Há sempre um ou mais ministros do STF
de olho nos parlamentares. E há sempre um bocado de deputados e senadores
envolvidos em atividades suspeitas e, claro, expostos a algum tipo de
chantagem. Há sempre uma operação da Polícia Federal pronta para conduzir congressistas
àquilo que interessa aos magistrados. Que o diga o ex-presidente da Câmara
Arthur Lira. Não botou em votação o PL da Censura, e lá foram os agentes
federais bater na porta de um assessor dele, numa operação sobre desvio de
verba pública na compra de kits de robótica. Hugo Motta, sucessor de
Lira, é só mais um na alça de mira. O quanto têm tirado seu sono as
investigações da PF sobre desvios de emendas parlamentares destinadas ao
município de Patos, na Paraíba? O prefeito da cidade é Nabor Wanderley, pai de
Hugo Motta, também filiado ao Republicanos. O contrato investigado é anterior à
sua gestão, mas foi executado durante a administração de Wanderley.
Para Motta, urgente mesmo passou a ser
criar 160 funções comissionadas no gabinete dos ministros do Supremo... E,
claro, digerir o que lhe foi servido no jantar no apartamento funcional de
Alexandre de Moraes, com a presença de outros ministros da corte, além do
procurador-geral da República e do diretor da Polícia Federal. Rapidamente, já
estava dizendo que “nos últimos 40 anos, não vivemos mais as mazelas do período
em que o Brasil não era democrático”... Passou a rebolar e dar piruetas,
tentando escapar da pressão correta e justa para que leve a plenário logo o
Projeto de Lei da Anistia. Sim, há votos suficientes para aprovar a urgência e,
em seguida, a matéria, porque ainda há deputados que não têm o rabo preso, que
não cedem a pressões indevidas, que não querem ser cúmplices do aniquilamento
do Legislativo pelo Judiciário. Mais do que tudo, ainda há deputados com senso
de justiça.
Quem se opõe hoje à anistia aos
envolvidos no 8 de Janeiro acha lindo que, em 1979, terroristas que queriam
implantar no Brasil uma ditadura do proletariado tenham obtido o perdão do
Congresso
A anistia, que é a concessão de perdão
para um ou mais indivíduos, já foi concedida na época da colonização do Brasil,
no reinado de dom Pedro I e também no de dom Pedro II. Desde o golpe
republicano, a anistia foi adotada em pelo menos dez ocasiões. E sempre
aplicada a pessoas que tinham realmente cometido algum tipo de crime, quase
sempre com motivações políticas. Quem se opõe hoje à anistia aos envolvidos no
8 de Janeiro acha lindo que, em 1979, terroristas que queriam implantar no
Brasil uma ditadura do proletariado – assassinos, sequestradores, assaltantes –
tenham obtido o perdão do Congresso Nacional. E reclama que a lei tenha sido
ampla, geral e irrestrita, como pediam, beneficiando também agentes do regime
militar. No fim das contas, é sempre assim, comunistas e socialistas não querem
saber o que é feito, mas quem faz. Eles serão sempre os bem intencionados,
mesmo que carreguem armas e bombas.
É certo que não estaríamos nessa
situação, se o Legislativo não tivesse se curvado ao Supremo Tribunal Federal.
Se o Senado, o vigia do vigia, tivesse sido capaz de manter os ministros do STF
no papel que lhes cabe, de guardiões da Constituição. Agora, no ponto em que
estamos, o que se pede é anistia para inocentes, ou para pessoas que cometeram
crimes pequenos, como invasão de prédio público e depredação de patrimônio. O único
golpe planejado, tentado e concretizado foi o que tirou Lula da prisão e
encarcerou o Brasil nessa aliança deprimente entre STF e PT. Portanto, não há
por que se opor a uma anistia agora um pouco diferente, ou se envergonhar dela,
como se fosse uma admissão forçada de culpa; foi o que nos restou na busca por
justiça.
A primeira batalha é na Câmara dos
Deputados. Hugo Motta precisa ter um mínimo de respeito a si próprio e,
principalmente, ao país. No Senado, o obstáculo é maior: Davi Alcolumbre.
Haverá alguma mágica capaz de despertá-lo para o que é certo? Acreditemos que
sim. Aí surgirá Lula, com um veto fedorento ao PL, que o Congresso derrubará. E
virá, no fim, o golpe baixo da judicialização. Partidos comunistas e
socialistas, derrotados no Legislativo, pretendem levar a questão ao Supremo.
Querem, como sempre, armar uma falcatrua para que o projeto seja considerado
inconstitucional... Ministros do STF, como Alexandre de Moraes e Flávio Dino,
estão prontos para endossar a trapaça. E como? Afirmando, como têm feito, que o
8 de Janeiro foi “uma ação de grupos armados contra a ordem constitucional e o
Estado Democrático”. Por isso, não caberia, segundo a Constituição, anistia...
Não é à toa que, mesmo não havendo armas entre os manifestantes do 8 de Janeiro
– apenas um bodoque –, muitos condenados foram enquadrados por “associação
criminosa armada”...
Num país em que há um preso político
como Daniel Silveira, beneficiado por uma graça presidencial – derrubada
ilegalmente pelo STF –, beneficiado por um indulto presidencial involuntário de
Lula – barrado também pelo Supremo –, tudo pode mesmo acontecer... Um Projeto
de Lei de Anistia, absolutamente legítimo, legal, último recurso, como já ficou
claro, na busca por justiça, pode também ser triturado pelos togados. Por culpa
de gente como Hugo Motta e Davi Alcolumbre e, antes deles, Arthur Lira e
Rodrigo Pacheco... Só que eu mantenho as esperanças, eu não desisto da luta e
acabo me perguntando: a quantos ministros do STF que agora se opõem,
indevidamente e sem nenhum constrangimento, à anistia aos presos políticos do 8
de Janeiro será, mais à frente, pedida anistia por todos os crimes que eles têm
cometido pelo menos desde 2019?