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Quatro perguntas Márcia Abrahão Moura, Reitora da UnB

Quatro perguntas Márcia Abrahão Moura, Reitora da UnB

 

Quais os desafios de gestão de uma universidade do porte da UnB com sucessivos cortes no orçamento? Temos atuado para ter eficiência nos gastos. Desde que assumimos, no final de 2016, a gente teve que fazer ajustes no contrato. Tivemos 45% de queda no orçamento. Chamamos a comunidade, fizemos audiências públicas e mostramos a situação. Tivemos que fazer readequações de contrato e exigir algumas coisas. A partir daí, temos focado em usar o recurso para atividades da universidade, que são ensino, pesquisa e inovação. Onde pode reduzir e que não prejudique a atividade da universidade, como a assistência estudantil e a bolsa dos estudantes, a gente mexeu. Refizemos alguns contratos e estamos trabalhando dessa forma.

 

Quais estratégias a administração tem adotado para reduzir os impactos? Esse orçamento de 2021 da UnB está com redução de 7,8%. Temos apoio da Política Nacional de Assistência Social (Pnas) para dar bolsas aos estudantes carentes, que teve uma redução de 7%. Agora, com a pandemia, com o aumento do desemprego e a crise econômica, a UnB precisaria de aumento de recursos para atender esses estudantes. Sem investimento, a tendência é de que eles não permanecerem na faculdade. Por isso que demos R$ 1,5 mil para alunos carentes comprarem computadores e equipamentos eletrônicos.

 

A UnB tem investido em diversas pesquisas no combate à pandemia da covid-19. De que forma essa redução dos investimentos afeta a prestação de serviço da universidade? Uma coisa importante é que os recursos para pesquisa, no Brasil, são, fundamentalmente, das agências de fomento. Com o Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT), fizemos uma luta no Congresso Nacional para que vire um apoio financeiro e não contingenciado. A pesquisa, no Brasil, se faz com esses recursos, porque, dependendo do tipo, precisa de equipamentos de altíssimo valor, e as universidades não conseguem fazer o financiamento dessas pesquisas. Temos feito o orçamento de bolsas. Temos quase 200 projetos na parceria com a Fundação de Apoio à Pesquisa do DF (FAP), em que disponibilizaram R$ 30 milhões para pesquisa. E eles também tiveram redução. A gente tem qualidade. Nossos ex-alunos estão no Brasil e no mundo todo. E continuamos trabalhando na pesquisa clínica da CoronaVac, por exemplo, mostrando toda a nossa qualidade com o Hospital Universitário de Brasília (HUB), fazendo pesquisas e testagens. Essa redução é muito preocupante para o futuro do país.

 

Até quando a universidade tem fôlego para suportar a escassez de recursos? A UnB trabalha para que as reduções tenham o menor impacto possível nas atividades acadêmicas e administrativas. A situação é dramática, mas vamos continuar fazendo o que sabemos fazer de melhor: o ensino, a pesquisa e a extensão de qualidade. Também continuaremos em diálogo com o governo e o Congresso para reverter a situação orçamentária.

 

Sem investimento da União na UnB: O governo federal liberou R$ 2,59 bilhões às instituições de ensino superior na última quinta-feira, por meio da Lei Orçamentária Anual (LOA). No entanto, os R$ 135,8 milhões repassados à Universidade de Brasília serão usados apenas para sanar despesas de custeio

 

Mesmo após o governo federal ter liberado, na última quinta-feira, R$ 2,59 bilhões do orçamento das instituições de ensino superior que estavam bloqueados, a situação da Universidade de Brasília (UnB) é preocupante, uma vez que não houve repasse para investimentos em pesquisas e projetos. O valor enviado à UnB, R$ 135,8 milhões, será usado para sanar as despesas de custeio, como pagamento de pesquisadores, contas de água e luz, auxílio para estudantes carentes, ou seja, recursos para o chamado orçamento discricionário.

 

Segundo a UnB, esse montante estava sob supervisão antes da liberação, ou seja, dependiam de autorização do Congresso Nacional para serem utilizados e passarem a integrar a Unidade Orçamentária (UO) da universidade. “No entanto, parte deles — cerca de R$ 2,2 milhões — não vieram do Tesouro, como estava previsto na LOA (Lei Orçamentária Anual), mas, sim, do superavit que a instituição acumulou no final do ano passado. Na prática, isso significa redução do valor do Tesouro anteriormente previsto e prejudica ainda mais a capacidade de pagar despesas de funcionamento. Além disso, R$ 34 milhões permanecem bloqueados, o que representa 13,76% do total do orçamento discricionário da UnB, sobre o qual a universidade tem poder de gestão”, explica a instituição, em nota oficial.

