O IOF é mais um imposto colocado nas costas dos cidadãos brasileiros. O governo conseguiu mais essa vitória ao recorrer ao STF para fazer valer o aumento nesse imposto, que é regulatório e não arrecadatório, como quer o Planalto. Em muitos países, esse tipo de imposto sequer existe, porque onera a produção como um todo e inibe investimentos. Esse é um ponto crucial da política tributária brasileira e levanta uma crítica legítima indiscutível: o uso indevido do IOF (Imposto sobre Operações Financeiras) como ferramenta arrecadatória, contrariando sua natureza original de instrumento regulatório.
Criado com a finalidade de regular a economia, o IOF atinge especialmente o mercado de crédito, câmbio, seguros e títulos. Em teoria, sua função é atuar como uma alavanca de política monetária, aumentando ou reduzindo custos de determinadas operações financeiras para conter ou estimular a atividade econômica, controlar a inflação, ou desincentivar a especulação. Não é, portanto, um imposto estruturalmente arrecadatório, como o IR ou o ICMS.
Nos últimos anos, porém, o IOF tem sido manipulado como uma válvula de escape fiscal, usada para elevar rapidamente a arrecadação diante de déficits públicos ou para cobrir rombos momentâneos no orçamento. Isso desvirtua sua essência e imputa um custo adicional injusto à população e às empresas, sobretudo as pequenas e médias, que dependem de crédito rotativo ou empréstimos para operar. Não se iludam: o aumento do IOF afeta diretamente o crédito pessoal e empresarial, elevando o custo final de financiamentos, empréstimos e operações de leasing; os cartões de crédito internacionais, que já têm taxas altíssimas de juros; o câmbio e investimentos estrangeiros, desestimulando a entrada de capital externo no país e os seguros, que encarecem custos logísticos e operacionais em vários setores.
Esses efeitos criam um ambiente hostil para o empreendedorismo e a inovação, e penalizam o consumo das famílias, que já convivem com carga tributária altíssima — mais de 33% do PIB. Em muitos países desenvolvidos, não há equivalente ao IOF. Ou, quando existe, não se presta ao papel de arrecadação, mas sim a regulações pontuais e temporárias. É o caso de países da OCDE, onde tributos são mais transparentes e previsíveis.
No Brasil, ao contrário, o IOF pode ser alterado por mera canetada do Executivo, o que causa insegurança jurídica. Acabar com o IOF tem sido uma das condições impostas pela OCDE para a entrada do país nesse bloco. Ao recorrer ao STF para manter o aumento do IOF, como tem feito seguidamente e com êxito, o governo desrespeita o espírito do imposto e contorna o debate legislativo, ferindo o princípio da legalidade tributária. É uma “vitória” institucional que, na prática, aumenta o peso sobre o cidadão comum e sufoca, mais uma vez, o setor produtivo, já tão penalizado nesse governo.
Como vem sendo usado e abusado, o IOF se tornou mais um imposto disfarçado, em uma estrutura já sobrecarregada de tributos. Seu uso indiscriminado demonstra o despreparo do governo em buscar soluções estruturais para o equilíbrio fiscal e reafirma a urgência de uma reforma tributária profunda, transparente e voltada à simplificação e à justiça fiscal.
Nesse sentido a tão esperada reforma tributária real, capaz de livrar o cidadão de uma das maiores cargas tributárias do planeta fica empurrada para um futuro distante e incerto. Especialistas em Direito Tributário como Luiz Bichara e Vanessa Canado (Insper) destacam que o IOF é um tributo extrafiscal, com natureza regulatória, mas que claramente foi usado para aumentar arrecadação e cobrir frustrações orçamentárias, o que configuraria desvio de finalidade e abuso do poder executivo.
Também os economistas Julio César Soares, Paula Pires e Bruna Fagundes ressaltam que o decreto ultrapassou a finalidade autorizada pela lei e pela Constituição, já que não houve justificativa regulatória, tornando-se uma manobra puramente arrecadatória. Economistas de mercado e acadêmicos, como é o caso de Alexandre Schwartsman, ex-diretor do BC, afirma que usar o IOF para arrecadar “é um abuso de poder” que penaliza o crédito, especialmente de pequenas e médias empresas, e amplia desigualdades.
Também Felipe Salto (Warren Investimentos) aponta que o uso do IOF para arrecadar desvirtua sua função e deveria ser questionado judicialmente. Salto também destaca que a projeção de arrecadação crescente evidencia a mudança de propósito do imposto. Além disso, o BTG Pactual alerta que o aumento do IOF tende a frear a economia ao elevar ainda mais o custo do crédito em um contexto de Selic alta (14,75%), ampliando os efeitos negativos sobre investimento e consumo.
O consenso geral aponta para a necessidade de ajustes estruturais através de reformas e racionalização dos gastos públicos, em vez de medidas transitórias que sobrecarregam o cidadão comum e, impreterivelmente acabam nos tribunais.