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E assim Brasília se transformou em capital do rock

E assim Brasília se transformou em capital do rock. Como músicas confessionais da turma da Colina de Brasília ajudaram a criar uma identidade cultural e sentimento de pertencimento local

Foram três bandas. Como os três poderes da nação, elas reinaram, soberanamente, no Planalto Central entre o final dos anos 1970 e meados dos anos 1980 com canções que encantaram gerações. Juntas, Plebe Rude, Capital Inicial e Legião Urbana – os três nomes mais importantes do rock Brasília – embalaram sonhos, instaram reflexões sociais e políticas, ditaram regras de comportamento, deram asas a um imaginário local que reverberaria em todo o país. Não há como falar de música brasileira e não lembrar sucessos nacionais marcantes como Eduardo & Mônica, Faroeste Caboclo, Até Quando Esperar, Independência e tantas outras.


“Acho que o rock de Brasília é tão importante quanto a Tropicália. (…) Não se pode falar de cultura brasileira sem falar em nossa turma” (Dinho Ouro Preto, vocalista do Capital Inicial)

Registro da Legião Urbana nos bastidores da sala Funarte, perto do lançamento do primeiro disco 

“Acho que o rock de Brasília é tão importante quanto a Tropicália. (…) Não se pode falar de cultura brasileira sem falar em nossa turma”, afirmou o vocalista do Capital Inicial, Dinho Ouro Preto, em uma entrevista publicada na revista ShowBizz em dezembro de 1998. “É rock, rock puro, rock de Brasília”, sentenciou.

Os grupos tinham na formação jovens filhos de diplomatas e de altos funcionários públicos. Eram adolescentes entediados com a aparente falta do que fazer na capital, com a solidão do cerrado e certo desencanto com o Brasil. Que país era aquele afinal, no apagar das luzes do regime militar? “Considero-me a voz da geração Coca-Cola, que são os filhos da revolução. Sou um filho perfeito da revolução, por isso minha poesia não reflete nada”, desabafou o jovem Renato numa entrevista ao Correio Braziliense, em janeiro de 1980.


O Capital Inicial teve seu primeiro sucesso com a faixa ‘Música Urbana’, sobre as peripécias da turma da Colina após um fim de festa no Setor de Clubes

Tomados por um tédio bem grande e insatisfação juvenil, traçaram, ao som de Sex Pistols, Ramones e outros ícones do punk rock, rotas de convivências e afinidades cotidianas que iam do apartamento de Renato Russo, na SQS 303, passando pelos cativos points culturais da cidade na Asa Sul e na Asa Norte, como a lanchonete Food’s (110/111 Sul), mansões no Lago Norte, onde moravam os integrantes do Capital e da Plebe; o conjunto de prédios da UnB, a famosa Colina, onde a turma se encontrava para tocar e ouvir música, se divertir.

“A curiosidade intelectual, a lucidez e a urgência desses jovens de Brasília colocaram a capital no mapa cultural brasileiro, mudando para sempre a música popular brasileira” (Philippe Seabra, líder da Plebe Rude)


“(…) E nossas vidas são tão normais/você passa de noite e sempre vê/Apartamentos acesos/(…) Andando nas ruas/Pensei que podia ouvir/Alguém me chamando/Dizendo meu nome”, radiografa o cotidiano da cidade o líder da Legião Urbana na elétrica Baader-Meinhof Blues, um dos sucessos do primeiro álbum lançado em 1985.


“A curiosidade intelectual, a lucidez e a urgência desses jovens de Brasília colocaram a capital no mapa cultural brasileiro, mudando para sempre a música popular brasileira” (Philippe Seabra, líder da Plebe Rude)


Sentimento de pertencimento: Dono de bar improvisado num subsolo da quadra comercial da 407 Norte, o Cafofo, o pianista e maestro Rênio Quintas lembra da movimentação da galera no local. Sobretudo nas jovens tardes de domingo, quando deixava os punks locais tirarem um som no porão do lugar e entornar o caneco.


“Eu emprestava o som pra galera – o Renato, inclusive, que tocava na (banda) Aborto Elétrico. Era uma garotada feia, magrela, que fazia um som horroroso, uma cacofonia maravilhosa e as pessoas gostavam, enchia a casa”, recorda. “Era um lugar que tinha certa magia e com uma rapaziada que sabia o que queria, tanto que chegaram longe”, avalia.


O fotógrafo Nick Elmoor, autor, junto com o colega de câmera, Ricardo Junqueira, do livro de fotos Pós-New Brasília, que reúne imagens retratando a agitada cena cultural da capital entre 1981 e 1989, diz que os registros eram momentos de trabalho e prazer. “A gente fazia fotos para todos os amigos. Muitas vezes eram para divulgação, mas também só pela diversão”, garante.


Uma viagem de ônibus entre a W3 Sul e a W3 Norte inspirou Philippe Seabra a compor a música ‘Brasília’, sucesso da banda Plebe Rude

Rolé por vias, viadutos, plataformas e cantos de concreto da moderna urbe, o olhar sensível, outrora realista sobre prédios, torres e parques da cidade, enfim, o cotidiano de moradores e personagens únicos tão comuns da capital. É o que trazem algumas letras confessionais e realistas de canções dessas três bandas ícones de movimento que contribuiu para construir uma identidade cultural local marcado pela rebeldia.

Um sentimento de pertencimento abraçado pela Secretaria de Turismo do Distrito Federal, ao criar, em agosto de 2021, o projeto Rota Brasília Capital do Rock, iniciativa que mapeia a história desses pontos emblemáticos do rock da cidade sob curadoria de quem entende do assunto, o guitarrista e líder da Plebe Rude Philippe Seabra.

“A curiosidade intelectual, a lucidez e a urgência desses jovens de Brasília colocaram a capital no mapa cultural brasileiro, mudando para sempre a música popular brasileira”, observa o músico. “O objetivo desse projeto é aguçar a memória afetiva de muitos moradores, sendo uma verdadeira descoberta para os turistas”, constatou a ex-secretária de Turismo, Vanessa Mendonça, ao lançar a Rota Brasília Capital do Rock.


Agência Brasília – Fotos: Nick Elmoor/Pós-New Fotografia - Caru Leão/Divulgação – Governo do Distrito Federal


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