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A imprensa ordinária

A imprensa ordinária

Não é à toa que eu sempre me refiro aos jornalistas enviesados como a imprensa que desistiu de ser imprensa. Há várias razões para isso. Essa turma desistiu dos fatos, desistiu da busca pela verdade, desistiu da isenção, de olhar o mundo real, “o tempo que já vivemos”. Tudo o que essa gente considera são seus interesses pessoais, dos veículos para os quais trabalha. Aqueles que forçam a barra para continuar se tratando como jornalistas estão preocupados em criar narrativas, perseguindo objetivos políticos, ideológicos, mercadológicos... Aos seus cúmplices toda a força possível. Aos seus inimigos o rigor da mentira mal ajambrada.


Tem sido assim desde 1.º de janeiro de 2019, quando Jair Bolsonaro assumiu a Presidência da República. Foi assim durante a Covid, quando, pela primeira vez, testemunhei a criação de um “consórcio de imprensa”. Não bastava um veículo torto ou outro, era preciso que todos contassem da mesma maneira as mesmas histórias inventadas. Já não era mais imprensa, já não havia mais equilíbrio, opiniões variadas, um olhar ilimitado, um horizonte amplo. Passamos a ter a visão seletiva e distorcida, ouvidos delirantes ou simplesmente inoperantes. Sim, a imprensa que desistiu de ser imprensa age por meio da mentira e também da omissão. E são milhares de exemplos disso.


Na última semana, jornais que já foram importantes e os mais acessados portais de notícias do país resolveram ignorar informações que deveriam ter ocupado as primeiras páginas, as capas. A questão é que agora a relevância das pautas passa longe do interesse legítimo dos leitores (mesmo que o desconheçam), passa longe do compromisso com as leis, com princípios morais, o que é correto. E os “jornalistas” nem se envergonham de adotar critérios fajutos para determinar o que será notícia e o que não será.


“Jornais que já foram importantes e os mais acessados portais de notícias do país resolveram ignorar informações que deveriam ter ocupado as primeiras páginas, as capas”


Seguindo seu plano diabólico de destruição total de um país, eles fingiram que o jornalista americano Michael Shellenberger e os brasileiros David Ágape e Eli Vieira não apresentaram novas provas robustas de arbítrios, abusos e ilegalidades praticados por Alexandre de Moraes e sua trupe. A série de reportagens se baseou em mensagens trocadas num aplicativo por assessores do ministro do STF, logo depois das prisões de inocentes em Brasília em 8 e 9 de janeiro de 2023. Fica claro que Moraes fez de tudo para manter essas pessoas na cadeia. Os arquivos mostram que as prisões foram motivadas por questões políticas. Um trecho de uma das reportagens diz que “Alexandre de Moraes serviu aos interesses de Lula, atropelando as leis para criminalizar o discurso de opositores”.


Os assessores do ministro do STF operaram por meio de um grupo secreto de WhatsApp que criava “certidões de inteligência ilegais”. Os manifestantes foram mantidos presos, enquanto eram realizadas varreduras em suas redes sociais, desrespeitando a Lei Geral de Proteção de Dados e o prazo legal de 24 horas para a realização da audiência de custódia. O “discurso” on-line considerado “criminoso” era às vezes apenas uma postagem sobre a importância de se cumprir a Constituição. Bastava uma foto do preso usando uma camisa da seleção brasileira, e, pronto, ele não se livrava das grades. Moraes não queria soltar ninguém sem antes ver na rede se tinha “alguma coisa”. E a repressão judicial excessiva contra os detidos contribuiu para a insustentável tese de que o 8 de janeiro foi uma “tentativa de golpe de Estado”. E isso ainda é usado no processo em andamento no STF contra Jair Bolsonaro e seus aliados.


E não havia santo na gangue de Moraes. Todos estavam cumprindo ordens ilegais, o que foi muito comum também na Alemanha nazista. E não havia constrangimento, havia crueldade. O juiz instrutor de Moraes, Airton Vieira, chegou a encerrar uma troca de mensagens assim: “Que nas audiências de custódia possamos dar a cada um o que lhe é de direito”, e cinco emojis de uma carinha piscando o olho com a língua para fora. Na resposta, um assessor também usou um emoji: quatro carinhas dando gargalhadas, em meio a lágrimas. O outro preferiu digitar seis letras ‘k’: “kkkkkk”...


Se não passou pela cabeça daqueles que são ex-jornalistas tornados militantes investigar profundamente as denúncias concretas apresentadas pela equipe do Michael Shellenberger, eles também não quiseram nem saber de um importante depoimento prestado na Câmara dos Deputados na última quarta-feira. O ex-funcionário do Departamento de Estado dos Estados Unidos Mike Benz foi ouvido pela Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional. Benz explicou como o deep State americano teria operado uma campanha sistemática para interferir nas eleições brasileiras de 2022, com uso de verbas públicas, manipulação de narrativas e favorecimento à candidatura de Lula.


A Agência dos Estados Unidos para o Desenvolvimento Internacional (Usaid) teve seu orçamento triplicado e financiou ONGs, sindicatos e “agências de checagem de fatos” no Brasil, com a finalidade de combater o então presidente Jair Bolsonaro. Mike Benz afirmou com clareza: “Não foi uma interferência pontual, mas uma operação coordenada de manipulação da opinião pública, com base em censura estratégica e interferência digital disfarçada de combate à desinformação”. O deputado Marcel van Hattem classificou o episódio como um “golpe conduzido pelo PT com o apoio do governo Biden” e acusou o Supremo Tribunal Federal de ter atuado em conluio com as ações de censura.


Essa imprensa que desistiu de ser imprensa embarca, feliz, no relativismo criminoso de um grupo político. Assim como a democracia, a soberania também passa a ser relativa. E esse movimento é contagioso. Nada mais é absoluto, nem a verdade, nem as leis, nem a justiça, nem os valores, nem os princípios... O problema é que o jornalismo que se atirou de um arranha-céu não se esborracha sozinho no concreto. Tendo relativizado também seus objetivos profissionais (contar as melhores e mais relevantes histórias reais da melhor forma possível), os jornalistas mortos-vivos condenam os brasileiros, sem exceção. Primeiro, eles abandonaram sua profissão, outrora tão nobre, para imediatamente e consequentemente entregar o povo ao desamparo. É preciso ter consciência disso e responder da mesma forma, abandonando quem nos deixou. Esse é um despertar mais do que necessário. Ninguém, ninguém será livre, preso a uma imprensa ordinária, que está amarrada ao que há de pior nesse mundo.



Luís Ernesto Lacombe - Foto: Imagem criada utilizando Whisk - Gazeta do Povo


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