O empobrecimento experimentado pelo país nos
últimos anos pesará nas urnas nas eleições de outubro. Com a inflação acima dos
dois dígitos e o aumento da informalidade, especialistas acreditam que o pleito
deste ano será marcado pelo pragmatismo. No Distrito Federal, onde vivem
2.205.596 eleitores, 88% têm mais de 18 anos e estão em idade economicamente
ativa. Ou seja, quem almeja um cargo majoritário ou proporcional no pleito
precisa estar conectado com os anseios da população que movimenta a economia da
capital do Brasil. E precisa falar para um contingente esmagador que vive fora
das asas do Plano Piloto, região que detém menos de 4% dos votos, conforme os
dados do Tribunal Regional Eleitoral (TRE-DF).
Maria Aparecida Corrêa Viana, 45 anos, está no espectro mais almejado pelos candidatos. Ela é moradora de Ceilândia que, com Brazlândia, foram a segunda maior zona eleitoral do DF, com 151.436 votantes. A autônoma percebe a política nas ausências cotidianas. Vendendo marmitas a R$ 10 para sobreviver, ela afirma que não se sente amparada pelo Estado. Com a ajuda do marido, 34, e do filho, 19, no pequeno comércio, a preocupação com o sustento é urgente e gera incertezas. “No mês passado, tive que fazer um fogão à lenha em casa para economizar o gás de cozinha”, conta a vendedora, que há oito meses vive com a família em um terreno cedido pela igreja evangélica que frequenta. O socorro veio em boa hora, pois não tinham mais como pagar o aluguel.
Mesmo sem ter candidatos definidos, Maria Aparecida
sabe o que atende a sua realidade e defende a criação de um benefício para os
vendedores na mesma situação em que está. “Devia ter um auxílio para quem
trabalha na rua”, diz. No começo de 2020, ela abriu um restaurante no Setor O,
mas precisou fechar após a chegada da covid-19. “Por isso, eu espero que os
políticos sejam fiéis ao que eles falam, porque falar é uma coisa, e cumprir é
outra”, destaca Maria.
Além do Plano: Para o consultor e
professor de comunicação e marketing político Marcelo Vitorino, as competências
dos Poderes e a importância da escolha dos políticos nem sempre está clara para
a população, e a primeira barreira, muitas vezes, é tornar esse processo tangível
para o cidadão. “Quanto mais periférica a região, maior é a tendência de crer
que as políticas públicas são pensadas apenas para o Plano Piloto”, analisa.
Marcelo Vitorino acredita que os brasilienses
direcionarão as escolhas para aqueles candidatos que conseguirem sinalizar para
as áreas mais distantes do centro. “A pandemia tirou de cena debates
ideológicos. No geral, a população está endividada. Então, o que vai pesar são
propostas para melhoria econômica e social”, afirma.
A projeção é compartilhada pelo mestre em ciência
política e professor de direito eleitoral do Centro Universitário de Brasília
(Ceub) Alessandro Costa. Simpatia, promessas e apertos de mão não serão
suficientes no atual cenário. “Essa campanha será marcada pela busca, por parte
do eleitor, de propostas viáveis”, argumenta o estudioso.
A escassez de empregos, a violência urbana, a saúde
pública e as demandas do transporte público serão pontos decisivos para a
escolha dos próximos gestores e representantes populares. “Os candidatos terão
que oferecer soluções para esses e outros problemas da cidade sob risco de
verem seus votos minguarem”, ressalta Alessandro Costa.
Camila Galetti, mestre em sociologia pela
Universidade de Brasília (UnB), alerta para o peso do voto feminino, o que
corresponde a 54%dos eleitores do DF. “A maioria é chefe de família e tem que
pensar que, elegendo outras mulheres, podem se atentar a pautas como dupla
jornada de trabalho, creches para crianças, que são exigências que perpassam
pela representatividade.”
Peso da carestia: Os sucessivos aumentos no valor das compras do mercado, da gasolina e de outros itens têm preocupado o professor de inglês Lucas Calado, 40, que vive há um ano e meio em Águas Claras, maior colégio eleitoral do DF, com 160.658 votantes. “Esse impacto nos alimentos e na relação de prestação de serviço vai afunilando. Sou autônomo, e interfere nas minhas prioridades, como a compra de um abacate, por exemplo, que era R$ 6 o quilo, antes da pandemia, agora, está a quase R$ 10, em média, com 40% de aumento”, constata o educador.
Emanoel gostaria de ter mais informações a respeito
dos deputados distritais e vê-los na rua, em contato com o povo. “Só alguns
distritais vêm, aqui, na feira conversar com a gente. Isso faz diferença, ter
quem ouça as nossas demandas, para a gente votar mais certo, na pessoa que está
do lado da gente, porque erramos muito em 2018, pelo que percebi nos preços”,
opina Emanoel.
Alexandre Araújo, 44,
dono de uma empresa que terceiriza mão de obra, confessa que a rotina no Park
Way, onde mora, não enfrenta tantas dificuldades. Mas destaca que a alimentação
no mercado e fora de casa aumentou. “O meu voto vai ser decidido pelas
propostas ligadas à economia, porque acaba afetando todo o resto”, alega.
Maiores colégios do DF: 1ª 15ª zona eleitoral (Águas Claras): 160,5 mil
eleitores (7,2%); 2ª 16ª zona eleitoral (Ceilândia
Norte e Brazlândia): 151,4 mil eleitores (6,8%); 3ª 13ª
zona eleitoral (Samambaia): 137,7 mil eleitores (6,2%); 4ª 8ª zona eleitoral (Ceilândia Centro): 137,6 mil
(6,2%); 5ª 6ª zona eleitoral (Planaltina): 136,2 mil
(6,1%); 6ª 9ª zona eleitoral (Guará e Cidade Estrutural): 132
mil (5,9%); 7ª 5ª zona eleitoral (Sobradinho):
129,5 mil (5,8%);8ª 17ª zona eleitoral (Gama): 128,3
mil (5,8%); 9ª 18ª zona eleitoral (Lago Sul, São
Sebastião e Jardim Botânico): 127,6 mil (5,7%);10ª 10ª zona eleitoral
(Núcleo Bandeirante, Riacho Fundo, Park Way e Candangolândia): 119,9 mil (5,4%)
Palavra de especialista: Desafio do marketing
político- Marcelo Vitorino, consultor e professor de comunicação e
marketing político
“Não basta falar de investimentos em saúde, é
preciso que o cidadão entenda como a UBS (unidade básica de saúde) chega a sua
casa, como melhora a sua vida e que tem a participação do seu candidato. Um
caminho para chegar a essas pessoas é contar histórias, é uma maneira de
demonstrar como a transferência de renda ocorre. Nestas eleições, os candidatos
ainda terão outro desafio: as redes sociais. O combate às fake news precisa de
gestão qualificada, assim como fazer os conteúdos chegarem aos eleitores, uma
vez que o acesso orgânico nas redes sociais é reduzido. Para esse trabalho, é
necessário contratar profissionais preparados, que, em ano eleitoral, não estão
em grande disponibilidade no mercado.”