Apesar
de a ocupação do espaço que cerca a Arena Mané Garrincha estar em conformidade
com os critérios de preservação do Conjunto Urbanístico de Brasília, as
construções, cercas, placas, brinquedos infláveis e outras estruturas
instaladas no local têm gerado críticas por parte de urbanistas especializados
em patrimônio.
A
Promotoria de Justiça de Defesa da Ordem Urbanística (Prourb) instaurou
procedimentos administrativos para acompanhar o problema, inclusive no que diz
respeito à exploração de publicidade irregular na região. Atualmente, ela está
reunindo elementos para se posicionar, o que pode resultar em expedição de
recomendação aos órgãos competentes ou ajuizamento de ação civil pública. “O
Eixo Monumental é destinado a abrigar a zona cívico-administrativa da capital.
Todas as edificações que divergem desse conceito desconfiguram a concepção
original”, ressalta o promotor da Prourb Dênio Augusto de Moura.
Para
o urbanista e professor da Universidade de Brasília (UnB) Frederico Flósculo, o
que está havendo na região é desrespeitoso com o plano urbanístico de Lúcio
Costa. “Precisamos ter um plano de preservação que possibilite ao governo
continuar a promover projetos e obras necessárias à cidade com uma visão de planejamento
e não com uma visão totalmente improvisada”, observa. “Ali, deveriam ter
equipamentos esportivos para a comunidade”, sugere.
“O
que está acontecendo é um desenvolvimento de empreendimentos que caminha para
se tornar um grande shopping center. Está virando uma área de varejo comercial.
O que está acontecendo lá, além de ser um crime contra as características de
Brasília capital, é um esparramento de oportunidades comerciais oportunistas
que não querem somente aquela área. O governo Ibaneis está propondo um Plano de
Preservação do Conjunto Urbanístico de Brasília (PPCUB) onde a mesma coisa vai
acontecer no grande canteiro central do Eixo Monumental, na área onde fica a
Igreja Rainha da Paz”, lamenta Flósculo.
Descaracterização: Angela Nardelli, urbanista e conselheira consultiva
da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) sobre Patrimônio e Cultura, avalia que
algumas intervenções no conjunto urbanístico do Plano Piloto são prejudiciais
ao cenário que faz parte da identidade da capital. “Brasília tem muitas áreas
vazias entre áreas construídas, essa é uma característica do modernismo. A
mudança da paisagem descaracteriza as escalas e, com isso, descaracteriza-se
boa parte do que torna Brasília única”, opina.
“Em
dias de evento, estão cercando o estacionamento do estádio inteiro. Essa área
faz parte do Eixo Monumental, é pública e não pode ser cercada. Isso vai contra
todos os planos de preservação. Lote do Eixo Monumental não pode ter cerca”,
destaca o urbanista Pedro Grilo. “O que está sendo feito é desrespeitoso à
cidade e não está em conformidade com nada do que foi aprovado”, completa.
A
urbanista Angelina Nardelli assinala que a paisagem tem que ser preservada e
não está sendo. “Novos acréscimos significam uma valoração da especulação
imobiliária. Isso é contra o patrimônio, se for feito errado. Revitalizar não
significa demolir e fazer novo ou encher de prédios e comércio. Revitalizar é
trazer novamente à vida. Brasília é uma pérola que precisa evitar perfumes para
não embaçar”, analisa. “A área do Eixo Monumental foi feita para ter espaços
mais abertos, para que nós vejamos a grandiosidade do país e o quanto somos uma
nação forte. Acrescentar novos edifícios àquela área é um grande risco”, frisa
a urbanista. “É preciso movimentar a economia sem acrescentar itens
desnecessários que podem afetar a paisagem”, finaliza Angelina.
Vistorias: O Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico
Nacional (Iphan) relembra que, em 2020, foi aprovado um projeto vencedor em um
concurso de arquitetura para a requalificação do setor. “Neste ano, a
superintendência do Iphan no DF retomou as vistorias ao local e tem realizado
reuniões com os gestores responsáveis para redefinição do cronograma visando a
implantação daquilo que foi aprovado em 2020, com eventuais ajustes no
projeto”, informa o órgão, em nota.
De
acordo com o Iphan, entre os critérios de preservação do Conjunto Urbanístico
de Brasília está o uso predominante para atividades recreativas e esportivas,
taxa máxima de ocupação de 15% do setor, altura de edificações de até 12 metros
— exceto estádios, pavilhões, ginásios e quadras cobertas.
O
administrador do Plano Piloto, Valdemar Medeiros, é favorável à ocupação, por
fomentar a economia. “Não havendo riscos à preservação do conjunto urbanístico
tombado e, portanto, nenhum impeditivo para a aprovação do projeto, a
Administração do Plano Piloto entende que ações como esta, que estão em conformidade
com a legislação vigente, vão estimular o comércio na região. É importante que
a população saiba que a administração tem feito o seu papel de regularizar o
comércio local no Plano Piloto e, após o aval dos órgãos competentes,
continuará dando oportunidade e apoio para que várias famílias garantam seu
sustento”, afirma Medeiros.
A Arena BSB é a responsável por administrar a região pelos próximos 35 anos, de acordo com projeto aprovado pelo Iphan. A empresa informou ao Correio que os brinquedos infláveis e a estrutura ao redor fazem parte de um empreendimento temporário na região que foi denominado “Complexo Esportivo de Brasília”.