É certo que,
em nosso país, a privatização, parcial ou ampla, de alguns serviços básicos e
essenciais ao cidadão sempre vem acompanhada de problemas e deficiências que
acabam por prejudicar quem mais deveria ser protegido: o usuário, que paga, e
caro, por esses serviços. Estamos falando basicamente do fornecimento de água,
esgoto tratado, coleta de lixo e, obviamente, de eletricidade. Portanto, a
privatização desses importantes serviços deve, por bom senso, ser realizada sob
muitos cuidados prévios. Afinal, o consumidor é também um cidadão, com direito
a esses serviços.
Na maioria das
vezes, essas terceirizações têm produzido um enorme, constante e crescente
número de reclamações. Isso deixa patente que o fornecimento de água e luz tem
desagradado aos consumidores. Muitas dessas queixas vão parar na Justiça de
pequenas causas, gerando custos tanto para a máquina do Estado quanto para os
consumidores. Os prejuízos com cobranças indevidas são visíveis e cobrados em
forma de danos morais, materiais e outros. Pelo que se tem visto, o grande
número de queixas e reclamações tem deixado essas empresas literalmente sem ter
como atender a tanta demanda.
A falta de
pessoal especializado e capacitado para atender diretamente e em tempo real aos
reclames dos consumidores é uma realidade. Empresas, muitas delas com a matriz
no estrangeiro, ao se alistarem para prestar serviços essenciais à população,
por meio de processo licitatório público, assumem esses compromissos sem ao
menos ter uma ideia próxima do tamanho da responsabilidade e da sensibilidade
desses serviços.
Água e luz são
insumos que garantem, de fato, o exercício da cidadania. A prestação desses
serviços deve, pois, estar sujeita à vigilância ativa do poder público. Num
mundo ideal, onde o bom senso imperasse, as empresas seriam muito mais do que
simples empresas. Seriam amigas do consumidor, tratando-os com todas as vênias
e atenções.
Há um outro
aspecto a ser observado, que é o da humanidade, pois ninguém vive sem esses
insumos básicos. É sabido e certo que as empresas que fazem parceria do tipo
público-privada (PPP) com os governos buscam lucros e os têm em grande medida.
As contas de luz e água não são baratas e pesam no bolso dos consumidores. Todo
o dia certo de cada mês, chegam e, não raro, surpreendem a todos pelos valores.
Os mecanismos de cobrança funcionam como um relógio suíço. Os consumidores de
baixa renda são os que mais reclamam, pois são também os únicos a checar com
cuidados os valores cobrados.
A rigor, luz,
água, esgoto e coleta de lixo deveriam ficar sob o guarda-chuva do Estado,
assim como educação, segurança e transporte público. Mas, na impossibilidade
prática da prestação desses serviços, recorrem-se a terceiros por meio das
famosas PPPs.
Para complicar
ainda mais essa questão, as agências reguladoras, que deveriam, em tese,
proteger os consumidores, se veem pressionadas pelo poderoso lobby e, não
raramente, preferem fechar os olhos às demandas da população. Nesse caso, não
há a quem recorrer, a não ser àqueles que podem custear altos escritórios de
advocacia.
Esses insumos
concretos à cidadania deveriam ser melhor cuidados pelo governo. Afinal, até
mesmo o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) está diretamente relacionado com
a prestação desses serviços. Os países que mais investem nessa área são também
os mais desenvolvidos, prósperos e os que mais fazem valer os direitos
individuais e, por que não, a própria democracia.