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Entrevista: Juíza Gabriela Jardon "Mulheres magistradas são minoria no Judiciário do DF"

Mulheres magistradas são minoria no Judiciário do DF. Ao CB.Poder, a juíza Gabriela Jardon, titular da 6ª Vara Cível do TJDFT, comentou sobre a desigualdade de gênero que persiste na Corte. A presença feminina é de 37% entre os desembargadores e de 24% na segunda instância

 

A desigualdade de gênero no Judiciário foi tema do CB.Poder — parceria entre Correio e TV Brasília — de ontem. Aos jornalistas Carlos Alexandre de Souza e Thays Martins, a juíza Gabriela Jardon, titular da 6ª Vara Cível do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios (TJDFT), falou sobre o cenário na Corte e a respeito da disparidade entre o número de mulheres que cursam direito e a presença feminina na magistratura, que é bem menor.

 

A senhora tem um vasto estudo a respeito da igualdade de gênero no Judiciário. Pode descrever essa situação do TJDFT em relação a essa questão? Aqui no TJDF a gente acaba sendo retrato dos demais tribunais estaduais, apesar de termos uma natureza híbrida, um tribunal estadual e distrital. Mas, dentre, os tribunais do mesmo porte e que têm essa competência estadual, o TJDF acaba reproduzindo as estatísticas conhecidas. Hoje, temos na primeira instância por volta de 37% de mulheres desembargadoras e, na segunda instância, 24%. São dados de 2022, que foram colhidos pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Esse é o nosso retrato. Existe no TJDF, como no país inteiro, em todas as instâncias, em todos os tribunais, de todas as competências — com exceção da Justiça do Trabalho, que tem uma situação particular e na segunda instância eles já igualaram, têm 50% de participação feminina. Existe essa desigualdade, que agora está em cheque.

 

As mulheres são maioria na população, nos cursos de direito e também na Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). 

 

Por que essa disparidade? É uma estrutura super complexa, patriarcal, de onde não infrequentemente deriva uma estrutura misógina. São várias as barreiras. O que sabemos, por construção das ciências sociais e por pesquisas como essas todas do CNJ, que estão baseando toda essa discussão, é que as mulheres se perdem no encaminhamento para essas carreiras, muito devido ao que chamaremos na academia de divisão sexual do trabalho doméstico. Seriam os afazeres. O cuidado da vida humana ainda é super feminino. Estatisticamente, é calculado que 98% do trabalho doméstico, hoje, no Brasil, seja feito por mulheres, contratadas ou não. É muito alto. O trabalho com essa administração da vida, dos filhos, dos idosos, das pessoas com deficiência, de todo mundo ainda é majoritariamente entregue às mulheres. Como explicamos que nos cursos de direito somos maioria (54%), mas o ingresso na magistratura cai para 37%? Esses 17% onde estão? Alguns podem pensar que essa diferença é pouca. Não é pouco, porque, se não há algo externo que está interferindo, a tendência é que se reproduzam os mesmos percentuais, mas eles caem significativamente. 

 

No início da carreira é comum os juízes recém-nomeados trabalharem em locais mais distantes. Aí, entram questões que não dizem respeito apenas à mulher, mas à família. Veja a entrevista Completa Vídeo ~~~~)

Como isso impacta? No Distrito Federal, não temos nada muito longe, por causa das nossas dimensões, então, não nos mudamos. Normalmente, a pessoa fica onde já é seu domicílio, mas as outras colegas, dos outros 26 estados da federação, têm que se mudar. Lembro de conhecer colegas que ficavam a dez horas da capital do Mato Grosso, Cuiabá. Às vezes, local em que não se chega nem com avião. A profissão é muito capilarizada, o que é uma coisa linda, primeiro necessária e, depois, para quem gosta, é bonito ver a Justiça chegar tão longe, em lugares tão pequenos. 


Qual é a mulher que dos 25 aos 35 — que é a faixa etária em que a gente normalmente ingressa na carreira — vai ter esse suporte para poder não estar cuidando da sua família? O início da carreira é um momento muito delicado — em geral, quando a juíza está entre 25 e 35 anos — e numa fase, muitas vezes, de consolidação da maternidade, do casamento. 


E ainda tem responsabilidades em relação aos pais. Isso é levado em conta quando se discute a realidade da mulher no Judiciário? Indiretamente, sim. Em todas as instâncias isso foi discutido e acho que uma das primeiras coisas a serem faladas quando começamos a tentar entender esse fenômeno é: por que as mulheres estão em menor número? Essa particularidade da carreira certamente afasta as mulheres. Aí, você pensa: “mas as mulheres estarem tão encarregadas dos cuidados é um dado natural?”. Não, é um dado social, é uma construção social. Implementar a paridade no Judiciário vai fazer alguma coisa com isso que é tão maior que o Judiciário? Não diretamente, mas, com certeza, vai minando as bases de algo muito maior e que só é transformável com essas iniciativas à mão. Não tem como decretar que, a partir de agora, as famílias se dividam melhor. Não é assim que a coisa funciona.


Carlos Silva – Foto: Marcelo Ferreira/CB – Correio Braziliense 






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