Brasília
nasceu de uma equação política fantástica. Sua construção teve um líder
obstinado que concebeu uma fórmula realista de gestão. O presidente Juscelino
Kubitschek chamou o então deputado federal Israel Pinheiro e recomendou:
“Vai lá e faz acontecer”.
Em
16 de março de 1957, foi anunciado vitorioso o projeto do Plano Piloto de Lucio
Costa. Começou a nascer a nova capital do Brasil. Hoje, 66 anos depois, um
parque de árvores e de artes. Cérebro das mais altas decisões nacionais.
Concebida
em 1956 e iniciada em 1957, Brasília nasceu solenemente no dia 21 de abril de
1960. Um ano e pouco para adequar a burocracia das leis. Mais um tempo para
plantar no chão a abstração dos desenhos e gráficos. De abril de 1956 a março
de 1957, foi tempo da gestação. Depois, mãos à obra. Foram 1.112 dias de
construção.
Vale
lembrar: em 18 de abril de 1956, foi assinada a Mensagem de Anápolis. Em 19 de
setembro, foi criada a Novacap e, dia 30 de setembro desse mesmo ano, foi
publicado no Diário Oficial o edital do concurso.
Sobre
a Mensagem ao Congresso, o nome oficial ficou Mensagem de Anápolis. A
história é inusitada. Corria a tarde do dia 18 de abril de 1957 quando o
ministro Álvaro Lins, da Casa Civil, chega ao gabinete presidencial, no Palácio
do Catete, com a Mensagem ao Congresso para JK assinar. Israel ficou sabendo. Correu
lá no gabinete e ponderou: “ Presidente, como o senhor está indo agora à noite
a Manaus, que tal o avião fazer uma parada rápida em Goiânia e assinar, lá
mesmo no aeroporto, este documento seminal da construção de Brasília?”.
JK
gostou da ideia. Perguntou se havia como avisar o governador Juca Ludovico.
Tempos difíceis de comunicação. Foi consultado o ministro Nelson de Mello, do
Gabinete Militar. Resposta: “ Sim, via radioamador”.
Assim,
lá por volta das 20h, a comitiva presidencial pega o avião C-47 da FAB com
destino a Manaus, com parada programada em Goiânia. O governador Juca Ludovico,
por sua vez, convoca Goiânia em peso para estar no aeroporto a partir da
meia-noite. Queria homenagear JK e estar com ele na assinatura da importante
mensagem.
O
pior acontece. Mau tempo em Goiânia. O C-47, após várias tentativas de
aterrissagem, alertado pelo comandante, desloca-se para o aeroporto mais perto:
Base Aérea de Anápolis. Precisava de reabastecimento. Eram 5h30min da
madrugada. Num botequim, depois de uma média com pão e manteiga, na presença da
comitiva e de alguns curiosos, JK assina a mensagem. Antes, risca a palavra
Goiânia e escreve Anápolis. Daí, Mensagem de Anápolis.
Em
16 de março de 1957, começou o milagre da redescoberta do Brasil. A partir daí,
escolhido o projeto Lucio Costa, começam a desaparecer as fronteiras que
impediam que o mar conhecesse o sertão e o sertão conhecesse o mar. Foi o
encontro geográfico do Brasil litorâneo onde, há 457 anos estavam as benesses
do poder, com o Brasil real, onde tudo era longe e tudo estava para ser
conquistado. JK, sempre determinado e com um entusiasmo cívico incomum,
conclamou o melhor da inteligência nacional e os mais fortes candangos para dar
a largada. E os dois Brasis se uniram.
11
de março de 1957 — Às 18 horas, encerra-se o prazo de inscrição do
concurso para escolha do projeto do Plano Piloto. São entregues 26 projetos no
prédio do MEC, Rio de Janeiro.
12
de março — É instalada a comissão julgadora, sob a presidência de Israel
Pinheiro. Participam Oscar Niemeyer, o arquiteto Paulo Antunes Ribeiro,
representando o Instituto de Arquitetos do Brasil, e o engenheiro Luiz
Hildebrando Horta Barbosa, do Clube de Engenharia.
Niemeyer
fez questão de trazer três consultores internacionais. Os melhores da época: o
inglês Willian Holford, o francês André Sive e o norte-americano Stamo
Papadaki. O trabalho foi secretariado por Erasmo Martins Pedro.
14
de março — Impasse entre os membros da comissão julgadora. Paulo Antunes,
representante do IAB, recusa-se a votar num dos 10 projetos pré-escolhidos pelo
grupo. Argumenta que Lucio Costa fez uma ideia e não um projeto. Sugere outro
projeto, o número 11. Israel Pinheiro sugere que Paulo Antunes faça um
relatório e vote em separado. Antunes apresenta outra solução: o tapetão, ou
seja, a composição de uma equipe formada pelos autores dos 10 projetos
previamente selecionados (mais o número 11, que ele queria) para elaboração de
um novo Plano Piloto. Israel Pinheiro coloca o relatório do IAB em votação. Há
uma recusa formal da comissão.
16
de março — É anunciado o projeto de Lucio Costa como vencedor. Lucio Costa
adota um conceito simples e universal do encontro de dois eixos; o Monumental e
o Rodoviário. O projeto foi o vencedor, não pelo seu detalhamento e
sofisticação, mas pela original e fantástica concepção urbanística. Holford, o
consultor inglês e maior nome do urbanismo mundial na época, que não falava
português, mas sim inglês, espanhol e italiano, foi mais longe: “O projeto de
Lucio Costa tem inventividade. Eu o li três vezes. Na primeira, não entendi. Na
segunda, eu entendi e vi que era o único com inventividade. Quando eu li pela
terceira vez, I enjoyed”.
As águas de março de 1957 fizeram chover oportunidades no Centro-Oeste brasileiro. Brasília saía do papel para o concreto.