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Leviatã precisa de dieta

Leviatã precisa de dieta

Em tempos de desconfiança nas instituições e de descrença nos sistemas de representação, volta à tona uma velha e incômoda pergunta: qual o tamanho ideal do Estado? A questão, embora repetida à exaustão em debates acadêmicos e palanques eleitorais, permanece viva porque diz respeito ao cotidiano mais imediato do cidadão — aquele que trabalha, paga impostos e assiste, impotente, ao inchaço de uma máquina pública que parece crescer às suas custas.

A Física nos ensina que um objeto só pode ser compreendido em relação a outros — sua massa, velocidade, força. O mesmo raciocínio pode ser aplicado à relação entre o indivíduo e o Estado. Quanto maior e mais intrusivo for o aparato estatal, menor, proporcionalmente, será o espaço reservado ao cidadão comum. O crescimento desmedido do Estado tem o efeito colateral perverso de apequenar o indivíduo diante de uma engrenagem insaciável, que tudo absorve, consome e transforma em burocracia.

Um Estado hipertrofiado tende a reduzir seus habitantes à condição de operários invisíveis — inicia-se a busca insana por tributos, exigências e normas que não cessam de se multiplicar. Trabalhadores que alimentam, dia após dia, um Leviatã insaciável, que promete proteção, mas entrega vigilância; que acena com igualdade, mas cultiva privilégios; que proclama o bem comum, mas serve a interesses muito particulares.

A promessa do Estado provedor, muitas vezes embalada em retórica paternalista, costuma ser o primeiro passo rumo à servidão moderna. O cidadão é transformado em súdito. Seu papel se restringe a sustentar uma elite política que se arroga o direito de decidir o que é melhor para todos, ainda que esse “melhor” se revele, na prática, um sistema excludente, ineficiente e autorreferente.

Não é preciso buscar exemplos em livros de história. Basta olhar ao redor. Países como China, Rússia e Coreia do Norte oferecem retratos contemporâneos de Estados colossais que mantêm suas populações sob controle rigoroso, enquanto investem somas bilionárias em armamentos, propaganda e repressão. Em tais regimes, faltam antibióticos, alimentos e saneamento básico. Mas sobram recursos para vigiar, punir e esmagar dissidências. É a lógica da metástase: quanto mais cresce o tumor, mais se alastra e consome os tecidos saudáveis em torno.

No Brasil, embora a democracia formal esteja preservada, o peso do Estado também se faz sentir com força. A carga tributária escorchante, os serviços públicos ineficientes, a burocracia kafkiana e a concentração de poder nas mãos de castas tecnocráticas são sintomas de uma mesma doença: o culto ao gigantismo estatal. Um modelo que favorece os que estão no topo da pirâmide, enquanto empurra a maioria para a base, onde resta apenas sustentar, com esforço e resignação, os privilégios dos poucos.

A ilusão de que mais Estado significa mais justiça social já levou nações inteiras ao colapso. A concentração de poder, por mais bem-intencionada que se apresente, inevitavelmente, degenera em abuso. E quando o formigueiro se torna inquieto, quando as vozes dissonantes ameaçam romper o conformismo, não faltam defensores da ordem prontos a aplicar “formicidas” — seja na forma de repressão direta, seja por meio da asfixia econômica e do silenciamento institucional.

É preciso, portanto, recolocar o indivíduo no centro da equação política. Não se trata de demonizar o Estado ou propor sua extinção, mas de redimensioná-lo. Um Estado necessário, mas não onipresente. Protetor, mas não carcereiro. Servidor, e não senhor. A liberdade, essa palavra tão desgastada quanto vital, começa por aí: no equilíbrio entre o necessário amparo estatal e a imprescindível autonomia do cidadão.

Toda vez que o Estado se agiganta além da medida, o cidadão mingua. E quando já não há espaço para a liberdade, as formigas assanhadas só têm dois caminhos: resignar-se à caverna… ou começar a cavar sua saída.

A frase que foi pronunciada: “O indivíduo é apenas receptor de regras e modo de viver da sociedade da qual faz parte” e “Nosso egoísmo é, em grande parte, produto da sociedade”. (Emile Durkheim)

Desperdício: Quem passa perto da UnB pelo prédio da antiga Telebras não compreende o desperdício. Um prédio inteiro abandonado com capacidade latente para várias opções. Centro de estudos, biblioteca pública ou mesmo abrigar outro órgão que esteja pagando aluguel.


Circe Cunha e Mamfil – Coluna “Visto, lido e ouvido“ – Ari Cunha -Charge do Bob Gorrell - Émile Durkheim. Foto: wikipedia.org – Correio Braziliense


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