No domingo varrido de vozes e de
gente, o farol lança um fio de luz que paira sobre o mar, denunciando as ondas
na sua tentativa de subir nas rochas e atingir o céu, sempre imóvel. Um gole de
chá quente sorve o passar das horas e o riscar dos astros na abóbada celeste.
Indefinidamente, desdobra-se o
tempo ao longo do caminho. De que valeria ficar aqui neste ponto da América,
com tantas estrelas se perdendo de vista? Sim, verdadeiramente, vamos todos
juntos na horizontal. O ocaso dos astros. O nosso ocaso. Atirados a um canto do
mundo, peito ao léu, de só intempérie feito, na opressão, no suceder de eras,
erros e feras sem sono. Seguimos apáticos, tristes ao incógnito. Em um barco
sem remos, mar adentro.
Hoje, o viver é só de lutas feito.
Trago a noite e durmo com um sorriso nos lábios, sabendo que, por trás dos
montes, anunciam-se trilhas virgens. É mister por elas seguir.
Os mapas já traçados conduzem a
lugares gastos por homens cansados pelo empobrecer da rotina. Cada um que
carregue seu fardo acumulado. Cada um que morra como muitos, como todos têm
morrido. Somente o desejo do viver permanecerá aceso, sem sentido algum.
Deste universo infinito, deixem ao
menos uns palmos onde repouse a eternidade das ideias. Vida nova a dobrar a
cada esquina. Terá noção o tempo das horas que arrasta pesadamente? Ou o
caminho dos passos que nele esticam aqueles que, sonhando, seguem esquecidos
das horas nas trilhas passadas?
Daqui de cima, a cidade parece bem
mais frágil, “Cidade, eu te conheço pelo o que menos tens de cidade. Sei que és
tão varia e dissoluta como as folhas que rolam pelo chão de cá, para lá, ermos
pelo vento da madrugada.
Agosto traz consigo um vento seco
que, percorrendo os jardins, rouba-lhes as cores e o frescor. Uma aragem
repentina vem agitar o galho de uma árvore onde dois pássaros parecem ensaiar
um beijo flutuante.
Vem um cansaço, refletindo no
retrovisor tantos trovões, lacerdinhas, enxurradas. Mas é preciso continuar. A
força vem do amigo a suspirar por entre as folhas dizendo: É preciso continuar.
Mais um dia se rompe. Ontem, às
oito da noite, o sangue parou de circular. Disseste: “esquece”.
Notei que já não chovia só lá
fora. Na terça, parte mais ilusão que certezas havia.
Nas páginas atuais, as linhas
finas deitadas sobre o branco aguaram, frias e silenciosas, o contorno leve da
alegria que a pena já não traça. A vista se volta para o céu, onde tudo está
desesperadamente nu. O meu consolo é o consolo deste chão gretado. Jaz meu
peito em tua porta.
Em vão, choro pelos cantos da cidade, onde o sol empresta a cor do poente a essas velhas folhas do outono. As árvores se despindo aos poucos lembram como é fugaz o orvalho no deserto. É preciso seguir com as estações. Ser um tempo novo sobre as mesmas coisas velhas. Guardar uma lágrima para cada porto. Lavar o rosto e deixa-lo brilhar ao dia. E a largos passos partir.