Aos 19 anos, virou mascate: vendia camisas, lençol,
tolhas e outros artigos em meio ao grande canteiro de obras que era Brasília.
Morou na Cidade Livre. E um episódio marcou a vida do palestino para sempre.
Um senhor de terno, que estava com outros senhores também de terno, perto
do que viria a ser a Catedral, chamou o mascate e perguntou se ele tinha meias
para vender. Ao prosseguir com mais uma venda, um colega operário lhe contou:
“Sabe quem é aquele ali, para quem vendeu as meias? É o nosso presidente!”
“É aqui que vou ficar!”: O jovem, que ainda tinha dificuldade para entender o português,
compreendeu algo maior. Que o futuro estava ali diante dos olhos dele. E
afirmou: “É neste lugar mesmo que eu vou ficar”, disse, feliz ao ter como
cliente Juscelino Kubitschek. Anos depois, tornou-se grande comerciante em
Taguatinga. Foi dono da casa Nadi, de roupas femininas. Os filhos, Nader e
Abdel, deram continuidade aos negócios da família. São donos de lojas de
enxoval para bebê. A Babycenter, em Ceilandia e no Gama.
Novo negócio na gastronomia: Nader Nadi, 42 anos, é um dos quatro filhos do mascate que viraram
empresários. Nasceu em Taguatinga e decidiu com o irmão, Abdel, diversificar os
negócios e investir na gastronomia.
Inauguraram, há dois meses, o restaurante Istambul,
na 215 Sul. Nader, que ficou à frente do negócio, conta que o momento foi muito
difícil. Comprou o ponto comercial em fevereiro e, logo, veio a pandemia.
Passou meses tendo de arcar muitos custos sem poder abrir o estabelecimento,
além de administrar os outros negócios da família.
Vendas on-line: “A primeira semana foi de choque, desespero. Nunca nos preocupamos com venda on-line. Sempre contamos com a venda presencial. Mas, depois de uma semana perdidos, começamos a oferecer os produtos da BabyCenter, pelo WhatsApp e pelo Facebook. Deu certo, pois muitas grávidas precisavam de enxoval para os filhos que nasceriam. Agora, temos nosso site”, conta Nader.
Pandemia separou a família: O pai, hoje com 84 anos, voltou para a Palestina há 10 anos, quando se aposentou. “Meu pai é apaixonado pelo Brasil. Vem, sempre que pode, nos visitar, com a minha mãe. E nós também vamos muito lá.” Os laços com a terra natal sempre foram mantidos. A mulher de Nader, palestina naturalizada brasileira, e as duas filhas pequenas estão no estado do Oriente Médio. O que era para ser uma viagem de férias se estendeu mais do que o previsto. Com a pandemia, não conseguiram voltar ainda ao Brasil.
Nader fez questão
de oferecer variedade de opções. Carré de Carneiro, coelho, ragu de rabada são
atrações da casa. Frutos do mar também. É possível até comer um delicioso
bacalhau à portuguesa.
A doce princesa árabe: Outro personagem importante nesta história é o chef de cozinha e consultor de gastronomia Edilson Oliveira. A troca cultural entre palestinos e brasilienses rende ótimos sabores e pratos. São as mãos do brasilense as responsáveis pelos pratos do Istambul. Ele tinha conhecimento na área, mas pôde aprofundar com Nader. Foram a São Paulo pesquisar referências no segmento. E Nader fez questão que Edilson aprendesse uma sobremesa muito apreciada: a Knafa. O Istambul é o único em Brasília a oferecer o doce árabe. “É nossa princesa da casa”, diz Edilson. Ela é feita com fios de ovos, queijo e vem acompanhada de sorvete de pistache.
Produção artesanal: Os pães, pastas e queijos servidos também são especiais. Tudo é feito lá de forma artesanal. E tem gente que pede para levar para casa
Festival cultural: Nader abriu o Istambul para música, dança e eventos, com número limitado de pessoas. Lá, tem happy hour e já foram realizadas duas festas de casamento. A noite latina e a noite de tango foram grande sucesso. E já há reservas para a próxima apresentação do premiado casal brasileiro de tango de pista Juliano Andrade e Paula Emerick, que será em 3 de dezembro. Músicos da cidade também têm espaço cativo lá.
“A gente tem de
sonhar, senão as coisas não acontecem” (Oscar Niemeyer, arquiteto)
*Por Samanta Sallum – “Coluna Capital S/A” – Fotos: Divulgação – Correio Braziliense