Pelos
idos de 1974, quando Geisel era presidente da República e Elmo Serejo Farias,
governador de Brasília, uma das unidades do Corpo de Bombeiros do DF foi
escalada para fazer uma inspeção de segurança em vários pontos da cidade. Uma
espécie de vistoria geral, visando evitar problemas em caso de futuras
operações. Não me lembro do nome do comandante chefe da operação. Mas
recordo-me do seu veredito sobre o que viu: área complicada, de difícil acesso.
Nossa escada magirus terá dificuldades para entrar ali. Poucos hidrantes,
calçadas impedindo acesso aos prédios, ruas estreitas e áreas ocupadas por
peças de concreto que impedem acesso dos caminhões de água, relatou.
O
tempo passou, a cidade cresceu, os governantes mudaram, mas o layout
comprometedor e condenado pelos soldados do fogo ainda está por lá. E o que era
ruim ficou pior. Áreas imensas foram ocupadas por ambulantes que vendem desde
milho assado até óculos Ray-ban e guaraná Jesus, um comércio jamais
regulamentado e sem o menor cuidado e zelo pela higiene e pela limpeza.
Escritórios de algumas empresas, redações dos jornais O Globo, O Estado de S.
Paulo, revista Veja e até o extinto Jornal do Brasil — Edifício Central —
tiveram um tempo de vida por ali.
Um
fato que merece registro e entrar para história também figura nessa narrativa.
O primeiro comitê de campanha do ex-presidente Fernando Collor de Mello ocupou
espaço no SCS, e, por ele, passaram Marias e Josés que, hoje, ainda andam por
aí. Alguns nem andam mais, a polícia pegou. Vida que segue. Situado no coração
do Plano Piloto, área nobre de Brasília, a verdade é que o governo local e
parte da comunidade mal orientada administram mal, sem critério e disciplina
tudo que está ao redor do Setor Comercial Sul (SCS). Em passado recente,
circular pelo Setor no período noturno amedrontava as pessoas, tal a
intensidade de elementos consumindo drogas e indicativos de áreas de
prostituição. As autoridades policiais agiram, e o ambiente melhorou. Agências
do Bradesco, Itaú e BRB ainda estão por lá, mas vão sair. O Santander saiu,
ambiente negativo. Por mais de uma vez, entidades e pessoas ligadas à cultura
tentaram investir no SCS, promovendo eventos, realizando shows e pequenos
espetáculos nos finais de semana.
Muito
se falou em mudanças e maneiras de se viver e trabalhar no Setor Comercial Sul.
Projetos foram apresentados, sugestões questionadas, e governantes e governados
até hoje batem cabeça sobre o que se fazer com aquela área, para muitos carente
de boas ideias. A última narrativa que há sobre possíveis mudanças de como se
viver e trabalhar no SCS sugere que o local seja transformado também em setor
residencial, permitindo que famílias ali se instalem e ofereçam outra forma de
vida ao lugar, inclusive, permitindo que ali comecem a existir novas opções de
emprego.
Fernando
Pedro Brites, português nascido em Beira Alta, Portugal, e morando de mala e
cuia no Brasil desde 1953, conhece bem os hábitos e costumes do povo
brasileiro. Chegou a Brasília em 1994 e, de lá para cá, acompanha a vida da
cidade, visitando ruas e becos e sentindo a comunidade de perto. Hoje, preside
a Associação Comercial do Distrito Federal (ACDF), após anos e anos trabalhando
na entidade e assimilando suas iniciativas. A sede da ACDF fica exatamente no
Setor Comercial Sul. Talvez, venha daí a iniciativa e a vontade declarada de
mudar a cara do local. Segundo Brites, que é formado em propaganda e marketing,
o SCS pode se transformar em um rico mercado de trabalho para variados
segmentos e projetos. Ideias sobre o assunto fazem parte de sua equipe e
daqueles que também alimentam essa expectativa.
Pelo
que se sabe, e o administrador confirma, há uma forte resistência de várias
entidades para a mudança da filosofia de vida de atuação do Setor Comercial
Sul. Aqueles que apoiam a ideia e concordam com as sugestões de Brites
acreditam que, mais cedo ou mais tarde, elas vão se concretizar. Não há mais
tempo a perder. O espaço nobre ocupado é precioso, e precisa ser mais bem
aproveitado. O GDF — segundo as entidades que apoiam a mudança — tem se mantido
distante e demonstra pouco entusiasmo pela medida. Para alguns, existe ainda um
forte apelo pela continuidade do que pede o projeto de fundação da cidade, e
uma mudança de finalidade significa uma violação. Exagero, não pode ser assim.
Um empresário que acompanha o debate pediu-me opinião como pioneiro, como
morador antigo da capital. Não sou pioneiro, como já disse. Eu estava aqui, a
cidade é que chegou.