Por Victor Dornas
A piada infame do
presidente sobre a lava jato ter acabado por seu governo ser supostamente
incorruptível é uma fala que tende a ser cada vez mais constrangedora com o
passar do tempo. O caso do Senador Chico Rodrigues, vice-líder de Bolsonaro flagrado pela PF com dinheiro sujo (literalmente, inclusive) foi tratado
pelo governo como um episódio apartado, uma vez que Bolsonaro só teria
responsabilidade sobre seus ministros alegadamente incólumes.
O presidente ainda
tentou capitalizar em cima do escândalo com aquelas frases de efeito populistas
que tanto tivemos que ouvir no governo Lula que cativam os indolentes. O governo sabe,
entretanto, que o dinheiro sujo na cueca na verdade representa algo muito mais grave. Explico.
Desde que Bolsonaro anunciou que seu governo doravante seria ostensivamente ligado ao PP, seu antigo partido que, aliás, está mais encrencado com a lava-jato do que o próprio PT, e passou a trocar afagos, tirar fotografias com figurões tipo Ciro Nogueira, Valdermar Costa Neto, dentre outros, houve uma mudança abrupta na representação do governo no Legislativo. Pessoas como Bia Kicis e Carla Zambelli (a “prezada”) foram postas para escanteio.
Semana retrasada, aliás, mais de uma dúzia de parlamentares foram desvinculados da liderança, dentre eles o famoso Major Vitor Hugo, federal do PSL que inicialmente esbravejou alguma revolta, todavia, por algum motivo certamente partidário, ou seja, temendo represálias, acabou sendo silenciado e endossou o coro cúmplice dos demais colegas.
Algumas figuras, ironicamente, foram poupadas dos cortes...
Fernando Bezerra, por
exemplo, ex-ministro de Dilma Rousseff, alvo da Operação da PF denominada “Desintegração”,
continua na liderança do Senado. Ricardo Barros, alvo de busca e apreensão por
delação que o acusou de receptar 5 milhões de reais na estatal Copel do Pará,
também continua firme e forte na liderança da Câmara. É calamitoso como um
governo qwue se elegeu se antagonizando ao PT agora coloque petistas em cargos
tão altos como no Ministério da Justiça, na Procuradoria Geral, no Supremo e
também em lideranças no Legislativo.
Cada vez mais árdua é a tarefa do
militante cara de pau em justificar tanta governabilidade, palavrinha bastante
comum também no episódio do mensalão lulista. Não é difícil inferir,
por tudo isso, as razões que Bolsonaro tem para não opinar sobre a fuga do líder
do PCC solto pelo primo do Collor.
Aliás, vale notar, a sessão de ontem do
Supremo foi vergonhosa pois em nome da tentativa de salvação de imagem
institucional, os ministros, como por exemplo a juíza de formação Rosa Weber,
trataram a questão como mera dissidência hermenêutica, ou seja, um simples
desacordo compreensível sobre a loucura promovida por Marco Aurélio ao
transformar seu gabinete no Supremo no pernil de ouro dos advogados de gente
que eterniza o legado Marcola. PCC,
comando vermelho, enfim. É o fim da democracia quando o PCC manda no Supremo.
Não é apenas do filho
do presidente, ou o cheque depositado pelo miliciano na conta da primeira dama.
É a representação do governo inteira na Câmara que tem mil motivos para odiar
qualquer coisa que tenha a ver com a Lava Jato. Bolsonaro não quer se opor a
nada disso, ele está feliz da vida com as pesquisas que tanto desprezou em
termos de confiabilidade mas que, quando são positivas para ele, aí sim gozam
da mais alta credibilidade do mundo.
Ocorre, senhor presidente, que o preço cobrado por essa gente cresce como bola de neve. Se o senhor achar que conseguirá manter raposas deste nível na coleira, certamente se frustrará. Isso na melhor das hipóteses, uma vez que, considerando a trajetória pregressa de Bolsonaro enquanto parlamentar do baixo clero do PP que votava junto com o PT, talvez nada disso seja exatamente uma novidade.
Talvez tenha sido tudo
calculado lá no início. Vai saber...
Governabilidade por
essa via de permuta indecorosa sempre termina mal. O único caminho para
qualquer presidente que queira de fato mudar alguma coisa nesse país exige
atitudes impopulares. Exige desinteresse com reeleição. Exige motivação do
eleitorado com as causas defendidas na campanha. A governabilidade que almeja
afagos de caciques políticos ou elogios da grande mídia stalinista só tem por
escopo o mero projeto de manutenção de poder.
Bolsonaro já tem uma legião de fanáticos a seu dispor. Ele está acima da crítica, não é mesmo? Se este país de fato acordar, entretanto, toda essa pompa caudilhista pode tombar do cavalo com a mesma rapidez que outrora alçou a fama por meio do populismo de ocasião, demagógico e sórdido. A justiça tarda, mas não falha.