Os tempos de morte apocalíptica,
somados à perversão pública dos ensinamentos do Nazareno, clamam por uma Páscoa
repleta de manifestações firmes dos responsáveis por orientar a cristandade nas
suas muitas vertentes teológicas a respeito de quem é Cristo e sua posição na
história humana. O silêncio crucifica Jesus e a cristandade fiel nesse
gigantesco gólgota em que o Brasil se transformou.
Não se trata de manifestos
políticos a respeito da tragédia humanitária, com feições de genocídio. Não. O
clamor, aqui, tratado é espiritual. É a espera de afirmação contundente dos
líderes religiosos cristãos de que Jesus somente pode ser conectado à defesa da
vida.
Incabível o silêncio de tais
lideranças em face da pública e frequente associação de Cristo a pessoas e
ideias com Ele incompatíveis na essência, como os que manifestam desprezo pela
vida mediante a exaltação da morte por doenças, armas, violência, descaso aos
semelhantes e desrespeito humano de toda sorte.
Urge proclamar em voz alta: Jesus
é vida. E mais: Deus acima de todos, mas pela vida e não pela morte!
Assim é desde o gênesis: Javé Deus
plasmou o homem, pó da terra, insuflou em suas narinas um sopro de vida, e o
homem se tornou um ser vivo. João retrata com ênfase a presença de Emanuel no
mundo: Eu vim para que os homens tenham a vida e a tenham em abundância.
Sopro de vida, não de morte. O
sopro de vida da presença de Deus na história humana tem muitas vertentes. A de
agora consiste em salvar vidas com remédios, hospitais, vacinas, além de
solidariedade e de compaixão, retratadas nas medidas sanitárias de convívio.
Qualquer transigência será
farisaica.
Não é possível mais silenciar ante
a invocação de Deus e de Cristo por aqueles que, ao mesmo tempo, propagam em
favor da morte e da violência, contrariamente à divindade em Jesus.
A Páscoa que se avizinha convida
por veemente manifestação dos líderes cristãos contra os que invocam a
inevitabilidade da morte para justificar as centenas de milhares de cadáveres e
os milhões de concidadãos que sofreram as agruras dessa doença terrível, sem
contar os que ainda sofrerão. Lembre-se das palavras de Jesus quando tentado no
deserto para pôr em risco sua própria vida: não tentarás ao Senhor teu Deus.
A cristandade não pode ser
farisaica. Ser significará afastar Jesus e seu povo, ao acolher, sem qualquer
ressalva, aqueles que colocam a vida do próximo em risco pela ausência de
cuidados sanitários, pois Ele expulsou do templo os que subvertiam a máxima que
cita: minha casa será chamada casa de oração! Oração para quê? Para a vida.
Então, o templo não deve acolher em silêncio, quiçá com alegria, os que
propagam a morte, por exemplo, pela presença sem conduta protetora à saúde do
próximo. Cumpre seguir Cristo na advertência e, se necessário, na expulsão.
Dentre os ensinamentos de Jesus,
tem-se no Sermão da Montanha passagem relevante neste contexto: Felizes os
promotores da paz, porque serão chamados de filhos de Deus. Soma-se a este o
mandamento acrescido pelo Nazareno ao lado do amor incondicional a Deus: Amarás
a teu próximo como a ti mesmo. Não há mandamento maior do que estes, diz.
Estão os líderes cristãos
lembrando aos poderosos do país que Jesus não está à disposição dos promotores
da morte e da violência, mas, sim, do amor ao próximo e da paz?
Deveriam, em clara e alta voz
espiritual. Não política apenas. As portas dos templos e dos corações cristãos
devem ser franqueadas somente aos que professam em Jesus a paz e a vida. Nesse
momento de morticínio e sofrimento catastrófico dos brasileiros, negar essa
coerência por questões e interesses humanos momentâneos, financeiros ou
políticos, é revelar-se falso profeta, os que chegam perto de vós sob a
aparência de ovelhas, mas por dentro, de fato, são lobos vorazes. Pelos seus
atos, os haveis de conhecer, indica Cristo.
Jesus propaga o amor ao próximo, à
vida e à paz, mesmo diante do martírio que sofreu do espancamento no tribunal
até a crucificação. Incabível à cristandade silenciar e muito menos acolher os
que defendem a tortura, porque estará entregando Cristo ao mesmo flagelo pelo
enfraquecimento da força do seu sofrimento junto aos fiéis e aos não fiéis.
Incabível lamentar a paixão de Jesus na Páscoa e tolerar, às vezes celebrar de
bom grado, os que fazem apologia ao suplício do próximo, a quem se deve amar
como si mesmo. Quando, ao longo de dois milênios, a cristandade se desviou dos
postulados de Jesus, os verdadeiros protetores dos ensinamentos do Nazareno a
trouxeram de volta ao seu esteio natural.
Nessa Páscoa, os cristãos brasileiros precisam ecoar alto o suficiente
para lembrar aos poderosos a primeira saudação do Cristo ressuscitado: A
paz esteja convosco.
José Saraiva, Doutorando em
direito, cristão