Ruídos na comunicação
Na tormenta causada no Brasil pela pandemia, que já ceifou mais de meio milhão de vidas e sacrificará ainda muitas outras, um dos grandes problemas para o combate mais efetivo ao novo coronavírus tem sido, com certeza, a comunicação — ou a falta dela, ou, pior, a divulgação de informações inconfiáveis — do governo federal com a população.
A falha foi
reconhecida recentemente pelo próprio vice-presidente da República, general
Hamilton Mourão, que admitiu a carência de uma comunicação eficiente do governo
com os brasileiros. Para Mourão, um grande equívoco foi a não promoção de
campanhas de esclarecimento sobre a vacinação e também sobre a própria doença.
“Eu acho que
este foi o grande erro: (não ter feito) uma campanha de esclarecimento firme,
como tivemos no passado, de outras vacinas. Então, uma campanha de
esclarecimento da população sobre a realidade da doença, orientações o tempo
todo para a população”, disse Mourão. “Eu acho que isso teria sido um trabalho
eficiente do nosso governo”, acrescentou o vice.
De fato, desde
o início da pandemia, o que houve com frequência por parte do presidente Jair
Bolsonaro, bem como de outros integrantes e aliados do governo, foram
questionamentos quanto aos efeitos da vacina, desprezo ao uso de máscaras,
recomendação de tratamento precoce com medicamentos sem eficácia e críticas às
medidas de isolamento social para conter a propagação do vírus.
Em meio à
comunicação truncada, que alimenta a enxurrada de fake news sobre a doença a
inundar as redes sociais, chegou-se ao cúmulo de um auditor do Tribunal de
Contas da União (TCU) ter produzido um relatório falso dando conta de que as
mortes por covid-19 no país estariam superestimadas em até 50%. Isso porque os
números teriam sido inflados propositalmente por governadores e prefeitos em
busca de mais verbas federais. Embora desmentido pelo TCU, que afastou e mandou
investigar o auditor, o relatório foi citado várias vezes publicamente por
Bolsonaro.
Além da falha
na orientação à população, faltou ainda uma coordenação central de combate à
pandemia. Assim, restou a cada estado e município, respaldados pelo Supremo
Tribunal Federal, adotar as medidas que julgassem necessárias para garantir
distanciamento social, na tentativa de barrar o avanço do vírus. O resultado
dessa ação fragmentada foi que, enquanto a situação era amenizada em alguns
locais, explodia em outros, em quadro de evidente descontrole.
Agora, quando
a vacinação ainda segue em ritmo mais lento que o desejável, e a ameaça de uma
terceira onda da pandemia é real, como alertam infectologistas, seria
recomendável uma comunicação eficiente, correta e única aos brasileiros por
parte do governo federal, sem informações contraditórias que acabam favorecendo
a disseminação de fake news.
Também seria conveniente a busca de uma sintonia entre a União e os demais entes federativos, para atuação em parceria no combate à proliferação do vírus, de modo a evitar a volta das tristes cenas de gente morrendo aos milhares, por colapso no atendimento hospitalar, e de cemitérios fazendo grandes sepultamentos coletivos.