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A insegurança pública no Rio de Janeiro, por José Natal

A insegurança pública no Rio de Janeiro, por José Natal


O filme épico de Fernando Meirelles, Cidade de Deus, de 2002, que mostra a saga trágica e cruel de Zé Pequeno, Buscapé, Mané Galinha e outros personagens nos embates violentos no mundo do crime na periferia do Rio, talvez seja o documento mais verdadeiro que se tem notícia até hoje sobre a brutal realidade que norteia a sofrida região carioca. Quem viu deve se lembrar da triste mensagem cujo conteúdo nos arremete para um sombrio NÃO TEM SOLUÇÃO.

 

Triste constatação, parece que não tem solução mesmo. Não é nada bonito o cenário que a então Cidade Maravilhosa, cheia de encantos mil segundo o hino composto por André Filho em 1934, insista em aceitar a violação de seus princípios e assista essa onda de violência e impunidade administrativa.

 

A comunidade, abalada de tanto ver cenas de horror como rotina, assiste, sem entender, um desfile de explicações fajutas, providências sonhadoras e um avanço de medidas burocráticas que não levam a nada e a lugar nenhum.

 

O Governador do Rio, sempre com cara de paisagem e declarações patéticas, anuncia medidas que não adota, faz promessas que não cumpre e aparenta uma estranha submissão e aceitação das explicações pouco convincentes que a polícia sempre apresenta.

 

Trinta e cinco ônibus foram queimados em diversos pontos da Zona Oeste no Rio, apavorando as pessoas e a polícia pede calma à comunidade e garante que está tudo sob controle.

 

Dias atrás, quatro médicos foram fuzilados em frente a um hotel de luxo, levando a óbito três deles. Uma hora depois do crime a polícia afirma que os bandidos fizeram justiça entre eles, e os assassinos foram mortos por terem errado a missão. Ou seja, no momento atual do Rio, a milícia age mais rápido que a polícia.

 

O Secretário de Segurança convoca a imprensa, o Governador faz discurso, o Ministro da Justiça baixa decretos e até o Presidente anuncia medidas rigorosas e promete cadeia aos incautos.

 

Aquela máxima de que o Rio não é para amadores pode soar engraçado pra animar conversa de boteco. Mas, para as ditas autoridades essa piada deveria sair de seus vocabulários, e um pouco mais de seriedade na gestão dessa cidade seria o ideal.

 

Porta de entrada do turismo brasileiro, ex capital do País, berço cultural da nossa história, cartão postal de uma nação há anos que o Rio vem sendo administrado por governantes que ficaram mais tempo em Bangu do que nas instalações do antigo Palácio do Catete.

 

Vida que segue, tudo vai a toque de caixa. O cidadão paga pedágio pra milícia, favelado apanha da polícia e nos bailes funk da cidade rola um rap de protesto que a galera dança, acha bonito e tudo fica por isso mesmo.

 

Em 1966, Sérgio Porto, que usava o pseudônimo Stanislaw Ponte Preta, assinava uma crônica diária do Jornal Última Hora, onde, com ironia e humor aguçado, criticava as mazelas das autoridades que cuidavam do Rio e do País.

 

Ainda em 66 publicou o primeiro Febeapá, Festival de Besteira que Assola o País, crônicas bem humoradas, onde também registravam o espanto da população com as bizarrices da administração da cidade.

 

E, é bom que se diga, já naquela época a mídia sinalizava que quem mandava na política do Rio era a Assembleia Legislativa, e não o Governador. O fato é que a rotina macabra de tragédias e fatos negativos que sempre envolvem as autoridades de segurança tem que ter um basta.

 

O Rio, que ao mesmo tempo encanta os brasileiros e visitantes de outros mundos, não pode continuar vivendo sob a eterna chantagem de milicianos, bandidos que submetem as comunidades a seus caprichos malignos.

 

Salta aos olhos a lentidão burocrática com que os governantes tratam o assunto. O governo não faz nada sem que aconteçam mil reuniões, acertos políticos, troca de autoridades e uma infinidade baboseira que o crime só agradece.

 

Enquanto o bandido age sem seguir protocolo algum, governantes negociam quem pode sair melhor na foto, de olho na próxima eleição. É assim que funciona, quem duvida é só pesquisar, está tudo registrado.

 

Nos dias de hoje, com tanto avanço tecnológico, recursos disponíveis e uma infinidade de mecanismos à disposição das forças de segurança não é possível admitir tanta incompetência. No placar sinistro dessa tragédia os fora da lei ganham de goleada.

 

Uma das cidades mais importantes do Brasil não pode ser, eternamente, refém desses marginais. Algo tem que ser feito. Em 1967, o jornalista, escritor e publicitário Emir Farhat, que morreu em maio de 2000, aos 86 anos, escreveu o seu polêmico livro “O País dos Coitadinhos”, para alguns, um Livro Maldito.

 

Maldito, por que já naquela época criticava a burocracia, os entraves e as trapalhadas que os governantes adotavam no trato com a coisa pública. Um retrato, quase que perfeito, de tudo que acontece hoje no Rio, quando o caos sinaliza um futuro bem distante das soluções que a comunidade espera.

 

Lamentavelmente, esse cenário de violência também pode ser visto em outras regiões do País. Muito triste, coitadinhos somos nós.



José Natal - Jornalista




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