A denúncia criminal feita pela PGR
contra o ex-presidente Jair Bolsonaro é mais um passo na construção do pior
escândalo judicial jamais registrado na história desde país. É tudo muito
simples, e por isso mesmo o regime e o seu sistema de apoio inventaram um
enredo complicadíssimo para esconder os fatos e confundir o público. O STF, uma
facção de agentes da Polícia Federal e o Ministério Público fabricaram toda uma
coleção de teses sobre crimes que gostariam que tivessem acontecido – e
principalmente sobre os autores que gostariam de acusar.
Em nenhum momento os advogados dessas
pessoas tiveram acesso adequado às acusações. A imprensa reproduziu
mecanicamente, como fatos comprovados, tudo o que a polícia lhe entregou para
publicar. As suposições do inquérito, então, foram recebidas como provas pela
PGR – e o pacote final dessa falsificação toda virou uma denúncia judicial
contra Bolsonaro e outros mais.
A ação da PF e da PGR contra o ex-presidente
da República, sob o comando direto de um ministro do STF e o apoio automático
dos demais, é o equivalente, no Brasil “democrático” de hoje, aos “Processos de
Moscou” da Rússia soviética nos anos 30 – tidos como o momento de maior infâmia
nos anais da depravação geral da justiça. A PGR não apresenta nenhum fato real
que ligue Bolsonaro a qualquer crime de golpe de Estado. Não prova, aliás, que
houve golpe de Estado, ou sequer uma tentativa concreta de golpe. Não
demonstra, com um mínimo de lógica, que em algum momento a normalidade da
sucessão tivesse estado sob ameaça efetiva. Não apresenta o mais remoto indício
de que as Forças Armadas, em qualquer altura da história, tenham tipo qualquer
participação no cenário construído pela PF.
É tosco, mas é o que está aí: socam o
máximo possível de acusações em cima do público, a mídia engole tudo como
verdade e tentam criar a impressão de que há tantas provas, mas tantas provas,
que a essa altura já nem é preciso provar nada
A denúncia da PGR contra Bolsonaro não
leva em conta que é materialmente impossível dar um golpe de Estado, em
qualquer lugar do mundo, sem o comando direto das ações por parte de militares
armados – do planejamento à execução. Bolsonaro e os demais denunciados não
poderiam ter dado o golpe nem se quisessem, da mesma forma como não poderiam
ter cometido um crime em Marte. A peça mais preciosa no enredo da PGR é o que
ela chama de “atos golpistas” do dia 8 de janeiro – na verdade, apenas um
quebra-quebra em Brasília em que as armas mais perigosas, segundo a própria PF,
eram estilingues e bolas de gude. Os golpistas eram motoboys, barbeiros,
mecânicos, manicures – até um autista, que vive num lixão em Mato Grosso e
continua obrigado a usar tornozeleira eletrônica.
A alma de toda a denúncia da PGR é uma
aberração legal – as acusações de um subalterno, um ajudante de ordens de
Bolsonaro que fez “delação premiada” e repetiu unicamente coisas que tinha
ouvido dizer, ou que “concluiu”, sem apontar nenhum fato concreto capaz de
ligar o seu chefe a qualquer ato golpista. É uma delação altamente
problemática. Já foi anulada, após o delator dizer que fora forçado pela
polícia a fazer as acusações – e só ressuscitada depois que o ministro
Alexandre de Moraes o ameaçou de prisão se não lhe entregasse “fatos”. O
delator não apresentou nenhuma testemunha. Não forneceu prova decente de nada
do que disse. Há pouco, queixou-se de novo das pressões que recebeu.
O “documento” escrito que a PGR
apresentou como prova das acusações contra Bolsonaro é um pedaço de papel
particularmente patético – um rascunho sem assinatura com considerações a
respeito da possibilidade de se pedir ao Congresso a licença para a declaração
de um “estado de emergência”, ou algo nessa linha. Há, de novo, a acusação de
que Bolsonaro concordou com um plano para matar o ministro Moraes e o próprio
vice-presidente. A quem ele disse que concordou? Quando? Onde? E que plano era
esse? Qual é a prova material de que tenha existido? A denúncia da PGR
apresenta isso tudo, e muito mais, como fato provado e indiscutível. A defesa
dos acusados, enfim, só agora tomou conhecimento disso tudo – junto com resto
da população do Brasil. Isso não existe no processo penal de qualquer
democracia do mundo.
Toda essa farsa gigante, porém, é
apresentada pelo regime, a elite e a maior parte da mídia como prova de que –
vejam só – o caso todo do golpe não é uma farsa. É tosco, mas é o que está aí:
socam o máximo possível de acusações em cima do público, a mídia engole tudo
como verdade e tentam criar a impressão de que há tantas provas, mas tantas
provas, que a essa altura já nem é preciso provar nada. Para que, não é mesmo?
Já “falaram” tanta coisa, que “está na cara” que o homem tem de ser culpado –
se não de tudo, pelo menos do grosso. De mais a mais, Bolsonaro já está mesmo
condenado: quem vai julgar é a “Primeira Turma” do STF, com Moraes e Flávio
Dino, só para se ter uma ideia. Alguém acha que vão rejeitar a denúncia que
eles mesmos mandaram a PGR fazer? É nosso processo de “recivilização”.