Morreu,
nesta quinta-feira (10/8), em Brasília, a escritora, professora de português e
jornalista Dad Squarisi, aos 77 anos. Ela não resistiu às complicações de um
câncer. Referência na língua portuguesa e no jornalismo, Dad adotou o Brasil e
Brasília como lar, e ensinou gerações a escreverem e a se comunicarem melhor,
com a generosidade e a destreza características dos maiores mestres.
Dad
Abi Chahine Squarisi nasceu em Chekka, no Líbano, em 1946. A família se mudou
para o Brasil depois de o pai sair derrotado da luta pela independência
libanesa. Antes disso, Dad morou em países como França, Espanha e Argentina, o
que lhe permitiu aprender diversas línguas. Além do português e do árabe, ela
dominava o francês, o inglês e o espanhol.
O
primeiro estado em que viveu no país foi o Rio Grande do Sul. Como tinha
problema de asma grave, o médico recomendou a mudança para um local seco, e os
pais da jornalista escolheram Brasília. Na capital, ela cursou letras na
Universidade de Brasília (UnB) e atuou como professora no Instituto Rio Branco
por mais de uma década antes de passar no concurso para consultora legislativa
do Senado Federal.
Há 30 anos, foi convidada pelo então diretor de Redação do Correio Braziliense, Ricardo Noblat, para revisar a primeira página do jornal. “Noblat, diretor de Redação da época, falava que se o leitor visse um erro na capa do jornal, desistiria de comprá-lo”, lembrou Dad em entrevista ao Podcast do Correio especial de 63 anos de Brasília. Poucos anos depois, tornou-se editora de Opinião do jornal. (Vídeo ~~~)
Foi
ainda comentarista da TV Brasília e concluiu especialização em
linguística e mestrado em teoria da literatura. Machado de Assis, Graciliano
Ramos e Guimarães Rosa estavam entre seus autores favoritos.
Dad
escreveu para adultos e para crianças; para técnicos e para leigos; brasileiros
e estrangeiros; jornalistas, professores, concurseiros… A relação de públicos e
de livros publicados é imensa, ultrapassa as dezenas. Em sua sala, por e-mail,
mensagem, carta ou ligação, deixava as portas abertas para esclarecer dúvidas
sobre o idioma que aprendeu a amar.
Ela
é autora dos dois manuais de Redação do Correio. O primeiro Manual
de Redação e Estilo, de 2005, virou item de colecionador. Ainda é possível
ver exemplares circulando pelas mãos de jornalistas e de revisores, como
referência para o exercício diário da profissão. Conectada às mudanças impostas
pela tecnologia, Dad lançou, seis anos mais tarde, em 2011, o Manual de
Redação e Estilo para Mídias Convergentes, incluindo orientações de escrita
para plataformas digitais.
A
navegação entre plataformas, inclusive, era uma de suas especialidades. Nas
páginas impressas do Correio, publicou, até junho passado, a coluna Dicas
de português. Uma versão para os pequenos — as diquinhas — circulou durante
anos no suplemento semanal voltado ao público infantil, o Super!.
Na internet, o >> Blog da Dad é um dos mais completos
repositórios de dicas de língua portuguesa. Experimente digitar a sua dúvida
nos mecanismos de busca ao lado do nome Dad Squarisi. A resposta clara e
didática certamente aparecerá
Entrevista
a Jô Soares: O mais recente manual de Redação foi o motivo do emblemático encontro com Jô Soares, no Programa do Jô. A
participação de Dad no talk-show, transmitido pela Globo, ocorreu
em maio de 2012. “A internet já tem um estilo especial. Funciona
como aquelas bonecas russas, dentro delas vão todas as mídias, e é possível
encontrar jornal, revista, rádio, tevê, blogs, sites, entre outros. Então, há
uma convergência de mídia para a plataforma”, disse a escritora.
Pioneira,
a jornalista também reunia histórias marcantes com a cidade, como a época em
que lotes em regiões como Lago Sul e Lago Norte eram sorteados pelos jornais.
“Quando eu cheguei a Brasília, só havia a Asa Sul e a W3 Sul. À época, os lotes
do Lago Sul eram sorteados pelos jornais e ninguém ia tomar posse”, lembrou.
Até mesmo a equipe campeã da Seleção Brasileira de 1958 recusou o regalo. “A
Seleção Brasileira de 1958, campeã na Suécia, visitou Brasília nesse período e
cada jogador recebeu um lote de presente, e nenhum tomou posse. Cinquenta anos
depois, eles voltaram a Brasília e perguntaram quanto custava um lote no Lago
Sul. R$ 6 milhões, R$ 7 milhões. Zagallo disse: ‘Eu quero o meu, eu quero o
meu'. Mas já era tarde”, contou Dad no Podcast do Correio, aos
risos.
Luta contra o câncer: Ao lado do médico
hematologista e hemo-oncologista do Hospital Israelita Albert Einstein, Nelson
Hamerschlak, Dad lançou, no ano passado, o segundo volume do livro Desafios,
que reúne depoimentos de 35 pacientes que fizeram transplante de medula óssea
em decorrência de leucemia. A escritora, que se submeteu duas vezes ao
transplante de medula e seguia o tratamento contra o câncer, coordenou e editou
as publicações.
Em árabe, Dad é um advérbio, quer dizer “graciosamente”,
e só pode ser usado com o verbo andar. Um significado poético para quem tanto
ensinou durante a própria caminhada. Dad Squarisi deixa o filho, Marcelo, a
nora, Katilen, e os netos, João Marcelo e Rafael. Em mensagem de despedida para
a mãe, Marcelo antecipou a saudade que todos sentirão: "Hoje tem aula
de português no céu. Nossa amada Dad Squarisi foi para a morada eterna e de lá
continuará compartilhando seus conhecimentos com muita leveza e sabedoria.
Finalmente chegou o descanso após vários anos de tratamento. Agora, livre, vai
continuar nos fazendo aprender cada vez mais a língua que ela optou pot amar.
Para nós que ainda permanecemos aqui deixa um belo legado de obras,
aprendizados e muitas saudades".
O velório de Dad Squarisi será na sexta-feira,
(11/8), no Campo da Esperança, das 15h às 17h.