Não é de hoje que figuras sem maiores expressões acadêmicas usam da
titularidade de historiador e de outras formações de nível superior para
distorcer fatos históricos, numa tentativa vã e descarada de reescrever o
passado recente, sobretudo um passado que manchou para sempre a ficha corrida
de diferentes comandos do nosso país. É justamente esse passado recente,
envolvendo os escândalos do mensalão e do chamado petrolão, que busca lançar,
ao lixo e ao esquecimento, como se nada desses episódios criminosos tivesse
sido acompanhado e documentado, par i passo, por milhares de coberturas in loco
e em tempo real por todo o jornalismo brasileiro e do exterior.
Apenas uma juntada de todas as reportagens que foram feitas naquele
período perfaz, com folga, mais de dezenas ou centenas de milhões de linhas,
todas elas focadas no que a maioria dos analistas passou a considerar como o
maior e mais abrangente esquema de corrupção de toda a história brasileira. A
história vista de cima, em todo o seu conjunto e com toda a justeza e
imparcialidade dos verdadeiros historiadores, não tem lado político e não se
alinha ao caminho fácil e enganoso das ideologias. Nem se deixa levar ditames e
simpatias de partidos.
Antigamente, se dizia que filósofos e historiadores, para ficar apenas
nessas duas vertentes do pensamento, não deviam se alinhar a ideologias, muito
menos às de cunho político e partidário. Filósofos que buscaram abrigo em
legendas e ideias políticas perderam a capacidade intelectual de isenção e de
livre pensamento, restringindo suas ideias ao horizonte curto da política e de
seus labirintos sem saídas. Não é de hoje que se ouvem vozes aqui e ali, vindas
tanto do mundo político quanto das universidades públicas do país, que buscam
distorcer os fatos que levaram o país a conhecer, nos seus meandros, os casos
de corrupção acima citados. Volta e meia, alguns desses personagens insistem em
dar uma nova explicação para coisas que, em si, foram taxativamente expostas à
luz do dia e ao conhecimento geral.
É fato que a ideologia cega. E cega mais ainda quem se acredita um
expert em manipular a verdade. O descaramento é tal que gente desse naipe não
se avexa em repetir o mesmo bordão daqueles que protagonizaram e comandaram
diretamente esses escândalos. O que chega a ser surpreendente é que professores
e pensadores, que deveriam, por sua formação, serem os mais precavidos e ponderados,
acabem embarcando na canoa furada que agora culpa a Operação LavaJato não pelo
desmonte da megacorrupção sistêmica que sangrava o país, mas pelo fato de ter
causado impactos geopolíticos, comprometendo a soberania nacional. É o caso
aqui do poste urinando no cachorro.
Para alguns desses professores de história, cerceados por legendas
partidárias, a Lava-Jato foi o maior desastre da política externa brasileira,
pois teria provocado o maior desmonte da engenharia pesada nacional. Tudo isso
por ação direta do Departamento de Justiça dos Estados Unidos. São tantas
sandices, sacadas ao léu, que, mesmo se repetidas milhares de vezes, jamais
irão se transformar em verdade.
Quem destruiu a engenharia pesada nacional foram os próprios empresários
nacionais aliados àqueles políticos daquela ocasião. Não fosse aquela operação
virtuosa, ainda hoje os cofres públicos estariam sendo saqueados à luz do dia e
sob o olhar complacente de todos aqueles que lucraram com essas rapinagens.
A bem da verdade, versões desse gênero nem sequer deveriam ser levadas a
sério. O problema é tentar vender esse peixe mal cheiroso para os jovens que
ingressam nas universidades como carne fresca. Os velhos professores dessa
disciplina, para os quais a história ensina a não condenar e não absolver,
ficam apenas com a alternativa de dizer a verdade, mesmo que esta esteja, como
se diz, espalhada em milhares de pedaços por todo o lado.