 

Para a professora de infectologia Valéria Paes, que coordena projetos de combate à covid-19 na UnB, — principalmente no Hospital Universitário de Brasília (HUB) —, o investimento nas pesquisas é fundamental para gerações futuras. “Não é possível mensurar o valor do conhecimento. Então, seria muito importante ter esses investimentos, porque muitos deles não dão retorno imediato. É importante que um país invista em conhecimento científico, uma vez, que é dessa forma que se cresce em vários aspectos. O resultado vem ao longo do tempo, das gerações. A gente não pode pensar tão matematicamente. São profissionais formados que se envolvem com os trabalhos e que têm capacidade de desenvolver outros projetos no futuro”, destaca a professora.

 

“Um aluno que participa de um projeto tem vários ganhos: o conhecimento técnico naquele assunto que está desenvolvendo; aprender a analisar um estudo científico; a resolver perguntas e questões, o que ajuda na atuação profissional na área. Se tivermos mais recursos, conseguimos ter mais alunos e gerar essa sensibilização para a pesquisa e para o conhecimento científico”, acrescenta Valéria Paes.

 

Queda: Nos últimos cinco anos, a Universidade de Brasília tem recebido cada vez menos investimento do Tesouro Nacional. Em 2015, o aporte financeiro era de R$ 63,7 milhões. Em 2016, caiu para R$ 47,1 milhões. Depois, o governo federal reduziu mais o apoio: R$ 24,6 milhões, em 2017; R$ 8,2 milhões, em 2018; R$ 5,1 milhões, em 2019; e R$ 5 milhões, em 2020.

 

No início da década de 2010, o cenário era contrário. Em 2011, a LOA cedeu investimento de R$ 67,8 milhões à UnB; caindo para R$ 22,4 milhões, no ano seguinte; e ficando em R$ 36,9 milhões, em 2013. Em 2014, a instituição recebeu R$ 45,8 milhões do governo federal.

 

Até 7 de maio deste ano, o recurso estava cortado pela Lei Orçamentária Anual. Desta forma, a instituição diminuiu em 4,6% os recursos na fonte do Tesouro para o pagamento de despesas de custeio ou discricionárias, o que inclui gastos como água e energia, além da concessão de auxílios para os estudantes em situação de vulnerabilidade socioeconômica.

 

Impactos: A pandemia trouxe desafios para diversas áreas, e iniciativas tiveram de ser suspensas. O projeto Direitos na palma da mão, coordenado pela professora de direito da UnB, Debora Bonat, espera apoio financeiro. O objetivo é divulgar conhecimento sobre direitos básicos, como acesso a hospitais e unidades básicas de saúde (UBSs), por meio de um aplicativo.

 

“Quando a gente fala em bolsa, por exemplo, é o pagamento de salário do aluno. As pessoas estão dedicando parte da vida ao comprometimento com a ciência e formulação das pesquisas. Então, quando há uma diminuição de verbas para pesquisa, faz com que os alunos também tenham que abandonar os ensaios que participam, porque têm que auxiliar na sobrevivência da família, e eles próprios precisam se manter. Então, a gente acaba perdendo pesquisadores, pois não temos dinheiro para investir nesses alunos. Quando esse aluno termina a sua graduação ou pós e desponta no mercado, traz tudo aquilo que foi desenvolvido na universidade. Também é uma forma de devolver à sociedade todo o investimento que está sendo trabalhado na forma de pesquisa”, avalia a professora de Direito da UnB.

 

Debora destaca que o investimento deve ser contínuo para estimular que as pesquisas sejam concluídas com mais qualidade. “Quando você está em um contexto de pandemia, está trabalhando com algo desconhecido, então precisa ter uma forte iniciativa de pesquisa para poder controlar as causas e consequências e a melhor forma de intervenção, para que, no caso da pandemia da covid-19, tenha a solução mais adequada e rápida possível. É muito difícil formar, por exemplo, um grupo de pesquisadores que trabalhem de maneira adequada juntos e que possuam laboratórios. O incentivo à pesquisa, no Brasil, tem que ser contínuo”, ressalta.

 

A UnB esclareceu que trabalha para alocar os recursos para trazer o menor impacto possível para as atividades acadêmicas e administrativas. A instituição informou que busca, junto à Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (Andifes), ao Congresso Nacional e a outros interlocutores, construir alternativas para recomposição do orçamento de 2021 para níveis compatíveis com as leis orçamentárias anteriores, com, pelo menos, a devida atualização dos valores da inflação.

 

Em nota, o Ministério da Educação (MEC) diz que “está atento à situação que preocupa suas unidades vinculadas e, na expectativa de uma evolução positiva do cenário fiscal, seguirá envidando esforços para reduzir o máximo que for possível os impactos na LOA 2021”.


 



               Pedro Marra – Foto: Ed Alves/CB/D.A.Press – Correio Braziliense



 

 


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