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Alexandre Garcia: É preciso esfregar a constituição na cara de quem censura

Alexandre Garcia: É preciso esfregar a constituição na cara de quem censura. É preciso esfregar a constituição na cara de quem censura e na cara de quem se omite da obrigação de denunciar o desrespeito.

Neurônios algemados

A Nicarágua de Daniel Ortega acaba de suspender relações com o Vaticano, porque o papa comparou o regime de Ortega com o comunismo soviético e o nazismo de Hitler. “Ditaduras grosseiras” — postou o papa Francisco, sugerindo “desequilíbrio” de Ortega. Imediatamente, o ditador mandou fechar a Nunciatura Apostólica. A nota oficial nicaraguense anunciando a suspensão usou palavras conhecidas por aqui: “Terrorismo golpista que divulga notícias falsas”. Na escalada totalitária, a primeira liberdade que Ortega suprimiu foi a de expressão, antes de tirar as outras liberdades. Assim fizeram Stálin e Hitler. Assim fazem todos os regimes totalitários.


Os nossos constituintes de 1988, marcados pelo AI-5, trataram de preservar a liberdade de expressão. Na cláusula pétrea que é o artigo 5º, está o inciso IV, que  estabelece: “É livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato”. O art. 220, que trata da comunicação social, garante que “a manifestação do pensamento, a criação, a expressão, e a informação, sob qualquer forma, processo ou veículo, não sofrerão qualquer restrição…”. A seguir, o §2º veda qualquer tipo de censura política, ideológica e artística. 


Por que insistir com esse óbvio, que é o respeito à Constituição? Porque ela não está sendo respeitada. É preciso esfregar a Constituição na cara de quem censura e na cara de quem se omite da obrigação de denunciar o desrespeito. Teríamos um regime de liberdade de expressão — portanto democrático — se a Constituição fosse praticada, mas muita gente defende sua própria liberdade de expressão, mas não a de quem discordam. Carregam ideias totalitárias, pelas quais as pessoas são livres para pensar, desde que pensem como se lhes impõem. São censores a policiar seus concidadãos. Assim agem Hitler, Stálin e totalitários políticos e religiosos de todos os tempos. Isso já foi questão de vida ou morte. Durante a pandemia, censuraram informações que poderiam salvar milhares de vidas. 


No nosso país grassam modismos disfarçados de libertadores, que na realidade são liberticidas. Quem já leu o 1984 de George Orwell identifica bem essa ditadura que começa com o controle da expressão do pensamento e pretende desembocar em outra Revolução dos Bichos. Já existe um virtual Ministério do Pensamento, impondo e criando palavras e conceitos, ainda que contrariem a lógica e o conhecimento científico. A justiça e o mérito são sacrificados ante verdades inventadas — e quem expõe o ridículo dessas teses é denunciado como infectado por alguma neofobia. As pessoas estão sendo de tal forma patrulhadas que têm medo de resistir e mostrar que não querem ser enganadas, se encolhem com medo da opressão. É um processo em que a opinião está sendo criminalizada para formar seres acríticos e inermes. Até quem faz a propaganda disso acabará sem liberdade para decidir como a propaganda. Quando esse acólito da seita perceber que foi usado, já será tarde; o regime já passou da fase primária de dominar a liberdade de expressão, e já terá controlado as liberdades de ir e vir, de se relacionar e, sobretudo, de pensar. Então vai ser tarde,  já não serão livres, porque seus neurônios já terão sido algemados. 


Alexandre Garcia - Correio Braziliense – Fotos: Blog-Google




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