É só reparar: ninguém mais fala
em pós-verdade. O termo surgiu por volta de 2015, portanto há menos de uma
década, tomou conta do mundo como uma forma mais filosófica para quem queria
contar uma mentira bem cabeluda, e já caducou. O povo continua mentindo, mas
quem apostou que a pós-verdade iria pautar o comportamento geral deu com os
burros n’água, também expressão que caducou.
Nada é para sempre. As coisas
estão cada vez mais efêmeras e a única exceção parece ser a voz de Paul
McCartney, inoxidável, como ele demonstrou ao cantar rock por mais de duas
horas e meia, com a empolgação de um garoto octogenário. E sem beber água, nem
fazer xixi.
Mas as palavras duram cada vez
menos. Que ninguém mais se surpreenda gritando homessa é compreensível, o termo
usa polainas e pincenê desde o berço, nasceu velho. Também não se espera que
alguém use botica ao se referir a uma farmácia, ou nosocômio no lugar de
hospital.
O jeito de falar muda, provocado
por neologismos, estrangeirismos ou influências da moda, mas algumas palavras
fazem falta ao nosso vocabulário: é muito mais eficaz chamar um sujeito de
sacripanta do que de mau-caráter, melhor acusar de patego do que simplório, se
bem que pacóvio é bom também.
Alguns verbos ficaram
ultrapassados pelo óbvio motivo que o ato que representam ficaram para trás.
Caso de brunir, que é engomar a ferro um tecido até torná-lo lustroso, o que
ninguém mais faz. E há termos que, sabe-se lá porque, mudaram de sentido. Pachorra,
por exemplo, descrevia uma paciência sem fim; passou a ser quase desaforo.
Palavras foram esquecidas também
pelo absurdo. Quem mais quer falar, como nos anos 1950, escaganifobético ao
invés de estranho ou esquisito? Assim como é melhor discutir do que porfiar, e
se encolher de frio do que ficar entanguido.
Outras foram condenadas pelo
preconceito intrínseco: sostra, por exemplo, serve para definir uma mulher suja
e preguiçosa, nunca um homem. E sostro não existe. O pior é que há mais de um
adjetivo para as sujas e preguiçosas: jontra. E cagalhota que, com cacofonia e
tudo, denominava mulher (nunca um homem) baixa e de pescoço curto.
Ao mesmo tempo, muitos outros
termos foram agregados ao nosso cotidiano, como os oriundos da informática
(deletar, googlar), das gírias (deboísmo, que vem de “de boa”) e até da
pandemia (telemedicina, home office). Palavras novas confundem a cabeça de alguns,
principalmente os sofomaníacos – aqueles metidos a saber tudo.
Álvio é assim. O nome incomum
parece inspirar nosso amigo a exercitar a palavra difícil, ainda que empregada
de forma errada. Vira e mexe ele recebe alguém com a pérola: “É um balaústre da
nossa cidade”. Ninguém o corrige para dizer que balaústre é uma coluna de
cerca. Ou: “Lá vem ele com seu ar mendacioso”, crente que é um elogio chamar
alguém de mentiroso.
Ceará ensinou a ele uma palavra nova – fósmeo –, como sinônimo de feliz. Se fosse ao dicionário, Álvio saberia que é uma homenagem a ele próprio. É o mesmo que confuso, incompreensível.