Faroeste caboclo
Não se sabe ainda, ao
certo, quando foi e por que motivos o Brasil optou por caminhar na contramão do
mundo em questões tão básicas como a escolha entre o certo e errado, o legal e
o ilegal. De tanto enveredar pela estrada torta, talvez tenhamos perdido o
senso e o sentido do que é correto e incorreto no campo da ética individual e
pública. E esse sentimento, que se irradia como fogo na população, vem
exatamente de cima, das autoridades e das elites brasileiras, supostamente
educadas, mas que não se dão ao trabalho de servir como modelos de bons
exemplos.
Na verdade, nem eles que estão no alto da pirâmide social e econômica sabem,
com certeza, escolher entre o certo e o errado, quando o que está em jogo são
vantagens imediatas e lucrativas. Até a mídia, que em outros cantos do planeta
trabalha em prol da harmonia social, favorecendo bons exemplos de cidadania, em
nosso caso parece querer implementar maus costumes como sendo condutas normais
e aceitáveis e que também podem ser copiadas como modelo de alguma modernidade
aética.
O pior é que tudo isso se passa diante de nossos olhos e ouvidos como coisa
natural a ser aceita e assimilada, para não gerar, talvez, maiores conflitos
com as atuais gerações. Um exemplo dessa desorientação geral pode ser conferida
no enorme espaço que os órgãos de imprensa vêm dando à morte do cantor MC
Kevin, conhecido e aclamado no submundo do gênero de música que produz, por
fazer apologia aberta ao tráfico de drogas e ao crime organizado,
apresentando-os como os novos modelos de heroísmo de conduta para uma grande
plateia de jovens.
Morto, por acidente, tentando escapar de um possível flagrante da esposa,
conhecida por defender, nos tribunais, membros de organizações do crime, o caso
vem ocupando espaço em horário nobre desde o ocorrido, numa espécie de
glamourização camuflada da vida marginal desses personagens, que agem como
artistas na estreita fronteira entre diversas contravenções e o espetáculo.
Exemplos lamentáveis e descartáveis como esse que, em outros tempos, ocupava
apenas as páginas da chamada “imprensa marrom”, especializada na decadência
humana, tomaram, nos últimos tempos, o espaço que, na impressa de qualidade,
era preenchido apenas com questões de importância nacional ou de interesse
público, mantendo a regra de não fazer apologias, romantizando o submundo do
crime e suas estripulias.
Não pense que esses maus exemplos vêm apenas dos conhecidos bailes funks da
periferia. O mesmo também ocorre em comissões parlamentares de inquérito em
que, para o bem da verdade, deveriam investigar aqueles que precisam prestar
contas do gasto do dinheiro público não visto e usufruído pela população. São
exemplos dessa natureza que a população brasileira é obrigada a ter de
presenciar em seu cotidiano e que demonstram que o Brasil não apenas é um país
impróprio para amadores, como é também um país onde o errado está certo e onde
as leis e os vereditos possuem um preço variável de acordo com a posição e o
bolso de cada um nesse faroeste caboclo. (Vídeo...,)