Fechássemos
os olhos e talvez só conseguíssemos pensar no calor que atormenta Brasília em
agosto e é possível que sofrêssemos também com os narizes sangrando diante da
seca cruel. Mas, não queríamos fechar os olhos e preferíamos mantê-los aberto o
quanto fosse possível porque era a primeira vez que saíamos de verdade da
cidade pequena.
Meu pai nos
guiava no Gol preto, cuja lataria quase encostava no chão diante da lotação.
Ele conhecia Brasília. Tinha visitado a capital na juventude, quando quis
liderar um partido político no interior, e acho que tinha voltado alguma outra
vez no ano em que Joaquim Roriz derrotou Cristovam Buarque na disputa pelo GDF.
Ele falava com fervor sobre um pastel de banana e canela com caldo de cana da
Torre de TV.
As imagens
da Catedral me iluminavam desde muito cedo. O azul dos vitrais tinha se tornado
uma pequena obsessão e eu revirava fotografias para contemplá-lo. Também me
causava fascínio um souvenir do Memorial JK. Eu, menino, queria entender o que
era um memorial e não me bastavam as explicações que os adultos me davam. JK era
mineiro como nós e tinha morrido pelas mãos de uma ditadura estúpida que eu
aprendi a odiar ainda pequeno. Eu queria saber.
No dia em
que não fechamos os olhos para não deixar de ver o branco encardido do concreto
brasiliense, eu já sonhava com a UnB, mas era um desejo distante. Então, eu nem
suspeitava que, anos depois, estaria aqui. Por isso, achava que não tinha
direito de perder qualquer detalhe e me encantei ao passar sob os arcos da
ponte.
Se eu
soubesse quantas vezes estaria no Congresso Nacional, talvez naquele dia nem
tivesse tido tanta vontade de entrar e de ver de perto o escuro meio estranho
que algumas obras de Niemeyer guardam. As luzes artificiais hoje me cansam, mas
há uma foto em que sorrio e visto uma camiseta muito feia com o Plenário da
Câmara ao fundo. Desde então, os azulejos de Athos Bulcão permanecem assentados
nos meus olhos.
Há um tanto
de nostalgia nisso, mas escrevo não porque queira lembrar daquele tempo. São 10
anos aqui. Eu já nem reconheço o menino que recém tinha completado a maioridade
e chegou careca, por causa do vestibular, e se perdeu na primeira vez que
tentou cruzar as quadras 400 para chegar à UnB, muito menos aquele garoto da
primeira vez. Gosto de lembrar de tudo isso. Escrevo, porém, porque, dia
desses, ainda me peguei sem querer a fechar os olhos e tentando guardar, sem
conseguir, tudo o que Brasília tem para dar. (Vídeo)
Alexandre de Paula – Foto - Vídeo Pelo
alto - Ilustração: Blog-Google – Correio Braziliense.