Como sede do poder, seria
natural que Brasília estivesse destinada a se tornar o centro de onde emanariam
as principais questões da política nacional. No entanto, para uma República que
vem aos tropeços desde sua instalação em 1889, Brasília se tornou, além de
centro irradiador dos temas políticos nacionais, em foco de apreensão por parte
dos brasileiros, devido as seguidas e sérias crises institucionais.
É preciso mais do que um
exercício de abstração para deixar de lado essas crises, que nos acorrenta ao terceiro
mundo, para tratar apenas do aniversário de 63 anos dessa que é,
definitivamente, a capital de todos os brasileiros. Vale relembrar, que entre
as justificativas postas, ao final dos anos cinquenta, e que melhor respondiam
o motivo oculto para a transferência da capital, do Rio de Janeiro, para o
longínquo interior do país, estavam justamente essas: afastar da cidade
maravilhosa todas as nuvens cinzentas, manter distância da atuação atabalhoada
dos políticos brasileiros, seus escândalos e sua pouca atenção com fatos que
realmente interessavam a população.
Havia, mesmo que longe do
público, o desejo secreto de banir a classe política para longe. Com isso,
sonhavam seus articuladores, a cidade do Rio de Janeiro voltaria a ter sossego
e paz, livrando a capital também dos gastos e das exigências absurdas feitas
pelos políticos. Não era para ser diferente.
Naquela ocasião era comum
encontrar um político nas praias e cassinos e não no local de trabalho.
Bani-los para bem distante seria uma boa medida. Quem sabe naquele vazio do
Centro-Oeste, nossa classe política passasse a tomar maior consciência da
realidade sofrida de nosso país, se empenhando em trabalhar para um futuro
melhor para todos.
A chiadeira maior contra a
transferência, vinha justamente por parte daqueles que se viam prejudicados com
a mudança. Obviamente que essas razões eram mantidas longe do conhecimento do
público e dos eleitores. Felizmente, para os brasileiros que para aqui vieram e
se estabeleceram, essas eram questões que não tinham importância alguma para
seu cotidiano, uma vez que, no Rio de Janeiro como em Brasília, o mundo
político estava situado em outro universo, distante dos brasileiros.
Foi desse modo que Brasília e
com esse desdém recíproco que a nova capital foi se consolidando como cidade
aberta. Havia, como ainda hoje, uma Brasília para os moradores e uma outra
cidade paralela pertencente aos políticos que, por aqui, andam em revoada de
terça a quinta-feira.
Não há uma ligação de irmandade
entre esse e aquele mundo. O único traço a unir a nossa classe política e a
cidade são os empregos diretos e indiretos que essa atividade provoca na nova
capital. Portanto, a Brasília que interessa nos seus 63 anos de vida é aquela
ligada aos brasilienses que tomaram a cidade como seu lar.
Tirando o fato de que o projeto
inicial foi seriamente desvirtuado pela ação dos políticos locais, que a
lotearam de forma irresponsável, Brasília é hoje, sem nenhuma ressalva, a
cidade brasileira com os melhores índices de qualidade de vida. Não é por outra
razão que muitos políticos que para aqui vieram exercer seu métier, uma vez
longe do poder, passam a fixar residência no Planalto Central.
A Brasília que nos interessa
hoje no seu aniversário é, para muitos, aquela que vimos crescer a cada dia,
como nós, como uma irmã. Aquela em que assistimos às primeiras árvores e aos
primeiros gramados serem plantados. Gramados que o DPJ nos impedia de pisar. Um
cidade em que tudo era novidade, a começar pelas pessoas que vinham de
diferentes lugares e com histórias e sotaques diferentes. A cidade que não
possuía mar, mas que era banhada por um céu imenso, aberto e multicolorido. Uma
cidade onde tudo era novo, até a maneira de viver. A solidariedade, as
amizades, educação pública, tudo de todos. Uma cidade onde o térreo não era de
ninguém e de todo mundo ao mesmo tempo. Uma cidade que aprendemos a amar como
coisa nossa e que muito mais do que uma capital, no sentido político, foi a
casa que encontramos para nela depositarmos nossas vidas, escrevendo nossas
memórias e enterrando nossos candangos e pioneiros queridos, um a um, nesse
solo vermelho. Esperamos pacientemente, quem sabe, pelo nosso tempo, sentados
sob a sombra de um guapuruvu ou flamboyant, observando o que Brasília fornece
de assunto a cada dia, em seu Correio Braziliense. Feliz Brasília, caro
leitor.