História de uma batalha
Em 1979, no ápice do período de
redemocratização do país, uma notícia provocou indignação: o prédio do Cine
Cultura da 507 Sul seria vendido pela Terracap. Para quem não sabe, aquele era
um ponto de referência muito importante para a cultura em Brasília. Lá, o
crítico e professor Paulo Emílio Sales Gomes fez, nos tempos inaugurais da
cidade, palestras memoráveis na apresentação das mostras de filmes, que
desembocaram na criação do Festival de Brasília do Cinema Brasileiro.
E, mais do que isso: as palestras de
Paulo Emílio foram o nascedouro de uma cultura cinematográfica em Brasília.
Paulo Emílio foi, ao lado de Glauber Rocha, o principal teórico de um cinema
brasileiro moderno. Quem assistiu Paulo Emílio em ação conta que ele era um
orador fascinante, que tinha o poder de magnetizar as plateias com a
inteligência, a erudição e a paixão pelo cinema.
Não tive o privilégio de assistir a
nenhuma palestra de Paulo Emílio, mas posso aquilatar o fascínio que ele
exercia porque acompanhei várias apresentações de Rogério Costa Rodrigues,
discípulo do mestre. Rogério inoculou a paixão pelo cinema em diversas gerações
de brasilienses. Por isso, quando circulou a notícia da venda do Cine Cultura,
fomos tomados pela indignação e pelo desejo de preservar o espaço.
Com o apoio moral de Athos Bulcão e
Vladimir Carvalho, os jovens se mobilizaram e organizaram um movimento de
resistência, que teve como ponto culminante um grande show em uma pracinha
próxima ao Cine Cultura. Eu começava a trabalhar em jornal e me dispus a pegar
depoimentos de Oscar Niemeyer e Ferreira Gullar em apoio ao movimento de
preservação do Cine Cultura.
Marquei com os dois e viajei para o
Rio de Janeiro. Gullar havia sido o primeiro diretor da Fundação Cultural do
DF. Ele me recebeu de maneira muito cordial, conversamos por mais de duas horas
e o poeta evocou a passagem por Brasília com muitos detalhes. Brincou que um
dos seus legados eram as garrafinhas de areia colorida, vendidas na Torre de
TV, pois ele pediu para vir de São Luís, sua terra natal.
Mas tive problemas com Oscar
Niemeyer. Estávamos no fim do regime militar, ele era muito visado e ficou
receoso de ter represálias. Argumentei que havia um movimento de jovens para
defender a cidade que ele tinha criado. Eu não podia nem desembarcar em
Brasília sem essa declaração de apoio.
Fiquei com medo de que ele me
mandasse para aquele lugar, mas Niemeyer se sensibilizou: “Você é muito
insistente, mas é simpático. Vamos fazer o seguinte: eu escrevo um depoimento.
Está bom assim?” Pensei na diagramação da matéria e ainda barganhei: “Será que
o senhor faria um desenho para eu publicar?” Ele concordou e voltei feliz para
Brasília, com a carga preciosa na bagagem.
Publiquei a entrevista de Gullar e o
depoimento de Niemeyer, o movimento promoveu o show, a Terracap recuou,
enrolou, mas vendeu o prédio, sorrateiramente, depois. Foi um crime contra o
patrimônio histórico de Brasília. O Cine Brasília virou um prédio-fantasma na
W3 Sul. Eles ganham, mas a cidade fica mais pobre de espírito.
Lembrei desse capítulo da história da
cultura em Brasília por causa do despejo que o Teatro Goldoni recebeu com a
venda pela Terracap do prédio onde funcionava a Casa d’Itália. Eles ganham, mas
a cidade fica mais pobre de espírito. Espero que o secretário de Cultura,
Bartolomeu Rodrigues, se sensibilize e encontre outro lugar para que o Teatro
Goldoni continue funcionando, pois é um ponto de referência das artes cênicas
na cidade.
Quando o cine Cultura (não cine Brasília) fechou, o Wladimir não tinha chegado em Brasília! O cine Cultura, ( se não me falha a memória) fechou em 69, o festival que lançou o Wladimir foi em (que a memória não me falhe) foi em 71 - Com o curta " Os Homens do Caranguejo"
ResponderExcluir