Costumo dizer que não
me importa se a pessoa é simpática à pautas de qualquer espectro, seja mais
conservadora ou mais progressista. O problema começa quando a simpatia se
personaliza na figura do político, numa devoção herética, aliás. “Deus acima de tudo”,
desde que seja o Deus do político em questão.
Cada um inventa o seu
próprio Deus. Chama-se: Megalomania. O Deus do Bolsonaro deu ao mesmo o dom da clarividência jurídica. Notável!