Das conversas que não tive e das entrevistas que não fiz, esta é uma das
que mais lamento: Marianne Peretti. A única mulher da equipe de Oscar
Niemeyer no grandioso projeto de Brasília falava e falará eternamente por seu
magnífico trabalho. Em especial, os vitrais das obras monumentais, entre
as quais se destaca a Catedral. Ainda assim, queria ter ouvido sua voz, olhado
em seus olhos e ter tido a oportunidade de conhecê-la pessoalmente.
Fico com a memória impressa em jornal, eternizada aqui no Correio, pela escrita singular de Nahima Maciel,
repórter que por mais vezes falou sobre a obra de Marianne no jornal. E fico, é
claro, com o legado da artista tão talentosa.
Marianne Peretti nasceu Marie Anne Antoinette Hélène Peretti, filha de
mãe francesa e pai historiador pernambucano, em 1924, em Paris. E morreu
na última segunda-feira, no Recife, onde morava, aos 94 anos.
Chegou ao Brasil em 1956, aos 29 anos. A eterna curiosidade a trouxe ao
Planalto Central. E sua obra passou a ser dividida em antes e após Brasília,
quando os vitrais passaram a predominar sobre as pinturas, desenhos e
esculturas. O Brasil virou referência no mapa mundial dos vitrais com Marianne,
que trabalhou por muitas décadas ao lado de Niemeyer.
Assim como Athos Bulcão, Marianne tem sua identidade impressa nos
monumentos de Brasília. Fez os painéis que hoje aparecem em todas as imagens de
cobertura de televisão do Senado Federal e criou outro para o Palácio do
Jaburu, em 1979. Depois, deu forma ao vitral pelo qual penetra a luz roxa sobre
a cripta de Juscelino Kubitschek no Memorial JK e a escultura do pássaro
dourado no Foyer da Sala Villa-Lobos, no Teatro Nacional.
A luz vermelha filtrada pelos vitrais em tonalidades alaranjadas que
banha o Panteão da Pátria também é criação de Marianne, uma obra do final da
década de 1980. E então vieram os vitrais da Catedral.
Na matéria de Nahima sobre a obra dela, publicada em nosso site, a
pesquisadora Tactiana Braga, organizadora do livro Marianne Peretti — A ousadia
da invenção, dá uma dimensão maior à obra da artista. Coube a Marianne trazer o
feminino para a construção de Brasília.
"É o traço da mulher no imaginário da construção da capital. Ela
criou obras numa escala que nenhum outro homem fez. É um olhar que não é de um
escultor homem, de um artesão homem, é o olhar de uma mãe, mulher, de um
feminino que se expressa no vitral de forma feminina, delicada, sutil, leve,
criando o ambiente do sagrado", disse a autora.
Sem dúvida, Marianne está eternizada. Preservar suas obras é preservar o
patrimônio de Brasília. Espero que as autoridades tenham a decência de cuidar
das preciosidades que ela e os demais ícones da nossa história e construção nos
deixaram como herança maior.